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*Flávia Mello é investidora e mentora de empresas fundadas por mulheres que desenvolvem soluções para equidade de gênero, entre elas: SafeSpace, Oya, HerMoney, Feel e The Feminist Tea

 

O ano é 2021 e ao invés de andar em carros voadores, estamos ensinando robôs de inteligência artificial a responder ao assédio. O problema é tão grave que até a UNESCO precisou entrar nessa história. As robôs Siri (Apple), Alexa (Amazon), Bia (Bradesco) e Lu (Magazine Luiza) recebem diariamente uma variedade gigantesca de mensagens ofensivas e de cunho sexual. Para dar uma ideia da dimensão, o Bradesco divulgou que a Bia recebeu, apenas em 2020, 95 mil mensagens com ofensas e assédio sexual.

Em 2019, a Apple se viu em uma crise de imagem quando veio à tona que a sua assistente virtual Siri, usada em mais de meio bilhão de dispositivos, respondia a assédios sexuais de forma inaceitável: “Eu ficaria corada se pudesse”. Seu software foi atualizado para reagir a insultos de forma mais direta: “Não sei como responder a isso”, mas seria suficiente para combater o abuso de gênero?

A subserviência projetada em assistentes com voz de mulheres jovens fornece uma ilustração poderosa de como os preconceitos estão codificados em produtos de tecnologia. Em um momento em que a tecnologia toma conta de todos os setores, essas questões ficam cada vez mais alarmantes.

Vivemos na era do algoritmo e cada vez mais as decisões que afetam nossas vidas de forma importante – como conseguir um emprego, um empréstimo e o quanto pagamos por seguros – não estão sendo tomadas por humanos, mas por máquinas. Em teoria, isso deveria levar a um sistema mais justo: todos são julgados de acordo com as mesmas regras. Mas, como revela a matemática e cientista de dados Cathy O’Neil em seu livro Armas de Destruição Matemática, os modelos usados ​​hoje não tem regulamentação ou auditoria e são consideráveis incontestáveis, mesmo quando estão errados. Mais preocupante ainda, eles reforçam a discriminação.

Para construir um futuro mais igualitário, as mulheres precisam de um lugar à mesa. Elas precisam estar envolvidas em projetos de tecnologia desde a sua concepção. Infelizmente, a realidade é bem distante disso: elas representam apenas 17,5% da força de trabalho de tecnologia em todo o mundo (Honeypot, 2018) e ocupam apenas 5% dos cargos de liderança nessas áreas (PWC, 2017)! Nos países do G20, elas produzem apenas 7% das patentes de tecnologias de informação e comunicação (OECD, 2018). E a causa raiz disso é a falta de estímulo que damos às meninas para cursar formações relacionadas à Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática.

Essas lacunas deveriam fazer políticos, educadores e empresas ‘corarem’ de medo visto o imenso impacto econômico gerado: estima-se que alcançar equidade de gênero em campos de desenvolvimento científico e tecnológico significaria, por exemplo, a criação de 1,2 milhão de empregos e um impacto no PIB europeu de €610 a €820 bilhões até 2050, segundo o EIGE Europe.

Hoje em dia é difícil nomear dois propulsores mais potentes para sociedades prosperarem que a alfabetização e o amplo acesso e domínio de tecnologias digitais, sem as restrições de gênero, raça e classe social que agravam imensamente o problema.

 

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