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Como determinar o valor de uma empresa early stage

Alguns fatores, como o fato de não possuírem quase nenhum ativo tangível, torna a avaliação de uma empresa early stage desafiadora

Foto: Canva
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*Paulo Tomazela é sócio da KPTL

Mas afinal, quanto vale uma empresa? Chegar a um número que satisfaça tanto o comprador quanto o vendedor é uma das questões mais importantes e pouco debatidas no venture capital. Avaliar o valor de um negócio em estágio inicial é um dos desafios mais complexos enfrentados por investidores e empreendedores. Isso porque essas empresas geralmente não têm um histórico de resultados consistentes para sustentar suas projeções financeiras e prever seu potencial de crescimento futuro.

Por que a Uber vale mais do que a Petrobras? Ou o que justifica que o Airbnb valha quase 10 vezes a Rede Accor em todo o mundo? Avaliações de empresas early stage são normalmente também baseadas em projeções financeiras e expectativas de mercado, o que significa que há uma grande dose de incerteza envolvida na determinação do montante. Uma startup pode ter uma ideia inovadora e uma equipe talentosa, mas isso não garante o sucesso no mercado.

Sempre que me sento com o pessoal que trabalha em fusões e aquisições (M&A), conto um episódio, no mínimo, interessante. Há alguns anos tínhamos uma empresa investida que havia desenvolvido uma solução baseada em bioativos da flora brasileira. A tese era bastante interessante e pensávamos à época em levar para a costa oeste americana seus produtos, onde há uma forte cultura de saúde e bem-estar.

Passados os primeiros anos de investimentos e aceleração dos negócios dessa empresa, percebemos que o tamanho do obstáculo em fazê-la escalar estava muito além do que imaginávamos. E, como acontece com muitas empresas na sua fase de go to market, a empresa ainda não tinha decolado.

Estávamos então discutindo os caminhos possíveis do negócio com todos os sócios fundadores, quando um problema mais urgente apareceu: a companhia tinha uma dívida com o dono do imóvel que ela ocupava, e precisaria à época de relativamente pouco dinheiro, algo como um carro popular. Com exceção do fundo, nenhum outro sócio apresentava condições financeiras para comparecer com a sua parte nessa despesa.

Como tínhamos uma participação societária bastante alta lá – 49% – decidimos fazer um aumento de capital do valor dessa despesa e do necessário para dar mais um ano de fôlego financeiro à investida, e assim garantir mais tempo de vida à empresa.

Acontece que, por não querermos assumir uma posição majoritária na companhia, calculamos que precisaríamos avaliar a empresa em torno de 3 vezes a estimativa inicial que fizemos ao aportar o primeiro capital, tudo para não ultrapassarmos os 50% de participação societária lá. Lembrando que ela ainda estava desenvolvendo a solução, e certamente, naquele momento pelo menos, não tinha se valorizado 3 vezes em relação a quando entramos. E assim fizemos um novo aporte via aumento de capital.

Eis que o empreendedor foi dar uma palestra num evento focado em startups e investidores, e após fazer o pitch da startup foi abordado por um dos participantes que tinha uma empresa para a qual a solução desenvolvida seria muito conveniente. O empresário perguntou se o empreendedor tinha sócios e se interessou em adquirir a parte do fundo. Ao questioná-lo por qual valor ele achava que o fundo venderia sua participação, de imediato o fundador disse: “olha, recentemente houve um aumento de capital na companhia e ela foi avaliada em tanto”. Daquela conversa, até a assinatura dos documentos definitivos de venda da nossa participação, não levamos mais que poucas semanas!

Este é um caso ocorrido, improvável, mas que eu costumo contar sempre que se discute fusões e aquisições no venture capital. Afinal, quando estamos ponderando investir numa nova empresa que ainda está testando um produto ou serviço, posso afirmar: qualquer projeção é quase um ato de fé.

Fatores avaliados

Hoje, depois de acumular mais de 100 investimentos em startups, aprimoramos um sistema de avaliação baseado em notas, ou balanced score card, que leva em consideração vários fatores como: se o empreendedor tem experiência; se já fez outros negócios; se o setor de atuação está crescendo; etc entre outros fatores. Mesmo não sendo uma ciência de foguetes, é um método que tenta minimizar um pouco os possíveis desvios desse tipo de avaliação.

Claro, a partir do momento em que essa empresa começa a ter um produto mais consolidado e uma linha de faturamento, esse valor de mercado fica mais claro e se consegue já começar a pensar em vender a empresa trazendo seu valor futuro ao presente.

Para aquele empresário que gostou do valor que ouviu após a palestra, fez todo sentido comprar metade da empresa. Para ele, trazer aquela tecnologia para dentro do negócio que ele conhecia, renderia resultados financeiros muito superiores ao valor que ele pagaria.

Mas o ponto é: como chegamos neste valor? Sempre que falo com técnicos me lembro desse “causo”. Se a companhia naquele dia precisasse de um valor maior, digamos dois carros populares, nossa conta de valuation teria sido totalmente diferente, e maior ainda. Ou simplesmente perdido o acordo. O que nos leva à outra reflexão: no fundo o preço de um ativo é o quanto o comprador está disposto a pagar, e o quanto ele valoriza aquilo.

As condições do mercado podem mudar rapidamente, os concorrentes podem surgir e as demandas dos consumidores podem mudar, tornando difícil prever o sucesso a longo prazo de uma empresa. Outro fator que torna a avaliação de uma empresa early stage desafiadora é o fato de que essas empresas geralmente não possuem quase nenhum ativo tangível.

Diferente de empresas mais maduras, que possuem uma base de ativos estabelecida, como imóveis e maquinários, empresas em estágio inicial têm como principal, ou único ativo, sua equipe e sua propriedade intelectual. Como esses bens podem ser difíceis de avaliar, muitas vezes é necessário usar outros métodos para determinar o valor de uma empresa. E isso costuma ser muito, muito subjetivo.