Coluna

Você está complicando as coisas!

Arte: Guto Quirós
Arte: Guto Quirós

A busca por inovação no marketing tem nos empurrado para uma complexidade sem propósito. Ferramentas e processos novos surgem todos os dias, prometendo ser a solução definitiva para o engajamento e nova receita.

Eu acredito que a resposta que buscamos, e muitas vezes ignoramos, está no entendimento profundo das pessoas e suas culturas.

Segundo relatório da Ipsos, a comunicação empática é o motor número 1 da eficácia da publicidade a longo prazo. Muitas vezes, ficamos atordoados pela infinidade de ferramentas e plataformas e perdemos de vista um exercício essencial para a comunicação eficaz: nos colocar no lugar das pessoas com quem desejamos nos conectar.

Neste texto trago uma perspectiva de como acredito que as coisas podem ser diferentes e vou te propor que simplificar não é só uma necessidade, é uma urgência.

O poder da simplicidade

Em vez de nos afundarmos em ferramentas e análises quantitativas, deveríamos nos aproximar mais da realidade diária das pessoas, buscando compreender as verdadeiras motivações, desejos e necessidades que direcionam suas escolhas.

Essa semana, li “Um novo olhar” de Gillian Tett e percebi o quanto eu estava complicando as coisas.

Vou compartilhar um dos exemplos do livro, que ilustra a direção que acredito que o marketing deveria seguir.

Como pode o Kit Kat nos ensinar sobre simplicidade e genialidade ao mesmo tempo?

Inicialmente, o Kit Kat era visto apenas como um doce para momentos de pausa e prazer na Inglaterra. No entanto, no Japão, ganhou um novo significado como um talismã de sorte.

Essa mudança não aconteceu por estratégias caras e complexas de marketing, mas por uma coincidência na pronúncia do nome, que lembra uma expressão japonesa de boa sorte em exames estudantis (“Kit Kat” soava como “kitto katsu”).

A Nestlé percebeu isso e soube aproveitar a oportunidade para dar ao Kit Kat uma nova identidade cultural.

Foto: The New York Times

Sakura Saku: Brotar da esperança

A empresa decidiu observar de perto a vida dos jovens, usando estudos de comportamento para entender o verdadeiro significado de “fazer uma pausa” (slogan usado pela empresa, na época).

Descobriram que a pausa para os estudantes não era apenas comer chocolate, mas buscar momentos reais de relaxamento e preparo mental para enfrentar desafios.

Com a visão inovadora de Kohzoh Takaoka, a Nestlé conseguiu vincular o Kit Kat ao simbolismo da flor de cerejeira (sakura), que é um símbolo de sucesso e novo começo no Japão.

Essa mudança não só honrou as tradições japonesas, mas também transformou o chocolate em um verdadeiro talismã de sorte para os estudantes.

Foto: Yoshikazu Tsuno

A reinvenção do chocolate como ícone cultural japonês vai além de uma simples mudança de mensagem.

Sua presença em hotéis visava capturar o momento de pausa dos viajantes, enraizando o chocolate como parte da experiência de viagem e do costume de presentear.

Paralelamente, a parceria com os correios japoneses transformou-o em um talismã enviado para desejar sorte, enquanto a introdução de sabores autênticos como matcha e wasabi respeitou as tradições locais.

Foto: Pinterest

Essa estratégia transformou o chocolate em um verdadeiro fenômeno cultural no país, aproveitando tradições locais e reforçando seu papel como símbolo de desejo de sucesso.

Conclusão

Estabelecendo laços com a essência humana e cultural, é possível criar marcas e mensagens que não só alcançam, mas também tocam profundamente as pessoas.

E por consequência vendem mais.

A magia está em escutar, se adaptar e, mais do que tudo, em respeitar aqueles a quem servimos.

Porque, afinal, o coração do marketing é, e sempre será, profundamente humano.

Continuem inspirados,

Guto Quirós