*Felipe Magrim é diretor de Políticas Públicas e Relações Governamentais na Unico
A indústria de tecnologia e os usuários mais atentos estão acompanhando o desenrolar dos projetos de regulamentação da inteligência artificial (IA) no Brasil desde 2022. Hoje, estamos ainda na metade deste processo, mas já contamos com um relatório abrangente e bem detalhado, que traz uma definição de sistemas de inteligência artificial, IA generativa, agentes de IA (desenvolvedores, distribuidores e aplicadores) e aponta como cada recurso deve ser tratado pelos agentes fiscalizadores.
Um dos pontos de atenção neste processo foi o debate sobre a utilização de sistemas baseados em dados biométricos, principalmente a biometria facial. Uma vez que esse recurso pode ser usado de diversas formas, desde o acesso ao celular até o reconhecimento de criminosos, as preocupações do setor de tecnologia sobre a fiscalização dessa ferramenta aqueceram o debate e levantaram questões que vão desde vieses discriminatórios até limitações de uso.
No entanto, o novo relatório apresentado pelo Senado trouxe uma inovação essencial: a distinção entre soluções de identificação e de autenticação com biometria facial. Esse tópico é importante pois trata de tecnologias com objetivos completamente diferentes. Enquanto a identificação envolve o reconhecimento de características físicas e comportamentais, com o propósito de identificar um indivíduo, a autenticação compara os dados biométricos armazenados de uma pessoa para confirmar sua identidade, normalmente utilizado em transações que exijam maior segurança, como transações bancárias e de pagamentos.
Quando falamos em IA para distinguir pessoas, um dos maiores riscos inclui as soluções de reconhecimento facial, como as câmeras instaladas em espaços públicos com foco em vigilância ou, em alguns países, até para identificar emoções. Esse sistema usa a biometria facial de forma imprecisa e pode gerar uma série de falsos positivos, como os casos vistos no Brasil de pessoas presas por engano, após serem “reconhecidas” pela IA.
Ela é totalmente diferente da autenticação biométrica, realizada com transparência e respeitando os direitos do cidadão no tratamento de seus dados pessoais, garantidos pela Constituição e pela LGPD. Enquanto a identificação é listada na proposta como atividade de alto risco, a autenticação é vista pela sociedade como um sistema muito benéfico, capaz de acelerar processos de identidade digital, diminuir custos e tornar transações financeiras mais seguras, entre outros.
Vemos cada vez mais novos mercados recorrendo à autenticação biométrica para validar as informações sobre seus usuários. Um deles são as plataformas de apostas online, as chamadas Bets, cuja regulamentação exige, a partir de janeiro de 2025, o uso da biometria facial para a proteção de jogadores e empresas, reduzindo o potencial de fraudes e atividades ilícitas, além de validar se os usuários são menores de idade ou não. As regulamentações são necessárias e devem abarcar uma série de detalhes e cenários.
O mundo inteiro está discutindo isso e o Brasil mostra sensatez ao buscar soluções mais justas e longevas, como diferenciar em lei soluções que parecem semelhantes, mas que não poderiam ser mais distintas. Todo esse debate ainda requer tempo e dedicação, mas seguimos otimistas no desenvolvimento desse projeto e apostando no futuro da biometria facial.