* Felipe Ladislau é sócio da Organica
As trincheiras das lutas antirracistas não se restringem apenas às grandes empresas. Outro espaço relevante é o do empreendedorismo, que está marcado no DNA do povo preto. Mesmo sem acessos e oportunidades, esse povo usou de sua criatividade, inventividade e perseverança para sobreviver a um Estado opressor.
Contudo, com o advento das startups passamos a diferenciar o empreendedorismo de oportunidade daquele guiado pela necessidade. E hoje empreendedores são verdadeiras celebridades e influenciadores.
No entanto empreendedores negros enfrentam muito mais adversidades para ter acesso a funding e jogar um jogo cujas regras não lhes favorecem. Como virar o jogo?
Quem paga o pato?
De acordo com uma pesquisa feita pelo Sebrae e pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), empreendedores negros foram mais prejudicados pela crise provocada pela pandemia.
Pessoas negras perderam mais no faturamento, ficaram mais endividados e tiveram menos acesso a crédito. A diferença de perda financeira entre negros e brancos é de 6 pontos, dado relevante e alarmante.
Outro dado que escancara a disparidade é que 47% dos empreendedores negros tiveram seu acesso ao crédito negado, enquanto a porcentagem cai para 34% quando falamos do empreendedorismo branco.
Quando focamos em gênero, 45% das mulheres negras recebem não como resposta, enquanto apenas 30% das brancas têm a negativa. De acordo com estudo feito pelo Sebrae em 2020, empreendedores negros têm negócios menores, mais recentes, com menos infraestrutura e menos recursos.
Para falar sobre os desafios e aprendizados do empreendedorismo negro, nada mais justo do que dar voz para quem teve coragem de trilhar esse caminho. Por isso, conversei com algumas empreendedoras e empreendedores que enfrentam essas questões diariamente para poder extrair dicas para quem está começando agora nessa jornada.
O início sempre será mais desafiador
Ter apoio e suporte no início e saber quem acionar para tirar dúvidas e fazer networking pode ser o primeiro fator que irá dificultar seu caminho. Muitas vezes o que acontece é que temos menos apoio do que imaginamos e acabamos tendo que fazer a maior parte das coisas sozinho, o que gera uma sobrecarga e uma pressão que pode ser desanimadora. Mas não precisa ser assim. Buscar essa rede de apoio e firmar parcerias com aliados que venham para somar é uma ótima saída para dar continuidade a seu projeto.
Como se manter forte nos momentos de solidão?
Principalmente no início, ainda mais quando há dificuldade de encontrar essa rede de apoio mencionada anteriormente, é comum ter momentos de solidão. Mesmo quando as estatísticas desanimam, é preciso entender que você não está sozinho, entender que existe muita força e potência no trabalho de empreender, principalmente estando em um grupo minoritário. Tenha atenção para esses momentos e cuide também da sua saúde mental para poder continuar nesse caminho.
Encontre um grupo (ou tenha vários)
Faça parte de diversos grupos, busque ajuda e ofereça apoio para quem está na mesma jornada que você. Grupos de mulheres, de empreendedores sociais, de tecnologia, de mercados diferentes. Há uma possibilidade enorme de aprendizado nessas conexões.
Reconheça e defenda seu espaço
Uma vez conversando com uma colega empreendedora, ela me disse que é preciso ter responsabilidade com a gente mesmo, praticar o autocuidado. Essa colega é Janine Rodrigues, escritora e educadora, CEO e fundadora da Piraporiando Edtech, e ela me disse: “O sistema trabalha todo dia para nos matar (seja o corpo, seja a mente). Minha responsabilidade é viver. Uma mulher preta viva já é um ato revolucionário.”
Mesmo assim, quando a insegurança aflorar, lembre-se que você já faz várias coisas incríveis e que nossa régua sempre foi mais alta. Tente não se massacrar e estar ao lado de pessoas que vão abrir seus olhos nos pontos de melhoria e vão destacar para você mesmo suas qualidades. Finalizo com uma frase da Janine “Saiba quem são seus aliados. E se mantenha vivo.”