*Stephano Maciel é cofundador e presidente da fintech FacilitaPay
Turistas de todos os lugares do mundo passeiam na Lincoln Road. Entram e saem de lojas, param para beber um café ou apreciar uma refeição em restaurantes famosos. De South a Daytona Beach, famílias se abrigam sob guardas-sóis enquanto algumas mulheres se aventuram no bronzeamento. Ao mesmo tempo, é possível encontrar homens, que esqueceram de passar protetor solar na cabeça, desfilando pela orla com uma careca rosada. Este é um cenário típico de Miami, um dos maiores destinos turísticos dos Estados Unidos. Contudo, desde 2017, a cidade busca ser referência em outros setores: tecnologia e empreendedorismo.
Tudo começou quando Francis Suarez foi eleito prefeito com 86% dos votos, na eleição municipal de 2017, pelo partido republicano. Como o primeiro prefeito natural de Miami, em 125 anos de existência da cidade, Suarez trouxe uma nova abordagem para sua gestão. Ao longo dos quatro anos (período do mandato das prefeituras nos EUA), buscou dialogar com outros segmentos e iniciou uma campanha de transformar Miami no próximo hub tecnológico do país.
Em dezembro de 2020, essa iniciativa ganhou ainda mais visibilidade quando o investidor de capital de risco Delian Asparouhov fez um tweet sugerindo transferir o Vale do Silício para Miami. Sim, essas foram suas palavras, literalmente: “ok pessoal escuta isso, e se a gente mudar o silicon valley para miami”. Francis Suarez não perdeu tempo ao responder: “Como eu posso ajudar?”.
A interação no Twitter foi um momento simbólico, que representou todas as movimentações que a prefeitura de Miami já havia colocado em prática. Além de isenção de impostos e incentivos fiscais, foi criado o eStart, uma plataforma para simplificar a criação de licenças para negócios no município. Para fazer coro com Suarez, grandes empresas começaram a anunciar a migração de suas bases para a cidade litorânea. O grande destaque veio com o anúncio de investimento de US$100 milhões da SoftBank para empresas estabelecidas em Miami.
Miami, a Capital da América Latina
Apesar desses novos incentivos, Miami já era considerada um local atrativo para empresas latino-americanas. Há vários fatores que atraem empresas LATAM para o ZIP Code do município, um deles é que estar em Miami é ótimo para manter a relação com a América Latina mesmo estando nos EUA. A região tem um fuso horário bem próximo dos países da LATAM, o que facilita o atendimento à região em horário comercial. Além disso, tem uma forte cultura latina, facilitando a criação de networking com a região, mesmo sem precisar viajar. Não à toa, Miami é popularmente conhecida como Capital da América Latina.
Além dessas características culturais, no caso de empresas brasileiras que querem empreender no exterior, é possível ter apoio para acelerar essa movimentação com a Associação Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (APEX-Brasil). A entidade auxilia em diversos desafios no processo de internacionalização, e também é um hub de empreendedores, proporcionando o compartilhamento de insights, informações e networking. Naturalmente, neste grupo, Miami é considerada um dos locais mais propícios para iniciar a expansão internacional.
No caso da FacilitaPay, startup da qual sou co-fundador e presidente, os clientes já estão fora do Brasil e o que buscamos é nos aproximarmos deles e consolidarmos a empresa como uma fintech internacional de pagamentos. Então, ter uma gestão profissional e consolidada nos EUA faz mais sentido para as nossas metas de médio e longo prazo, além de facilitar a gestão das subsidiárias que estamos abrindo na América Latina, como México, Colômbia, Chile e Uruguai.
Ser o novo Vale do Silício não é tão simples quanto o Suarez faz parecer na internet
Além do reconhecido Silicon Valley, outras cidades dos Estados Unidos tentaram ser o mais novo hub tecnológico do país, como Salt Lake City, apelidada de Silicon Slopes; Portland, como Silicon Forest; Austin, como Silicon Hills, dentre outras. Talvez Miami queira disputar a alcunha de Silicon Beach com Los Angeles, mas até chegar lá, há muito o que percorrer.
Apesar dos esforços do prefeito Francis Suarez e do entusiasmo do setor, há outros fatores que devem ser levados em consideração para transformar a cidade em um centro tecnológico. Como, por exemplo, ter uma produção intelectual e acadêmica que acompanhe o setor empresarial com novas pesquisas e adequação da infraestrutura para receber uma intensa migração. Inegavelmente, Suarez está trabalhando para aproveitar todo o capital intelectual que a cidade pode ter com o desenvolvimento desse hub. Simultaneamente, o setor empresarial/empreendedor está aproveitando os benefícios oferecidos, mas esse (ainda novo) cenário, corre o risco de sofrer mudanças.
Eleições de 2021
Eleito em 2017, o mandato do prefeito Francis Suarez, principal responsável pela estruturação de Miami como novo hub tecnológico dos EUA, se encerra em 2021 e, novas eleições acontecem em 02 de novembro. Com a possibilidade de ser reeleito para mais quatro anos de gestão, o republicano concorre ao páreo contra outros três candidados confirmados: Anthony Melvin Dutrow, partido independente; Mayra Joli, partido republicano; e Maxwell Manuel Martinez, do partido democrata.
Acredito que uma realidade onde homens com carecas queimadas caminham pela Lincoln Road ao lado de nós, empresários e nossas maletas cheia de planos de negócios (além de um short e bronzeador embaixo de tudo, só para garantir), está prestes a acontecer. Porém, Miami enquanto um destino summer vacation, pero también, work innovation só será alcançada quando, independente do partido, o hub tecnológico for reconhecido pela economia local e fomentado por quaisquer candidatos. Francis Suarez deu início, resta ao tempo dizer se o Vale do Silício encontrará uma nova região para disputar a presença de grandes corporações e unicórnios.