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Fintechs decolam ao servir ao middle market das PMEs no cross-border

No Brasil, onde o setor de PMEs responde por cerca de 30% do PIB, apoiar sua internacionalização é uma questão de competitividade nacional

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Cross-border | Foto: Canva
Cross-border | Foto: Canva

*Por David Brito, Country Manager do Ebury Bank no Brasil

O avanço das fintechs no Brasil e no mundo começa a expor um ponto cego histórico das instituições financeiras tradicionais: a dificuldade em atender o chamado middle market PMEs, que são negócios com alto potencial de crescimento, mas que permanecem subatendidos pelo sistema bancário.

No comércio exterior, essa lacuna é ainda mais evidente. As PMEs representam o
segmento mais dinâmico do mercado em termos de crescimento de pagamentos
internacionais, mas 79% delas afirmam que os bancos tradicionais não conseguem
atender suas necessidades, segundo estudo da Ebury. As PMEs não aceitam mais ser
tratadas como cidadãs de segunda classe no comércio global. Querem operar com a
mesma eficiência das multinacionais. E, com as fintechs, isso já é possível.

Estima-se que as empresas não bancárias já respondam por 15% a 25% do mercado
global de pagamentos cross-border para PMEs — participação que deve chegar a 40%
até 2030. No Brasil, onde mais de 90% das companhias se enquadram nessa faixa, a
oportunidade é expressiva. O volume global de pagamentos internacionais de PMEs
deve crescer de US$ 17 trilhões em 2023 para US$ 24 trilhões em 2030, com taxa anual
média de 5%.

A tendência de desglobalização, impulsionada por fatores geopolíticos e pela
reorganização das cadeias produtivas, está mudando a forma como essas empresas
fazem negócios. O movimento de regionalização, somado à desdolarização gradual do
comércio exterior, cria desafios e oportunidades para quem atua com exportação e
importação.

Embora dois terços das transações globais ainda sejam liquidadas em dólar, essa fatia
vem diminuindo, à medida que moedas locais — como o real, o yuan e o dirham —
ganham espaço em rotas comerciais específicas. “A combinação de um cenário
multipolar, tecnologias financeiras e inteligência artificial está redesenhando a forma
como as PMEs se financiam e movimentam recursos”, diz David Brito, Country Manager
do Ebury Bank.

O desinteresse dos bancos tradicionais em atender esse público não é novo. Após a
crise financeira de 2008, grandes instituições redirecionaram seus esforços às
multinacionais, consideradas menos arriscadas e mais rentáveis, e reduziram o crédito
às PMEs. O resultado foi um vazio estrutural, que abriu espaço para as fintechs. Essas
empresas construíram modelos baseados em hiperpersonalização e atendimento
proativo em escala, combinando dados, automação e, mais recentemente, inteligência
artificial.

Com o avanço das tecnologias em nuvem e da IA generativa, tornou-se possível
democratizar o acesso a consultorias e análises financeiras complexas, antes restritas a
grandes corporações. Ferramentas de IA permitem mapear riscos cambiais, otimizar
fluxos de pagamento e automatizar estratégias de hedge, reduzindo custos e tempo de
operação.

A integração com sistemas de ERP (Enterprise Resource Planning, ou Planejamento de
Recursos Empresariais) e softwares contábeis também contribui para dar às pequenas
empresas uma visão consolidada das operações, com eficiência semelhante à de
grandes grupos.

Para os bancos, a necessidade de adaptação é urgente. A estratégia mais promissora,
segundo especialistas, é adotar um modelo de ecossistema, no qual instituições
financeiras, fintechs e provedores tecnológicos atuam de forma integrada, combinando
a solidez de capital e a conformidade regulatória dos bancos com a agilidade e a
inovação das startups financeiras.

Alguns bancos brasileiros já avançam nessa direção, seja por meio de parcerias
estratégicas, seja pela criação de divisões digitais independentes. Mas, de modo geral,
o desafio é cultural: aprender a operar em duas velocidades, preservar a segurança e o
compliance, mas permitir que as áreas digitais testem, errem e inovem.

No Brasil, onde o setor de PMEs responde por cerca de 30% do PIB e 70% dos
empregos formais, apoiar sua internacionalização é uma questão de competitividade
nacional. A ampliação do acesso a meios de pagamento, câmbio e crédito
especializados é vista como peça-chave para a inclusão dessas empresas nas cadeias
globais de valor.

A integração entre bancos e fintechs, mais do que uma tendência, tornou-se uma
exigência de mercado. Para as instituições tradicionais, a escolha é clara: reinventar-se
tecnologicamente e culturalmente ou perder relevância em um mercado em rápida
transformação.