Entrevista

5 Minutos com: Laura Constantini, da Astella à Nido

Executiva comenta os aprendizados da criação da Astella, a transição para a Nido e reflexões pessoais sobre carreira e escolhas de vida

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Laura Constantini
Laura Constantini, cofundadora da Astella e fundadora da Nido (Foto: Divulgação/Arte por Startups)

Laura Constantini construiu sua carreira entre o mercado financeiro e o venture capital, sempre atenta às movimentações de mercado e aos sinais – mesmo que ainda tímidos – de novas tendências. Começou no banco Santander, passou por equity research e M&A e, em 2008, co-fundou a Astella, gestora de venture capital com foco em rodadas early stage, criada ao lado de Edson Rigonatti.

Na fase mais recente da sua trajetória, ela criou a Nido, gestora de venture capital voltada a family offices. A iniciativa surgiu ao identificar uma lacuna no mercado brasileiro: investidores buscavam não apenas retorno financeiro, mas também proximidade com inovação e com empreendedores ligados ao legado familiar, enfrentando dificuldade para visualizar o portfólio e compreender o valor real de seus investimentos.

Fora do trabalho, Laura valoriza os momentos simples. Um fim de semana ideal tem tempo com a família, especialmente com as filhas e o marido, e atividades ao ar livre. Ela também gosta de ler – “Mistakes Were Made (but Not by Me)” e “The Creative Act: A Way of Being” são alguns dos livros que mais a marcaram – e ouvir música, com uma preferência especial pela banda Mumford & Sons, paixão compartilhada com toda a família, que já rendeu viagens à Itália e à Suécia para acompanhar os shows.

Entre curiosidade e dedicação, Laura equilibra vida pessoal e profissional com mindfulness e rotina estruturada. Em entrevista ao Startups, ela falou sobre os aprendizados da criação da Astella, a transição para a Nido, seus hábitos de foco e ainda compartilhou reflexões pessoais sobre carreira e escolhas de vida.

Confira, a seguir, os melhores momentos dessa conversa.

Você iniciou sua carreira no mercado financeiro. O que atraiu ao venture capital e como foi fazer essa transição?

Fiz Administração de Empresas – e arrisco dizer que muita gente escolhe esse curso porque não tem a menor ideia do que quer fazer na vida. Eu incluída. Brinco que minha carreira começou por exclusão: eu sabia o que não queria, mas não fazia ideia do que queria. Comecei no mercado financeiro, passando pelo Santander, Banco Garantia e depois novamente pelo Santander. Atuei em equity research, analisando empresas para os portfólio managers, com foco no setor de telecom, justamente na época da privatização da Telebras. Infelizmente, foi o primeiro e único momento em que tecnologia foi o carro-chefe da bolsa no Brasil, em vez das commodities.

Foi nessa época que conheci o  Edson Rigonatti. Conversávamos muito sobre construção de redes e acabamos trabalhando juntos em uma boutique de M&A, a Cicerone Capital. O setor de telecom se consolidou rápido, e antes que nos preparássemos para a próxima oportunidade na Cicerone, percebemos que o Brasil tinha um ecossistema de tecnologia emergente.

O escritório da Cicerone em Nova York entendia que isso não pagaria as contas da empresa – e, de fato, tinham razão. Mesmo assim, achamos que seria uma jornada mais interessante do que continuar no M&A tradicional. A alternativa seria fazer fusões e aquisições em outros setores, mas optamos por seguir no universo de tecnologia. Assim nasceu a Astella.

Quais as estratégias para crescer em um mercado ainda incipiente?

No começo foi muito difícil – era emergente demais. Sabíamos que o modelo mais viável para ajudar os empreendedores era via investimento, não consultoria. Mas subestimamos o lado do funding. No Brasil praticamente não existiam recursos para venture capital e a maioria dos investidores nos achava malucos, porque, assim como hoje, era um momento de juros altos. Tivemos que escolher entre voltar para o mercado financeiro ou seguir no ecossistema, criando um modelo que nos permitisse construir um track record enquanto aguardávamos um momento mais favorável. Optamos por seguir com a segunda alternativa.

Começamos com um fundo pequeno, com recursos próprios, e um ciclo mais curto que o tradicional de VC. Como não havia outras rodadas, depois de cinco ou seis anos o empreendedor precisava se sustentar sozinho ou vender a empresa. Conseguimos bons retornos: 31% ao ano nesses seis anos. Achamos que estávamos prontos para captar, mas em 2014-2015 o interesse ainda era baixo – estávamos no auge da euforia com real estate.

Mais uma vez, colocamos nosso próprio dinheiro. Os investidores do fundo I seguiram conosco e a Spectra Investments entrou no fundo II, querendo aprender sobre VC e trocando know-how. Mantivemos o foco na jornada empreendedora, trazendo benchmarks internacionais adaptados à realidade dos founders no Brasil, curando conteúdo e criando processos próprios de geração de valor.

O fundo II, lançado em 2014, foi bem-sucedido: investimos em Omie, RD Station e Clicksign. Já realizamos o exit da RD e de parte da Omie, o que devolveu aos investidores o equivalente a seis vezes o capital investido nessa metade do portfólio. A outra metade ainda está ativa e hoje é avaliada em aproximadamente o dobro do capital investido. Esse desempenho abriu portas para captar o fundo III, de R$ 100 milhões, e depois o fundo IV, de US$ 100 milhões.

Você construiu uma carreira sólida entre a Astella e a recente criação da Nido. O que mais te motivou nessa transição de fase?

Vendi minha participação na Astella no início do fundo V.. Eu já enxergava um novo momento no mercado e no ecossistema. Nos últimos anos, a maior parte dos gestores focou, com toda razão, na jornada empreendedora, buscando agregar valor e oferecer um posicionamento diferenciado para as startups. Mas percebi que o outro lado da mesa, o dos investidores, estava muito desassistido.

No Brasil, a maioria dos investidores de venture capital não é institucional, mas pessoa física. Muitos estavam perdidos sobre o ajuste de valuations, frustrados por não entenderem exatamente o valor ou as perspectivas dos ativos que possuíam, e confusos com as marcações em meio à alta de juros. Vi que havia uma dor enorme aí: investidores e family offices precisavam de alguém que ajudasse não só a avaliar ativos, mas também a criar e cuidar estrategicamente de um portfólio de VC.

Conversando com vários deles, percebi o quanto eu gostava dessas trocas. Reencontrei investidores com um conhecimento profundo em diferentes cadeias de valor e vi que podia atuar como uma espécie de CIO para um conjunto de family offices, trazendo um dinamismo que eles não conseguem ter sozinhos por falta de acesso, know-how e rede de contatos. A Nido nasceu dessa oportunidade de preencher essa lacuna.

A Nido não substitui, de forma alguma, o gestor de venture capital. Pelo contrário: ela oferece uma camada estratégica de gestão para cada portfólio e cada family office – algo que não existe no Brasil. Espero que isso traga mais conforto e liquidez tanto para os investidores quanto para os gestores.

Que hábitos ou rotina te ajudam a manter foco e clareza em decisões estratégicas?

Lidar com muitos empreendedores, modelos de negócios diferentes e vários investidores, cada um com suas demandas, exige bastante energia, ainda mais hoje com tanto ruído de comunicação. Por isso, momentos de abstração e mindfulness são essenciais. Parar para conversar de bobagem, passar tempo com a família e espairecer faz toda diferença.

Quem vive no piloto automático, de reunião em reunião, acaba o dia totalmente desgastado. Por isso, organizar o tempo e priorizar algumas atividades é fundamental. Escuto podcasts enquanto faço ginástica, reciclando conhecimento sem abrir mão do esporte. Também mantenho uma rotina consistente para responder e-mails e assim consigo manter foco e clareza.

Se pudesse voltar no tempo, que conselho daria para a Laura do começo da carreira?

Eu me culpava muito por não saber exatamente o que queria fazer. Olhava para os meus amigos e parecia que todos tinham uma carreira definida – mercado financeiro, marketing, imobiliário – e eu ainda estava tentando descobrir a minha.

Hoje, se pudesse voltar, diria que não tem problema não saber. Esses momentos de incerteza são justamente para construir as ferramentas que vão nos levar ao saber. Se tivesse entendido isso antes, teria me permitido experimentar mais, ler mais, explorar com mais tranquilidade e sem tanta cobrança.

Raio X – Laura Constantini

Um fim de semana ideal tem… tempo em família, com as minhas filhas, além de momentos ao ar livre

Um livro: “Mistakes Were Made (but Not by Me): Why We Justify Foolish Beliefs, Bad Decisions, and Hurtful Acts”, de Carol Tavris e Elliot Aronson

Uma música: Não consigo escolher uma, mas minha banda preferida é Mumford & Sons

Sua melhor qualidade: Ser muito curiosa e gostar de conversar com as pessoas