Muito do que Rodrigo Tognini aprendeu sobre liderança veio do esporte. Mais especificamente, do basquete. Ele tinha apenas 12 anos quando começou a competir e, durante toda a adolescência, dedicou-se a construir uma carreira profissional na área – algo que lhe rendeu até uma bolsa de estudos para jogar nos Estados Unidos.
Por volta dos 18 e 19 anos, ainda na universidade, Rodrigo começou a entender o mundo do empreendedorismo e criação de negócios e, desde então, decidiu que montaria a própria empresa. Aos poucos, conheceu pessoas e companhias que o aproximaram do mercado das fintechs, um setor atrativo que conquistou o jovem empreendedor pelas tantas oportunidades e dores a serem solucionadas, com um olhar especial para a gestão de despesas e cartões corporativos.
Foi daí que surgiu a ideia de criar a Conta Simples, plataforma de cartões corporativos e gerenciamento de gastos que atraiu investidores globais como Y Combinator, Valor Capital, Base10 Partners, Quartz, SaaSholic, Big Bets e JAM, do fundador do Tinder. Em um papo de peito aberto com o Startups, Rodrigo falou sobre a dificuldade de levantar capital nos primeiros anos da empresa, os próximos passos da Conta Simples e o impacto da conjuntura econômica atual no ecossistema. Veja, a seguir, os melhores momentos da conversa.
O esporte tem um papel importante na sua vida. Como foi um pouco da sua trajetória no basquete?
Dos 12 aos 19 anos, minha vida era treinar e jogar, queria seguir carreira profissional. Na época da escola, enquanto meus amigos estavam preocupados em passar no vestibular eu só queria passar de ano. Se passasse no vestibular ou não, não era algo que me preocupasse tanto. Obviamente eu estudava, pois tinha um combinado de que não repetiria nenhuma matéria. O basquete foi o que moldou muitos aspectos de liderança e tudo que aplico hoje na Conta Simples.
Joguei no interior de São Paulo durante uns seis anos, e recebi uma bolsa para jogar em uma faculdade norte-americana. Depois, voltei ao Brasil e fiz faculdade de administração no Insper. Mas era uma rotina muito louca de treino por cinco ou seis horas no dia, jogos no fim de semana. Abri mão de muita coisa e não me arrependo em nada. Pelo contrário, sinto saudades dessa época. O esporte para mim, principalmente o basquete, foi muito rico. Me deixou grandes valores e aprendizados, moldou a minha liderança e me deixou grandes amigos. Até hoje pratico esporte, mas em torneios amadores.
Quando você começou a se interessar pelo empreendedorismo?
O empreendedorismo surgiu na minha vida quando estava na faculdade nos Estados Unidos. Ou estava treinando ou lendo, estudando algo. Nessa época, li um livro que me abriu muito a cabeça, o “Sonho grande”, e descobri o canal da Endeavor no YouTube, que contava a trajetória dos empreendedores. Veio algo de dentro de mim, me identifiquei com as histórias e senti que queria ter uma história de empreendedorismo para mim.
Ao mesmo tempo, sabia que todas as trajetórias tinham muitos desafios, percalços e momentos críticos, com vários negócios quebrando e outros se reerguendo. Sabia que se quisesse seguir esse caminho, tinha que estar preparado para isso. O olhar para o empreendedorismo veio quando tinha uns 18 anos, quando comecei a entender o que era de fato montar uma empresa. E desde então, isso nunca saiu da minha cabeça. Já estava certo que em algum momento, faria isso.
Veio de uma vontade interna. Não foi dentro de casa – meus pais não são empreendedores; fizeram carreira em corporações. Quando voltei para São Paulo, tinha a certeza de que um dia iria montar o meu negócio e que era uma questão de tempo para arriscar fazer alguma coisa. Naturalmente, comecei a conhecer pessoas que pensavam de forma semelhante, ou que me levavam a entender como fazer isso.
A ideia sempre foi investir no mercado das fintechs?
Fiz várias tentativas antes de conseguir emplacar com a Conta Simples, e quando comecei não tinha definido que seria uma fintech. Meu primeiro negócio foi de venda de boné durante a faculdade. Primeiro, direto para o consumidor final e depois vendendo em lote para as festas e a atlética. Mas não foi para frente. Depois, montei uma fintech – aí sim no setor de pagamentos.
Meu primeiro emprego foi em um programa de liderança de pessoas da Stone, ainda na faculdade, quando a empresa tinha cerca de 40 pessoas. Me aproximei do André Street, cofundador da Stone, e do Augusto Lins, então presidente. Foi quando entendi como funcionava o mercado de pagamento, adquirência, maquininhas, cartão; e o mercado estava se abrindo.
Depois dos bonés, tive a ideia de fazer alguma coisa na área de pagamentos, com o objetivo de desintermediar o vale-refeição e vale-alimentação. Mas não deu muito certo, pois tinha uma complexidade de escala grande e um mercado com suas próprias dificuldades para fechar as pontas do lojista e do usuário final. Daquela experiência, percebi a dor que era acessar e fazer a gestão de cartões corporativos. O desejo de empreender casou com o conhecimento que desenvolvi nesse setor.
Quais os maiores perrengues que você passou como CEO da Conta Simples?
Tem vários. Logo no começo, não tinha muito capital, então levantei uma rodada inicial de investimento de R$ 160 mil com investidores-anjo. Conseguimos usar esse capital para construir e lançar o primeiro produto, com a expectativa de que o dinheiro durasse de oito a 10 meses, sendo utilizado com disciplina e rigor.
Só o set up da estrutura já era mais do que a metade do capital que tínhamos levantado, e ainda tinha que pagar os desenvolvedores e outras despesas. Quando os meses planejados chegaram ao fim, fomos em busca de uma nova rodada, mas já tínhamos colocado o produto no ar, entrado no mercado e negociado contratos. Falei ‘beleza, já temos o produto, um começo de tração e algo para mostrar aos investidores’. Mas foi muito difícil, porque os fundos não entendiam a tese na época ou acreditavam que o mercado era muito competitivo.
Foram várias justificativas e não conseguia levantar o dinheiro. Fiquei dois meses e meio tentando fechar a captação. No final desse processo, o dinheiro estava no limite, com uns R$ 10 mil na conta. Não sabia o que fazer, já tinha cliente operando, contratado um time. A solução era ou levantar ou usar toda a reserva que nem tínhamos para tentar manter a empresa viva mais alguns meses. Nos 45 do segundo tempo, com muita esperança e acreditando que daria certo, recebemos um investidor, que juntou mais algumas pessoas e no fim tínhamos R$ 1,5 milhão.
Mas foi difícil. Teve investidor que me ligou dizendo que ninguém queria colocar dinheiro no negócio e recomendou que eu ligasse para os clientes dizendo que iria fechar a empresa. Eu dizia que não tinha plano B e que iria conseguir levantar. E realmente fechamos a rodada. Depois, o negócio virou e acabou escalando até se tornar o que é hoje.
O que empreender na conjuntura econômica atual tem te ensinado sobre o ecossistema?
Acredito que 2020 e 2021 deseducou muito sobre o que é montar um negócio. Criar uma empresa é difícil, não é só ter uma ideia e levantar milhões só com o Power Point. É emitir nota fiscal, pagar imposto, contratar errado, ver um concorrente mais bem posicionado e ter que se superar, não ter recurso para investir no que precisa e ter que buscar a solução, achar maneiras de conquistar o cliente, entre outros.
O momento atual exige que empreendedores tenham a capacidade de se adaptar e entendam que saber navegar na escassez faz da empresa um negócio muito melhor. O problema é que não é fácil, não tem resposta pronta e, às vezes, você precisa dar dois passos para trás para depois dar 10 para frente. Muitas pessoas não estão dispostas a passar por tudo isso, ou acabam criando modelos que acham que sempre terá capital disponível. Tem que chegar um momento em que a empresa consiga se autossustentar.
No caso da Conta Simples, o começo da trajetória foi muito mais difícil do que está agora. Os desafios atuais são outros, não sei se mais fácil ou mais difícil. Mas na questão de criatividade, escassez de capital e difícil acesso aos investidores, já vivemos isso nos dois primeiros anos. Hoje, estamos confortáveis pois a empresa está financeiramente saudável, com caixa relevante. Mas isso porque criamos uma casca forte no passado, um período que estava bom para o mercado de forma geral, mas que para nós estava horrível. Moldamos nosso caráter como empresa em torno disso.
Quais os próximos passos da Conta Simples? O que ainda desejam conquistar?
Ainda temos muitos para conquistar no Brasil, temos só 0,3% do market share. Temos uma movimentação relevante, mas somos um player pequeno neste setor comparado ao que podemos ser. Estamos expandindo muito a solução, com uma estratégia de expandir cada vez mais a nossa solução de gestão de despesas e cartões corporativos, trazendo novidades para este setor. Aumento nossa exposição em linha de crédito e cartão de crédito para as empresas, novas features, integrações de gestão de despesas e dando cada vez mais controle, visibilidade, autonomia e eficiência para as empresas.
A expectativa é unir ainda mais o mundo financeiro com o do software para oferecer um grande diferencial de experiência aos clientes e usuários. Atendendo não só empresas de gasto concentrado em anúncios e compras online, mas também aquelas que precisam fazer reembolso, gestão de viagens, entre outros. Muitos produtos serão lançados nesse sentido nos próximos semestres.
Como você enxerga seu futuro profissional? Pensa em empreender novamente?
É difícil pensar no futuro quando estou 3.000% focado neste negócio. Mas, por natureza, o meu DNA é montar negócio, arriscar, criar e pensar fora da caixa. Sempre preciso ter liberdade criativa de pensamento, execução e tomar risco. O melhor lugar para isso é empreendendo.
Uma vez participei de uma espécie de consultoria e como resultado me deram duas notícias, uma boa e outra ruim. “A boa é que você está no lugar certo, na posição certa. É uma pessoa para arriscar, empreender, pensar no todo. A ruim é que só isso serve para você”. Acho que é assim que me conheço, que encaro a minha vida.
A Conta Simples ainda tem muitos desafios e é um negócio com muitos anos pela frente para construir. Mas no longo prazo, não me vejo fazendo algo além de empreender.
Raio X – Rodrigo Tognini
Um livro: “Garra: O poder da paixão e da perseverança”, de Angela Duckworth
Uma música favorita: Gosto muito de Frank Sinatra
Um prato preferido: Comida japonesa
Uma mania: Usar agenda para preparar o meu dia
Sua melhor qualidade: Persistência