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A criação de tecnologias por mulheres negras como estratégia de resistência

Mulheres negras têm papel fundamental na criação de tecnologias ancestrais desde os tempos antigos

Tecnologias mulheres negras
Tecnologias mulheres negras (Foto: Canva)

*Por Juliana Gonçalves, gerente do Bioma Comunicação Ancestral, da PretaHub

As mulheres negras têm desempenhado um papel fundamental na criação e preservação das tecnologias ancestrais desde os tempos antigos. Essas práticas, transmitidas de geração em geração, são uma forma de resistência e empoderamento para essas comunidades.

A inovação não se limita apenas aos avanços modernos e às novidades digitais. No episódio “Comunicação ancestral: a tecnologia que atravessa o tempo” do BiomaCast, uma iniciativa do Bioma Comunicação Ancestral, um dos convidados, Tarcísio Silva, nos lembra que ela pode ser também uma ferramenta de compartilhamento, uma forma de conexão e preservação da cultura e dos conhecimentos transmitidos ao longo dos tempos. Nesse contexto, as mulheres negras se destacam como protagonistas, criando soluções inovadoras que refletem suas necessidades e realidades.

A tecnologia ancestral é uma referência aos conhecimentos, habilidades e práticas desenvolvidas por povos antigas ao longo do tempo para atender às necessidades básicas e realizar atividades cotidianas. Elas são compartilhadas oralmente ou por meio de práticas culturais, que podem ser frequentemente adaptadas ao ambiente natural e às condições locais. A construção do que é tecnologia ancestral é uma reflexão profunda que nos leva a repensar nossas perspectivas sobre inovação e progresso. No cenário contemporâneo, essa estratégia emergiu como um recurso poderoso de resistência e empoderamento. 

Juliana Gonçalves, gerente do Bioma Comunicação Ancestral, da PretaHub
Juliana Gonçalves, gerente do Bioma Comunicação Ancestral, da PretaHub (Foto: Divulgação)

O poder da criatividade

É crucial refletir sobre as “inovações acessíveis” que surgem nas periferias, onde a criatividade e a resiliência são essenciais para enfrentar os desafios do cotidiano. Essas comunidades estão desenvolvendo soluções tecnológicas para abordar questões específicas, desde o acesso à saúde e educação até a luta por justiça social e econômica. Exemplos dessas inovações incluem a preservação da culinária tradicional, artesanatos, artes performáticas e outras formas de compartilhamento, que se tornaram fundamentais para garantir a continuidade das comunidades.

Muitas mulheres negras desempenham um papel central na preservação dessas práticas ancestrais em diversas áreas da vida cotidiana e da cultura. Essas tecnologias refletem a sabedoria acumulada ao longo das gerações e desempenham um papel crucial na preservação da cultura, identidade e autonomia das comunidades ao redor do mundo.

Essa herança milenar está emergindo cada vez mais na atualidade. Um exemplo disso é o livro “Griots e tecnologias digitais”, que explora as interseções entre a comunidade e o ativismo na era digital. A obra aborda como os griots, tradicionais contadores de histórias da África Ocidental, estão utilizando a internet e as mídias sociais para preservar e compartilhar suas histórias e tradições culturais de maneira mais ampla. Ao mesmo tempo, o livro discute os desafios enfrentados ao equilibrar a autenticidade de suas narrativas com a natureza digitalizada do mundo contemporâneo. Destaca-se a importância de encontrar um equilíbrio entre tradição e inovação para garantir a preservação das ricas culturas e histórias transmitidas pelos griots para as futuras gerações.

Um exemplo marcante apresentado no livro é o de Zélia Amador de Deus, uma griô da luta contra o racismo no Brasil. A partir de sua tese de doutorado, intitulada “OS HERDEIROS DE ANANSE: movimento negro, ações afirmativas, cotas para negros na Universidade”, ela estabelece uma conexão entre Ananse e as lutas contemporâneas dos afrodescendentes no Brasil, especialmente na região da Amazônia paraense. Zélia relaciona as histórias e os ensinamentos de Ananse com as ações de resistência e as demandas por igualdade racial, incluindo a implementação de políticas afirmativas, como as cotas para negros nas universidades.

As mulheres negras na Amazônia incorporam esse legado ancestral em suas práticas cotidianas, incluindo o ativismo digital. Elas utilizam as histórias e os ensinamentos de Ananse como fonte de inspiração e empoderamento para enfrentar os desafios contemporâneos, como o racismo estrutural e a marginalização nas plataformas digitais. 

Reconhecer e valorizar o trabalho das mulheres negras na tecnologia é essencial para construir um futuro mais justo e inclusivo, valorizando esses conhecimentos e promovendo a igualdade de oportunidades.