*Por Diego Aristides, cofundador da Stellula.co e CEO do The Collab
O SXSW já foi um berço para startups visionárias, um ponto de encontro para quem queria desafiar o status quo. Mas algo mudou. Este ano, o evento me deixou com uma dúvida incômoda: Enquanto as grandes empresas já estão moldando o futuro da IA e da computação quântica, como estão as startups? Será que ainda estão inovando ou apenas replicando fórmulas prontas?
O que vi no SXSW 2025 foi um cenário onde muitas delas pareciam mais preocupadas em exibir seus produtos do que em apresentar algo realmente transformador. E o evento, que anteriormente já foi sinônimo de revolução, está se tornando mais uma feira de networking e autopromoção?
Ev Williams, cofundador da Mozi, fez uma crítica certeira: o maior erro das redes sociais foi transformar todos em criadores de conteúdo. O que parecia uma democratização virou um mar de ruído e de coisas criadas por GPTs. E esse mesmo fenômeno pode estar acontecendo no ecossistema. Estamos vendo uma explosão de soluções genéricas, embaladas para captar investimento, mas sem propósito real.
Olhando para as delegações internacionais que participaram do evento, um padrão interessante apareceu: muitos brasileiros e praticamente todos criando conteúdo. Além disso, países como China e Índia estão emergindo como pólos de inovação muito mais rápidos e pragmáticos que o Vale do Silício. A revolução não vem mais de onde sempre esperamos.
E não é só isso. Rishad Tobaccowala, autor de “Rethinking Work”, trouxe uma visão fundamental: o trabalho do futuro não será um cargo fixo, mas um conjunto de tarefas organizadas como uma playlist. O mercado está caminhando para um modelo onde profissionais navegam entre múltiplos projetos, muitas vezes usando IA e plataformas como suporte. Se as empresas querem se manter relevantes, precisarão entender que o trabalho não será mais sobre hierarquias, mas sobre habilidades adaptáveis.
Com a automação tomando conta de tudo, as empresas estão cada vez mais dependentes de IA para interagir com os clientes. Isso pode parecer um avanço, mas onde fica a identidade das marcas nesse processo? Se um agente de IA faz recomendações de compras e um outro agente processa a transação, quem realmente está se conectando com o consumidor?
Eu sempre me pergunto: em um futuro próximo, ainda teremos dados genuinamente humanos? Ou será que, à medida que a IA assume a geração de conteúdo, a única informação verdadeiramente original que restará será aquela inscrita em nós – nosso DNA?
Não é à toa que cresce o número de empresas investindo em pesquisa genômica. Se o próximo grande ativo da humanidade não for mais o que pensamos ou criamos, mas sim o que somos, faz sentido que a biotecnologia esteja se tornando o novo campo de disputa tecnológica. Em 3 anos falaremos de biotecnologia da mesma forma que falamos de AI hoje. Talvez até mais.
No SXSW, vimos como a IA já está saturando o ambiente digital com conteúdo gerado autonomamente – muitas vezes, sem que os usuários percebam. John Maeda (VP da Microsoft) mencionou que estamos migrando da era da experiência do usuário (UX) para a experiência do agente (AX), onde os sistemas operam sem intervenção humana. O que acontece quando não distinguimos mais entre criação humana e produção algorítmica?
Ao mesmo tempo, a biotecnologia avança a passos largos. No painel sobre computação quântica, especialistas como Dr. Jeanette Garcia (IBM Quantum) discutiram como a modelagem molecular está permitindo simulações genéticas complexas, acelerando pesquisas na medicina de precisão. Isso reforça uma tendência: se os dados digitais se tornarem irrelevantes, a nova fronteira será nossa própria biologia.
Esse movimento também carrega implicações filosóficas. Esther Perel, psicoterapeuta renomada, alertou que estamos mais conectados a algoritmos do que a pessoas. Mas e se, em breve, estivermos mais conectados às nossas estruturas genéticas do que às nossas ideias? Se o futuro da inovação não for mais sobre pensar, mas sobre decifrar?
Talvez o grande desafio dos próximos anos não seja apenas distinguir entre IA e humano, mas entender o que ainda será verdadeiramente nosso nesse cenário.
E é exatamente aqui que surge a grande provocação deste SXSW. A tecnologia avança em um ritmo alucinante, mas parece que todos estão apenas reagindo a essa velocidade, sem questionar o impacto real do que está sendo criado. Falamos tanto sobre futuros – talvez porque seja mais confortável projetar cenários do que encarar o presente – que acabamos deixando o agora em segundo plano.
No final das contas, voltei do SXSW com um sentimento agridoce. A inovação continua a acontecer, mas para realmente avançarmos, precisamos enxergar além do óbvio e questionar o que está moldando o futuro. Enquanto a Europa busca recuperar seu fôlego tecnológico e o Ocidente segue debatendo caminhos, China, Índia, Coreia do Sul, Singapura e Emirados Árabes já estão dando forma ao futuro da revolução tecnológica. Nos vemos em breve por lá.