O título desse “5 Minutos com” poderia ser muito maior, por conta da quantidade de empresas e negócios em que Flavio Dias atua e já atuou ao longo dos anos. Investidor-anjo, mentor e conselheiro de diversas empresas nacionais e internacionais, o executivo comandou o e-commerce do Magazine Luiza, foi presidente do Walmart.com, foi CEO da Via Varejo e criou o primeiro banco digital do Brasil, o Banco Original. E isso é só o começo.
Atualmente, ele é membro do Comitê de Inovação e Estratégia Independente da Riachuelo e do Comitê Digital Independente da Leroy Merlin. No ecossistema de startups, Flavio foi sócio no Brasil do fundo norte-americano 500 Startups, é sócio do fundo em ativos de mídia 4Equity Media Ventures e é um dos late-cofounders da Facily, plataforma de social commerce que viveu a euforia do venture capital e virou unicórnio em dezembro de 2021, após levantar US$ 135 milhões em sua rodada série D. O negócio, depois, sofreu os impactos do crescimento desenfreado, das incertezas macroeconômicas e dos reajustes no mercado de venture capital – algo que Flavio aborda nesta entrevista exclusiva.
Em um papo de peito aberto com o Startups, Flavio refletiu sobre sua trajetória em empresas de tecnologia, a importância de bons mentores e investidores para startups alavancarem o seu crescimento e suas perspectivas sobre o mercado. Veja, a seguir, os melhores momentos da conversa:
O Flavio criança já se imaginava cuidando de negócios? De onde vem o seu lado mentor e investidor?
Acho que o Flavio criança se imaginava jogando futebol. Sempre me destaquei nos esportes, principalmente nos mais coletivos, mas também me destacava nos estudos. Não só pelo desempenho, mas por ser o cara que juntava os grupos para estudar e ajudava os amigos que tinham mais dificuldade. Percebi que tinha uma grande capacidade de comunicação e sequenciamento lógico, e facilidade de absorver os problemas mais complexos e traduzir isso para as pessoas de forma simples e didática.
São coisas que acabaram me encaminhando. Não sabia o que queria fazer, mas tinha um direcionamento de que gostaria de trabalhar com outras pessoas em algo em que minhas habilidades seriam interessantes e que, juntos, faríamos a diferença. Sabia do que eu gostava e o que fazia bem. Participei de um grande e longo processo seletivo de estágio e consegui entrar na Phillips. Fui escolhido para atuar em uma área comercial dentro de uma sub-área chamada Canais Especiais, que concentrava tudo o que era diferente do grande varejo da Phillips, incluindo a parte de eletroeletrônicos. Naquele momento, nascia o e-commerce no Brasil e acabou entrando nessa área também. Comecei a estudar, me capacitar e ir atrás das coisas para trazer as novidades no setor.
Com o tempo, comecei a receber convites de empresas varejistas para que eu atuasse no e-commerce dessas empresas. Foi assim que cheguei no Magazine Luiza e depois no Wallmart, ajudando as companhias a entender o que era o comércio eletrônico e montar negócio digital. Fui ficando cada vez mais antenado ao mercado de tecnologia. Quando entrei em contato com o ecossistema de startups, foi amor à primeira vista, ajudando os empreendedores a montarem seus negócios, fazendo mentorias e atuando como investidor-anjo.
Investidores e conselheiros têm um papel importante na trajetória de crescimento das startups. Na sua opinião, o que faz de um profissional um bom parceiro e advisor?
A primeira característica é o profissional verdadeiramente se importar com o sucesso do outro. Ter no sucesso do outro uma satisfação pessoal e ajudar essa pessoa a extrair o máximo potencial do negócio. Uma genuína vontade de fazer acontecer é um primeiro passo para se doar ao máximo.
Outra questão importante é ter repertório de experiências do que você viveu e presenciou e, a partir disso, tirar os insights certos para o empreendedor. Não é falar “faz isso”, é dizer “baseado no que aconteceu comigo e no que vi acontecer em uma situação semelhante, o caminho que deu certo foi esse, o errado foi esse e não deu funcionou por causa disso”. Isso pode dar alguns atalhos para o empreendedor, com um aprendizado que demoraria muito mais de se obter sozinho.
Vai muito além do capital; é realmente dar a mão para a pessoa. Não é só nas decisões duras de negócio. Costumo estar próximo do empreendedor, ajudá-lo a montar a equipe e motivar o time, criar rotina de gestão, se aproximar dos fundos de investimento. É colocar seu repertório, networking e sua experiência, generosidade, reputação e capacidade de juntar recursos para a empresa conseguir prosperar.
Como você analisa o momento atual do mercado de venture capital e quais são suas perspectivas para 2024?
Vivi isso na pele. Uma das minhas grandes experiências foi na Facily, primeiro como mentor, advisor e depois me juntei ao time. Nos áureos tempos de venture capital, quando o capital era bastante abundante, chegamos ao patamar dos unicórnios. Em pouco mais de 1 ano, captamos US$ 530 milhões e construímos uma empresa gigantesca de forma muito rápida.
No meio desse período de plena aceleração e construção do negócio, que não parava de crescer, houve um corte dos investimentos que vinham sendo feitos no VC. Tivemos que fazer um enorme reajuste na operação. Também senti esse impacto como advisor e investidor de todas as empresas que já apoiava, com empreendedores buscando uma captação e tendo que reestruturar os negócios.
Esse mercado, como muitos outros, têm um movimento pendular. Estávamos no lado extremo com excesso de capital, o que proporcionava algumas situações estranhas de investimentos sendo feitos com poucos critérios a valuations desmedidos. Depois, o pêndulo foi para um lado completamente diferente, com capital praticamente extinto, e muitas oportunidades foram perdidas. Agora, estamos entrando em um momento de mais equilíbrio, com mais negócios saindo de forma mais racional, com valuations ajustados e empreendedores com consciência de crescimento sustentável. Investidores valorizando o crescimento com uma visão de rentabilidade muito mais tangível. Isso faz muito bem para todo mundo.
Balanceando as condições macroeconômicas, mais capital virá para o empreendedorismo e voltaremos a acelerar. É difícil que chegue ao nível de quase esquizofrenia de 2021, mas continuo apostando demais no mercado de venture capital no brasil. estamos em um celeiro de empreendedores fenomenais, que foram cultivados em um ambiente bastante adverso e, por isso, têm muita resiliência, criatividade e capacidade de execução. O mercado tem muito espaço para soluções e o capital está atendo a esse tipo de oportunidade.
Como é conciliar as demandas e necessidades de todas as empresas que você apoia, além das demandas pessoais?
O que não tenho é rotina, e adoro isso. Cerca de 20% da minha agenda é destinada às reuniões de conselho das grandes empresas, que normalmente já estão marcadas para o ano inteiro. Fora isso, estou muitas vezes dando atenção para os empreendedores do meu portfólio, seja dos investimentos-anjo ou pelo trabalho de advisor. Essas interações são pouco-programadas, acontecem muito sob demanda. Um empreendedor que quer bater um papo sobre aquisição de cliente, outro que me procura para falar de outra questão. Vou encaixando tudo na agenda, então tem pouca rotina nesse sentido.
Tem uma parte grande de novos fundos que me procuram para fazer mentoria para outros empreendedores, ou oferecer novas oportunidades de advisor e investimento. Conheço pessoas novas todas as semanas, que chegam por indicação dos fundos, da Endeavor, etc. Minha agenda é recheada de papos com pessoas super inteligentes, que estão fazendo coisas interessantes, que estão passando por um problema e precisam de ajuda ou querem me trazer uma oportunidade.
Tenho muita flexibilidade para encaixar as minhas demandas pessoais nesse meio. Adoro fazer esporte, tenho os meus hobbies e encaixo tudo de forma saudável na minha agenda e consigo conciliar de forma super tranquila.
Quem é o Flavio fora do trabalho? O que você gosta de fazer e como passa o tempo livre?
Adoro esporte. Tenho gostado muito de jogar beach tennis junto com a minha esposa. Também pratico esportes da mente, sou um admirador do poker. Estudo a ciência do poker e gosto de aplicar isso. Traz elementos de estratégia, pensamento lógico, aplicação prática de estatística e matemática, e uma adrenalina muito grande. Também adoro viajar, agora que estou com a agenda mais flexível consigo fazer mais, além de passar tempo com a minha família.
Como estou em contato com essa diversidade de assuntos, preciso buscar conhecimento e estar atualizado. Então leio, participo de eventos de tecnologia e converso muito com as pessoas do ecossistema.
Raio X – Flavio Dias
Um fim de semana ideal tem… beach tennis
Um livro: “Orchestrating Transformation”, de Michael Wade, James Macaulay, Andy Noronha e Joel Barbier
Uma música ou artista favorito: “Don’t Stop Me Now”, do Queen
Um prato preferido: Moqueca
Uma mania: Tentar agradar sempre
Sua melhor qualidade: Humildade