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Artigo: Do pastel de nata ao unicórnio, Web Summit traz mundo ainda desconhecido

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* Dan Yamamura é sócio-fundador da Fuse Capital

Como explicar o Web Summit? É uma mistura de muitas coisas. É como uma startup, muitas coisas acontecendo ao mesmo tempo. É fácil errar no Web Summit, querer tudo e sair sem nada de lá. Vou tentar ser mais claro.

É um show? Sim, palco gigante em um estádio, luzes, megaprodução. É uma feira? Sim, muitos estandes com muitos prestadores de serviço, ligados a apoio a startups, em busca de clientes ou divulgando a marca. Empresas gigantes como a Amazon e a Cisco, assim como startups já grandinhas como E-toro, Build.ai, entre outras. É uma feira de ciências? Sim, várias startups, bem no começo e outras nem tanto, mas ambas expondo o seu produto de alguma forma e sempre à procura de parcerias, investidores e clientes. É um happy hour? Também, são áreas enormes com muita cerveja, vinho e infinitos tipos de comida com enormes mesas para todos se integrarem e trocarem experiências.

É uma conferência? Sim, há palestras das mais específicas, muito técnicas, às mais estratégicas tentando olhar para o mundo daqui a uma década com palestrantes em um nível altíssimo. É um demo day? Sim, vários founders fazendo pitch, laptop aberto mostrando gráficos, modelos de negócio dos mais diversos. E estão à procura de investidores, mentores, parceiros e tudo que puder ajudar. É um Tinder? Sim, tem um app do evento a partir do qual as pessoas procuram uma às outras, trocam ideias e marcam encontros em locais próprios para isso no evento ou mesmo nas praças de alimentação.

Cada uma dessas faces do Web Summit é todo um mundo a ser explorado. Sem um objetivo claro, é muito fácil se perder. O meu intuito, como gestor de um fundo que investe em empresas disruptivas e exponenciais, foi conhecer temas e assuntos que ainda não parecem tão relevantes, mas que deverão ser muito relevantes na próxima década. Temas que me ajudassem a construir teses de investimento mais fora do lugar-comum.

Nessa linha de raciocínio, segui a trilha das palestras. Ainda assim era preciso focar, pois eram mais de 20 palestras simultâneas acontecendo em um espaço de quatro pavilhões gigantes e um estádio com 20 mil pessoas de capacidade. As palestras podem acontecer em diversos lugares, no estádio, em um auditório, em uma sala de reunião ou em um pequeno palco dentro dos pavilhões. Fiquei com a impressão de que quanto mais intimista a apresentação, mais técnica e detalhada era a palestra. Já nos grandes auditórios, o debate era mais estratégico e filosófico. Os tempos variam de 15 minutos a 1 hora. E os formatos também: um indivíduo, uma entrevista com dois , um debate com mais de três pessoas ou até mesmo uma sessão só de Q&A. Pessoas de altíssima qualidade e super respeitadas no seu meio, porém as mais variadas possíveis. Gente muito técnica, ídolos de esportes, ativistas, C-Level de companhias gigantes, políticos, cantores, entre outros. E muitos, muitos founders de toda parte do globo.

Seguindo uma trilha mais estratégica e tentando prever quais os temas que vão ganhar importância ao longo da próxima década, irei passar aqui brevemente por alguns dos temas que me chamaram atenção e que acredito que vão ganhar muita relevância nos próximos anos.

AGI, a disrupção da IA

A Inteligência Artificial (IA) já é uma realidade no nosso dia-a-dia, das mais diversas formas. Muitas aplicações com as quais lidamos no cotidiano têm por trás a IA. Porém, apesar de seu grande poder, alavancado pelo crescente potencial computacional, a AI ainda funciona de uma forma muito compartimentada. Por exemplo, enquanto escrevo, um corretor ortográfico do Google usa IA de natural language processing, já quando pego meu celular e olho pra ele é um algoritmo de machine perception IA que me reconhece e desbloqueia a tela. E assim, há outras diversas “formas” de IA, como machine learning, motion and manipulation, social intelligence, entre outras. No entanto, essas “formas” não “conversam” entre si. No cérebro humano, todos os tipos de inteligência são misturados e as decisões são tomadas. Inteligência artificial não faz isso, mas o AGI (Artificial General Intelligence) o fará.

O AGI será capaz de usar todas as “formas” existentes de IA, inter-relacioná-las e tomar decisões. É um nível de inteligência nunca antes visto. Hoje, cerca de 70% dos investimentos de pesquisa em IA estão sendo feitos em AGI, segundo certos palestrantes mencionaram. No caminho desse desenvolvimento, os desafios são gigantes, talvez menos pelo lado da ciência e mais pelo lado da ética, da regulamentação e dos limites que a sociedade vai impor. Isso porque, no limite, um AGI super treinado vai poder criar o seu próprio AGI, uma versão turbinada do cérebro humano criado pelos próprios robôs.

Crédito de carbono? E o débito?

Muito da evolução que vivemos atualmente foi criada com o uso descontrolado de diversos recursos da natureza. E hoje a sociedade cobra um uso mais controlado, mas não sem querer abrir mão da evolução conquistada. Para que isso ocorra de forma efetiva, diversas frentes têm sido criadas – e uma das mais difundidas, é o crédito de carbono.

Seguindo o princípio da contabilidade, tudo deveria ter partidas dobradas. Conceitualmente, toda a parte do débito do carbono é a emissão de gases poluentes, incluindo o próprio carbono. E só para a gente não entrar muito a fundo no tema, as emissões são de natureza direta e indireta. O arcabouço geral já está criado, mas ainda estamos muito longe de termos um sistema contábil ou método consolidado para a contabilização do carbono. E é aí que surgem as oportunidades.

Grande parte dessa “contabilidade” ainda é feita por estimativa, não há padrão, não há um IFRS, um FASB ou algo equivalente. E na era do blockchain, a contabilidade não será feita nos livros contábeis, mas em blockchain, muito mais transparente e descentralizado. Empresas gigantes já vem se movimentando neste setor, como foi o caso da Microsoft que levantou um fundo de $1bi para startups que queiram se aventurar por essa área. É ainda um oceano azul a ser desbravado, e as grandes empresas sabem que a solução não virá delas. No entanto, como grandes “poluidoras”, elas precisam estar à frente desse movimento.

Evolução da internet

Que a internet está super presente em nossas vidas profissionais e pessoais a gente não tem dúvida. No começo, a internet não tinha o Google nem o Meta (nome novo do império que compõe o Facebook, Instagram, WhatsApp, entre outros). A web era mais livre, porém desorganizada e difícil de navegar.

Já a Web2, que foi dominada pelos gigantes, ficou mais legal, mais fácil de usar e “gratuita”, mas em troca nossa vida dentro e fora da web (depois que o celular virou smart) viraram dados preciosos para esses gigantes. Com o uso inteligente (artificialmente, via AI) desses dados, as assertividades na conversão para propaganda cresceram exponencialmente. Traduzindo: para uma empresa que produz bens ou oferta serviços, encontrar o seu cliente no mundo ficou muito mais fácil com a ajuda de gigantes como o Google e o Meta. Assim, a propaganda passou a ser mega direcionada e personalizada, sendo possível achar o seu cliente na hora certa, como num passe mágica. É quase só pensar em um assunto, que a oferta de consumir algo relacionado a este assunto aparece na sua frente. Mas vale dizer que nem todos estão felizes com isso. De fato, isso começou a incomodar grande parte da população, das empresas, dos reguladores e dos poderes públicos que não fazem parte das gigantes de tecnologia.

Eis que surge aí a nova internet, a Web3, na qual não haverá um gigante, já que o “gigante” vai assumir formas descentralizadas (não sabemos como ainda). Teoricamente, as pessoas serão mais donas dos seus dados e as monetizações serão mais transparentes. Ainda estamos mais longe do que perto dessa nova internet, mas algumas importantes revoluções já estão acontecendo. Um grande exemplo é o Ethereum, uma moeda descentralizada, onde uma comunidade enorme tem um certo poder, mas nenhuma instituição manda ou é dona. Os mineradores têm o poder, mas nunca de forma centralizada, sempre em comunidade. Isso incomoda os centralizadores, no caso das moedas, os Bancos Centrais. O Ethereum é uma moeda global, sem fronteiras, que funciona 24/7 – enquanto para comprar outras moedas, há horários, formulários, cadastros e muitas outras fricções para se comprar ou vender. O Ethereum, no entanto, não compra coisas do mundo real, está preso ao universo dos investimentos ainda. Eu ouvi “crypto is freedom”, e faz bastante sentido.

Muitos e muitos outros temas foram discutidos no Web Summit. Tópicos como: O que esperar do Metaverso? Como será a próxima fronteira do conhecimento do cérebro? Como as gigantes tech vão se transformar para a Web3? A propaganda em massa vai acabar? Poderia escrever teses e mais teses sobre o que foi discutido ao longo da última semana, mas esses são alguns temas que escolhi destacar. São insights que são extremamente importantes para nos guiar nas teses de investimentos que pretendemos fazer. Espero que tenha trazido novidades, pois eu mesmo fiquei surpreso com o avanço e a força dessas discussões e tecnologias apresentadas.

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