Daniel Caramaschi e Fábio Tayar são, respectivamente, sócio e advogado da área de Fusões e Aquisições do Demarest Advogados.
Não é novidade que o mercado de fusões e aquisições nas startups está superaquecido há um par de anos. O Brasil segue uma tendência global de grandes investimentos nas startups o que, como em qualquer outro lugar, pode ser um grande atrativo. Apesar de os riscos de investimento serem comparativamente mais altos que uma aquisição convencional, o valor em si geralmente não é expressivo. O mais importante é o retorno: caso o investimento dê certo, ele é imensurável. A máxima “risco-retorno” nunca foi tão bem definida.
Diariamente são reportadas inúmeras operações, tanto upstream quanto downstream, isto é, tanto os investidores estão fazendo aportes nas startups — tema que é objeto deste artigo —, como as próprias startups estão se unindo umas às outras, por conta da concorrência feroz e dos altos custos para se tirar uma ideia do papel.
Como em qualquer empresa já consolidada que pretende receber aportes, a auditoria (ou due diligence) também faz parte do processo nas startups. Porém, o que é bastante diferente são os resultados encontrados. Isso é especialmente válido nas situações em que o investimento não tenha sido precedido de um round de capitalização e/ou caso a Target não tenha se organizado para sugerir que é “mais profissional”, ou “menos informal”.
Notamos que as startups em estágios iniciais, em sua vasta maioria, abusam da informalidade, sendo meramente uma extensão de outras atividades dos sócios. Muitas vezes não têm sede própria nem conta bancária individualizada, e é comum haver poucos ou nenhum contrato. Enquanto na due diligence de uma companhia convencional geralmente encontramos uma segregação facilmente identificável de cada uma das áreas de análise, a due diligence em uma startup esbarra em muitas lacunas jurídicas, confusão patrimonial entre sócios e, na maioria das vezes, pouca sofisticação administrativa e informalidade excessivas.
Em outras palavras, “arrumar a casa” para iniciar uma captação de recursos é importante, não apenas para dar conforto àqueles que farão o investimento, mas também para tornar o ativo mais atraente. A forma como a startup é “vestida” pode até fazer com que ela seja mais ou menos interessante. É óbvio que o principal motivo de investimento é a expectativa de retorno do capital investido, com base no que as startups prometem entregar e pela tecnologia aplicada para tais objetivos. Ainda assim, parece inegável que quanto mais bem estruturada a startup esteja previamente, mais facilmente o investimento se concretizará e mais segurança os investidores terão em realizar tal investimento.
O ordenamento jurídico e a criatividade dos escritórios de advocacia, incluindo o nosso, concedem um vasto leque de alternativas para estruturar uma operação. O que temos visto regularmente são estruturas de dívidas conversíveis em participação societária, os famosos “mútuos conversíveis”.
Essa estrutura tem sido bastante utilizada por investidores por alguns motivos: maior facilidade de execução judicial da dívida em caso de default; desconsideração da personalidade jurídica atingindo exclusivamente os sócios da Target, e não os mutuantes; possibilidade de aceleração da dívida em caso de determinados eventos; e, não menos importante, a elaboração de um documento mais simples, em que muitas vezes sequer há indenização, comumente vista em contratos de M&A mais complexos.
Entretanto, por mais que a estrutura seja conhecida por todos, esses mútuos conversíveis, em geral, abordam matérias importantes e têm o fito de ser uma espécie de “acordo de acionistas” (preservação do investimento, em especial), além de garantir aos investidores, em etapas incipientes, um valuation maior do que para os que entrarem subsequentemente.
Também é verdade que M&As em startups são todos virtualmente de operações primárias, isto é, emissão de novas ações e pagamento à Target, e não aos acionistas. Estes, aliás, geralmente têm o interesse em permanecer no negócio que criaram e utilizar os fundos de aporte para investimento em tecnologia e, em especial, escalabilidade.
Nessas operações também é bastante comum nos depararmos com planos de opção de compra de ações (os Stock Option Plans). Para o investidor, é extremamente importante saber qual será sua participação em bases totalmente diluídas (fully diluted basis), uma vez que a retenção de talentos em startups deve-se muito a esses planos de opção.
Não menos importante são os direitos de saída ou retirada, os “exit rights”. Estes já são bem abordados pela doutrina e prática jurídica e em pouco diferem dos exit rights que vemos em operações que não envolvam startups.
É importante contar com assessores em todas as frentes de um processo de M&A, incluindo assessoria aos investidores ou às startups, tanto no processo organizacional para atração e recebimento de investimentos como na assessoria de startups e seus sócios quando do investimento. Fato é que investir no empreendedorismo, especialmente no atual momento, tem se mostrado um excelente negócio!