A melhor qualidade de André Bernardes, segundo ele mesmo, é ser um grande sonhador. Após suas experiências no mercado financeiro e no universo dinâmico das fintechs, ele decidiu unir o que havia aprendido até então com a possibilidade de resolver novos problemas e gerar um grande impacto na sociedade. Desse sonho, nasce a Zippi, fintech criada para facilitar a criação de capital de giro e auxiliar microempresas e profissionais autônomos a movimentar suas finanças.
Fundada com seus colegas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), Bruno Lucas e Ludmila Pontremolez, a startup passou por uma série de modelos de negócios e muitas validações e adaptações até chegar ao conceito atual. A proposta atraiu grandes fundos como Tiger Global Management, que em 2022 liderou a rodada série A da Zippi, no valor de US$ 16 milhões.
Em um papo de peito aberto com o Startups, André falou sobre o potencial de mercado da Zippi no Brasil e as dores e oportunidades para empreender com serviços financeiros voltados às microempresas. Além disso, refletiu sobre os aprendizados ao longo de sua jornada que o ajudam a liderar uma empresa de alto crescimento e compartilhou os planos da companhia para 2024.
Veja, a seguir, os melhores momentos da conversa:
Com cada vez mais soluções voltadas para microempresas, quais os diferenciais da Zippi para se destacar no mercado?
Por incrível que pareça, apesar da sensação de que tem muita coisa para pequenos profissionais e pequenos empreendedores no Brasil, a verdade é que não tem tanto assim. O motivo que nos atraiu a construir soluções para pequenos negócios, é que a gente olhava para o Brasil e via duas realidades diferentes. Cerca de 40% da força de trabalho brasileira está em um pequeno negócio, ou seja, quase metade da população economicamente ativa. No entanto, pouquíssimos produtos e soluções financeiras foram criadas para atender às necessidades desses pequenos negócios.
Uma das coisas que a Zippi faz é dar acesso a capital de giro para esse pequeno negócio. Os pequenos negócios começam a semana tendo que comprar insumos para trabalhar, porque a natureza do trabalho é comprar coisas e transformar aquilo em receita, seja no caso de cabeleireiras, quanto dos donos de pequenas mercearias, de restaurantes e de pessoas que vendem cosméticos. Coletivamente, por ano, esses negócios gastam por volta de R$ 1,4 trilhão com essas compras. Porém, o crédito para essa população é de menos de R$ 100 bilhões.
Essa disparidade mostra como eles ainda não têm tanto acesso a produtos financeiros. É um público mal servido de produtos financeiros. Além disso, o acesso que eles têm a algumas das ofertas, principalmente de crédito, é muito baixo. Então, a nossa principal proposta de valor é permitir que eles encham a prateleira, ou seja, que tenham o poder de compra para adquirir os insumos e tocar o dia a dia.
Atualmente, a Zippi é a principal linha de crédito para quase metade dos nossos clientes. Nos últimos 12 meses, alcançamos a marca de R$ 1 bilhão em crédito. O que fazemos é possibilitar que os pequenos negócios tenham material de trabalho, tenham formas de conseguir comprar, gastar, girar o negócio deles e, em última instância, prosperar.
Quais foram os maiores aprendizados da sua jornada e o que você tirou dessas experiências para conseguir liderar a Zippi atualmente?
Comecei minha carreira em um banco norte-americano, um lugar muito maior, de estrutura rigorosa e 10 mil funcionários – uma experiência muito diferente de empreender. Do banco, tirei duas coisas importantes. A primeira foi bagagem técnica do mundo financeiro. Eu era um estruturador financeiro, que é uma palavra bonita para se referir a alguém que fica pensando a solução com os clientes quando não tinham soluções disponíveis no mercado. E os clientes do banco eram grandes empresas. Tinha que entender a dor que elas tinham e, como se fosse um quebra-cabeça, achar um jeito de resolver aquilo com um produto estruturado.
Isso aguçou muito a minha curiosidade intelectual em volta das finanças. De identificar uma dor complexa e buscar uma forma de bolar uma solução elegante que resolva aquilo e gere um grande impacto para o cliente. Além disso, aprendi sobre ética de trabalho. O banco tinha uma cultura de excelência, de levar muito a sério e fazer as coisas com muito apreço. Estudar, estar sempre aprendendo e sempre querendo melhorar. Um lugar muito barra alta, o que me deu uma boa base para o futuro.
Depois, trabalhei em uma fintech chamada Money Hero, em Hong Kong, onde liderei uma vertical de produto. O principal aprendizado foi ver que eu gostava do ambiente empreendedor. Era algo novo para mim e, naquela época, lembro que deitava a cabeça no travesseiro e ela ficava pulsando. Foi um choque de cultura, no qual tudo era muito novo e diferente do que estava acostumado, mas muito legal também. Foi uma experiência que me ensinou a navegar a ambiguidade e entender oportunidades em mercados novos. Percebi que gostava da fusão de tecnologia com finanças.
Quando saí, decidi fazer o mestrado no MIT, nos Estados Unidos, onde aprendi realmente a sonhar grande. Até então, eu sabia que queria trabalhar com algo incipiente, mas não necessariamente ser o empreendedor do negócio. Mas quando cheguei no MIT, passei a conviver com uma galera de outro nível, que sonha muito grande, que já fez tanta coisa e quer muito mais, resolvendo problemas e gerando impacto. Absorvi aquilo e comecei a acreditar mais também. Me deu uma pitada de autoconfiança, de enxergar o mundo por um olhar mais ambicioso, mais ousado. Foi lá, inclusive, que conheci os meus sócios, o Bruno e a Ludmilla, e decidimos criar um negócio que fizesse a diferença no Brasil.
A última rodada de investimentos da Zippi foi a série A, de US$ 16 milhões, em 2022. Como vão os planos para a próxima captação?
A nossa posição financeira é muito forte e não precisamos de caixa neste momento. A empresa já consegue pagar as contas por si só. Atualmente, estamos muito mais focados em expandir a oferta e entender como melhorar o que já temos em casa do que necessariamente fazer uma captação agora.
Quais são as prioridades da Zippi para 2024?
Melhorar a proposta de valor para o cliente e continuar aprimorando o produto, entendendo como a gente pode entregar mais valor e aprendendo mais sobre os autônomos. Existem duas variáveis imutáveis quando você está criando um produto de crédito: tempo e dinheiro. Sem eles, não dá para aprender a fazer o melhor produto possível. Não tem como você pular essas duas barreiras. Então, boa parte do trabalho que temos feito nos últimos dois anos, e vamos continuar fazendo, é aprender a pilotar esse produto e entregar mais valor para o cliente.
A Zippi nada mais é do que uma máquina de acumular dados proprietários. A empresa é um grande laboratório científico-financeiro. Cada vez que um cliente faz uma transação e manda um PIX, o meu modelo de negócios se fortalece. Com esse dado, consigo retroalimentar todos os meus modelos de ciência de dados, todas as minhas políticas de crédito e, assim, ser mais assertivo para entender quem é um bom cliente, quem não é um bom pagador e conseguir achar o bom cliente que tem pouco limite de crédito para dar para ele um produto que ele não encontra no mercado.
Raio X – André Bernardes
Um fim de semana ideal tem… Serra da Mantiqueira
Um livro: “Sandman”, de Neil Gaiman
Uma música: “Esotérico”, de Gilberto Gil
Uma mania: Fazer muitas perguntas
Sua melhor qualidade: Sonhar