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Capacidade preditiva definirá lucro de fintechs em tempos de Bets e Selic alta

Olhar o futuro a partir dos dados do passado será um fator determinante para o sucesso das fintechs, diz Jhonata Emerick, CEO da Datarisk

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Fintechs | Canva

O ano de 2025 começará com dois fatores que estão gerando debates acalorados em diversas camadas do mundo corporativo. Um deles é a regulamentação do funcionamento das casas de apostas (Bets), que entra em vigor em janeiro. O outro é a discussão sobre o  exagero ou a necessidade dos aumentos recentes e futuros da taxa Selic. Enquanto isso, já se consolida a certeza de que a capacidade preditiva, ou seja a capacidade de olhar o futuro, a partir dos dados do passado será um fator determinante para o sucesso ou o fracasso das fintechs ao longo do próximo ano.

Afinal, num ambiente de inadimplência já acostumado a patamares perigosos, estes dois fatores ameaçam dificultar ainda mais as condições de pagamento das pessoas e ter uma alta capacidade preditiva, entendida como a capacidade de avaliação de risco, para evitar prejuízos será um dos principais diferenciais competitivos nos próximos meses.

No caso da Bets, por exemplo, o próprio Banco Central tem alertado sobre o impacto das apostas esportivas na economia. De acordo com o relatório da autoridade monetária, o valor médio mensal transferido para apostas chega a R$ 3 mil entre pessoas com mais de 20 anos.  A capacidade preditiva das fintechs precisa levar este dado em consideração de forma séria uma vez que a renda média do brasileiro é de apenas R$ 3.200, conforme levantamento recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Não por acaso, um estudo da CNC revelou que, no primeiro semestre de 2024, 1,3 milhão de pessoas entraram em inadimplência devido ao jogo online. As fintechs devem ter uma capacidade preditiva suficientemente capaz de detectar esse comportamento pois ele reflete diretamente nas decisões de consumo: muitos apostadores estão priorizando as apostas em detrimento do pagamento de suas responsabilidades assumidas em contratos de financiamento e crédito em geral.

Indícios da necessidade de ampliar a capacidade preditiva a este ponto aparecem por exemplo na pesquisa “Bets e inadimplentes: A relação dos inadimplentes com apostas no Brasil”, conduzida pela Serasa em parceria com o instituto Opinion Box. O estudo revela que 46% dos inadimplentes já realizaram apostas pelo menos uma vez. Dentre eles, 13% dos inadimplentes admitiram ter deixado de pagar contas para poder apostar.

Na busca por caminhos para aumentar a capacidade preditiva dos scores de crédito no que se refere à questão das Bets, um estudo da Datarisk revelou que quando uma pessoa possui um parente que aposta, a probabilidade de também adotar esse comportamento aumenta em cerca de 77%. Esse efeito é ainda mais pronunciado quando os pais são apostadores, elevando a probabilidade para aproximadamente 216%.

Diante da possibilidade de os altos juros da Selic se somarem com este novo fenômeno e produzirem um endividamento catastrófico principalmente para empresas iniciantes no mercado de concessão de crédito, a capacidade preditiva ganha áreas de ferramenta decisiva. Entre as diversas maneiras que a capacidade preditiva pode ajudar, se destaca a forma de selecionar quais são os melhores clientes e quais são as melhores condições de conceder crédito a eles.

Ter capacidade preditiva assertiva neste quesito é primordial porque, apesar do desejo sempre justificável de aumentar a carteira, no final do dia a realidade se impõe com seus altos custos de investimento e cobra um preço caro por eventuais erros de avaliação.

Para minimizar esses erros, o ideal é utilizar modelos segmentados que aumentem a capacidade preditiva por meio de Machine Learning (ML). Essas soluções podem atribuir uma probabilidade maior de uma pessoa vir a se tornar um apostador, por exemplo.  

A partir deste momento, para quem atua no sistema financeiro, torna-se imprescindível utilizar os insights gerados por dados e inteligência artificial (IA) para ampliar o máximo possível a capacidade preditiva. A aplicação da IA busca mitigar possíveis dificuldades de pagamento, especialmente em situações como concessão de crédito ou vendas parceladas.

Os dados são fundamentais como direcionadores, mas, isoladamente, não resolvem o problema. É necessário criar uma camada adicional de inteligência, onde todas essas informações da capacidade preditiva sejam integradas em uma decisão (score) que seja prática e fácil de aplicar em processos dinâmicos, como o de concessão de crédito.

Estudos de caso relacionados ao fenômeno das apostas nos EUA revelam que, mesmo após a regulamentação, os consumidores tendem a aumentar seus gastos e níveis de endividamento. A diferença é que lá eles não possuem uma taxa básica de juros nem próxima à nossa.

Seja como for, as apostas esportivas já se consolidaram como uma realidade no Brasil e vieram para ficar, não sendo um fenômeno passageiro. Sendo assim, a capacidade preditiva e o monitoramento contínuo de variáveis, modelos e do mercado devem seguir ritmos de evolução proporcionais. Quem duvidar pode perder as apostas de lucratividade no setor de crédito.