Inteligência artificial. Foto: Canva
Inteligência artificial. Foto: Canva

*Por Sérgio Passos, cofundador e CPO da Blip

Um dos maiores eventos de tecnologia e inovação do mundo, o Web Summit Lisboa 2025 marcou um ponto de virada na narrativa tecnológica global. Se nos últimos anos a inteligência artificial evoluiu como ferramenta, automação e assistente, agora ela entra em sua fase mais madura: a era dos agentes de IA autônomos. Esses, capazes de operar dentro de sistemas reais, tomar decisões, interagir com múltiplas aplicações e executar processos completos sem a necessidade de ação humana direta.

A próxima década será definida não apenas pela sofisticação técnica desses agentes, mas pela capacidade das empresas de operacionalizá-los com segurança, contexto, governança e integração profunda. Em outras palavras, não basta criar agentes de IA; é preciso uma plataforma capaz de conectá-los de forma coerente com o negócio.

O evento forneceu evidências abundantes desse reposicionamento estrutural do mercado.

O comércio mediado por agentes: um novo modo de consumir

Um dos temas mais debatidos foi o avanço do comércio mediado por IA. A apresentação da Checkout.com, fintech global especializada em pagamentos digitais e infraestrutura financeira para grandes marcas, trouxe dados que reforçam uma tendência: milhões de consumidores já utilizam sistemas generativos para descobrir produtos, comparar preços e decidir o que comprar. O novo passo é permitir que agentes concluam as compras em nome das pessoas.

Essa transformação altera radicalmente o jogo competitivo. A disputa entre marcas deixa de estar restrita à experiência e ao branding e passa a incluir um novo fator: a compreensibilidade para agentes de IA. As organizações precisarão estruturar catálogos legíveis por máquina, políticas acessíveis via APIs e informações padronizadas, criando um ambiente transacional em que uma IA possa tomar decisões com confiança em nome de um consumidor.

Nesse contexto, empresas que conseguirem integrar agentes, canais, regras e dados dentro de uma mesma arquitetura sairão na frente. A capacidade de orquestrar inteligências distintas e transformá-las em resultados de negócio torna-se o novo diferencial competitivo.

O avanço das plataformas assistivas

Outro ponto alto foi a palestra da Superhuman, startup de produtividade focada em e-mails e workflows com IA, que mostrou como ferramentas aparentemente simples estão se tornando infraestruturas invisíveis de agentes distribuídos. O exemplo do Grammarly, que adquiriu a Superhuman, ilustrou isso bem: o que começou como um corretor gramatical evoluiu para uma rede de agentes de IA que acompanha milhões de usuários, ajustando contexto a cada caractere digitado.

O movimento sinaliza uma mudança profunda na forma como o software é concebido. Em vez de produtos isolados, o futuro aponta para ecossistemas de agentes especializados, cada um com um domínio de conhecimento, operando sob condições específicas e integrando-se aos fluxos reais de trabalho. O diferencial deixa de ser funcional e passa a ser contextual e contínuo, com softwares que não interrompem o usuário, mas o acompanham.

Essa tendência também redefine o papel das plataformas tecnológicas dentro das organizações. Elas passam a atuar como camadas de orquestração, permitindo que agentes de IA interajam com sistemas legados, canais diversos e fluxos críticos de negócio. Em vez de ampliar a produtividade apenas do indivíduo, trata-se agora de ampliar a eficiência organizacional como um todo.

A disciplina estratégica necessária

A reflexão do fundador e CEO da Miro, plataforma de colaboração visual com uso de IA, adicionou uma camada organizacional essencial à discussão. Sua tese central de que startups e grandes corporações agora têm acesso às mesmas capacidades de IA, redefine o conceito de vantagem competitiva. O que passa a diferenciar as empresas é a velocidade de aprendizado e adaptação.

Equipes capazes de interpretar sinais precoces do mercado, ajustar hipóteses rapidamente e entender onde possuem “permission to win” terão vantagem desproporcional. Em um ambiente acelerado pela IA, o product–market fit se tornou móvel: não basta encontrá-lo, é preciso mantê-lo.

Essa nova dinâmica exige infraestrutura operacional sólida, capaz de sustentar experimentação rápida, distribuição eficiente e adaptação constante. É o que separa o entusiasmo tecnológico da real capacidade de execução empresarial.

Uma nova era operacional

Se houve um consenso no Web Summit, foi este: modelos de IA isolados não geram valor. O valor nasce da combinação entre inteligência, contexto e execução. A era dos agentes de IA não é uma hipótese futurista e sim uma inevitabilidade competitiva.

Empresas que não conseguirem estruturar dados, integrar jornadas e orquestrar inteligências ficarão atrás daquelas que o fizerem. E, para isso, será indispensável uma infraestrutura que permita que múltiplos agentes de IA trabalhem em conjunto, que modelos diferentes sejam acionados de forma coordenada e que dados circulem com segurança entre sistemas internos e canais externos.

O consumidor já está pronto para delegar. A tecnologia, madura para atuar. E os incentivos econômicos, como redução de custos, eficiência e disponibilidade contínua, são irresistíveis.

O desafio, agora, é conectar as peças. A nova economia digital já começou e os agentes de IA estão prontos. O mercado também. Resta saber quem vai conseguir operar esse futuro.