* Guilherme Chambarelli é sócio da Chambarelli Advogados e diretor da TaxLab University
As startups possuem diversas peculiaridades e, por se tratarem de negócios inovadoras e com estrutura operacional enxuta, necessitam de muita atenção nas áreas jurídicas e, principalmente, tributária.
O empreendedor precisa saber que Brasil possui uma das mais complexas legislações tributárias do mundo. Ao lado disso, os empresários precisam enfrentar uma série de obrigações acessórias e uma elevada carga tributária. Isso contribui para a estatística das startups que morrem em seus primeiros anos.
Por isso, é fundamental para a sobrevivência do negócio encontrar meios de reduzir o impacto fiscal sobre a atividade.
O primeiro passo, em termos fiscais, de toda empresa é a escolha do regime tributário. As startups podem optar pelo Lucro Real, Lucro Presumido ou Simples Nacional, sendo que cada um desses regimes pode apresentar vantagens e desvantagens de acordo as características e os números da empresa.
Por isso, na constituição de uma startup, é de extrema importância que se faça não só um plano de negócios mas, também, um plano de negócios tributário abordando e avaliando todas as possibilidades para o sucesso fiscal da startup.
Em apertada síntese, o Plano de Negócios Tributário consiste em entender os reflexos tributários decorrentes da adoção da estratégia negocial da startup, como: estrutura societária; modelo de negócios; ramo de atividade; relação com sócios, investidores, fornecedores e colaboradores, dentre diversos outros pontos.
Mas essa tarefa precisa ser realizada não apenas no início da startup. Considerando que as pivotagens são comuns em se tratando de startups, é fundamental inserir o plano de negócios tributário na rotina da startup e revisitar o impacto tributário de cada pivot. Ou melhor ainda: pivotar de acordo com o melhor cenário tributário para a startup.
A elaboração desse plano de negócios tributário consiste em analisar e responder algumas perguntas, tais como:
Qual é a minha atividade?
O primeiro passo na elaboração do plano de negócios tributário para uma startup consiste em entender o seu modelo de negócios. Estamos diante de um produto ou de uma prestação de serviços? A startup vende seus produtos ou é apenas intermediária (marketplace)? Qual é o impacto tributário disso? Com base nesses e outros questionamentos, é possível concluir em qual cenário a startup se encontra.
Essas perguntas servem para definir alguns pontos tributários muito relevantes, como: (i) se a empresa pagará ICMS ou ISS; (ii) o Anexo do Simples Nacional aplicável; ou (iii) qual será a margem de presunção no Lucro Presumido.
Entendido o ramo de atividade, é hora de identificar quais são os principais pontos de atenção no negócio, para então apontar o que pode ser alterado.
Qual será a minha margem de lucro?
Evidentemente, a margem de lucro tem impacto direto na carga tributária. A margem de lucro é um dos principais critérios para a escolha do regime tributário, na medida em que regimes do Simples Nacional e Lucro Presumido os tributos incidem sobre o faturamento, ou seja, haverá tributo a pagar mesmo com prejuízo – diferente do Lucro Real.
Para quem eu vou vender? E para onde vou vender?
Também é relevante definir se a empresa atuará no ramo B2B, B2C, B2G ou outro. Tais questões impactarão em questões fiscais como a necessidade de retenção de tributos, substituição e responsabilidade tributária.
A localização do cliente também é um fator a ser considerado, uma vez que poderá ocorrer operação de importação de mercadorias ou serviços, com aplicação de regras de tributação internacional. No caso de vendas de mercadoria para outros Estados, também incidirão regras específicas no ordenamento do ICMS para operações interestaduais, como recolhimento do DIFAL.
O ponto chave nesse quesito é encontrar Estados ou Municípios que possuem regras tributárias mais vantajosas para a startup, com a aplicação de certos benefícios fiscais.
É imprescindível analisar cada cenário operacional no detalhe. Contudo, além do impacto tributário do cenário, é preciso também identificar os impactos no próprio negócio. Por exemplo, uma mudança de cidade em busca de um incentivo fiscal pode gerar redução de tributos, mas o aumento do custo logístico. Por isso, toda a operação deve ser analisada.
Como remunerar meu time?
Existem diversas formas de contratação do time de colaboradores em startups. Podem ser feitos contratos de prestação de serviços (pejotização), via MEI, ou mesmo contrato de emprego nos moldes da CLT. Além disso, as empresas podem estipular diversas formas de remuneração: prestação de serviços, salários, bônus, programa de participação nos lucros e resultados, vesting e stock options, dentre outros.
Cada tipo de contrato e de remuneração possui tratamento tributário específico que merece ser levado em consideração.
Como remunerar os sócios?
Além do time, os sócios também precisam ser remunerados. E nesse aspecto, as startups podem convencionar o pagamento de pró-labore, dividendos proporcionais ou desproporcionais, Juros sobre Capital Próprio (JCP), dentre outros. Igualmente, cada tipo de remuneração terá seu impacto fiscal.
Como remunerar os investidores?
Uma das características das startups é a necessidade de capital de terceiros para financiar o crescimento da empresa. Por isso, os investidores possuem um papel fundamental para as startups.
Existem diversos tipos de contratos de investimentos, sendo que o mais utilizado no mercado é o mútuo conversível. Por isso, é preciso ter muito cuidado com os assuntos fiscais na negociação com investidores, como a possibilidade de tributação do ágio na aquisição da participação societária, bem como do ganho de capital decorrente de sua alienação.
Conclusão
Os riscos aplicáveis à escolha de cada cenário não podem ser deixados de lado. Em se tratando de Brasil, o empreendedor precisa ter em mente que irá lidar com constantes mudanças legislativas e jurisprudenciais. Evidentemente, para cada cenário existirão riscos que precisam ser levados em conta.
Por fim, destacamos que o Plano de Negócios Tributário para Startups deve considerar: (i) a fase de desenvolvimento da startup; (ii) as expectativas do sócio e projetos já definidos, (iii) a possibilidade de recebimento de investimentos; (iv) a necessidade de desenvolver P&D; e (v) as oportunidades interligadas.
Um bom plano de negócios tributário é uma ferramenta muito importante para otimização operacional da empresa, aumento da margem de lucro e geração de caixa, trazendo também um ganho em competitividade. E mais do que isso, ter uma estrutura tributária bem organizada é um fator chave na hora de captar investimentos.