*Por Guilherme Hoppe, coordenador de inovação do Ibrawork
A indústria de games no Brasil é hoje mais do que entretenimento, ela tornou-se um pilar fundamental da economia criativa. Somos um dos maiores mercados consumidores de jogos eletrônicos no mundo e temos potencial para nos consolidarmos também como produtores de conteúdo original, capazes de dialogar em escala global. Nesse cenário, programas públicos, incentivos legais e inovações tecnológicas abrem novas oportunidades, ainda que desafios estruturais precisem ser enfrentados.
Nos últimos anos, alguns estados brasileiros começaram a se destacar ao lançar iniciativas de fomento específicas para o setor. O Rio Grande do Sul, por exemplo, criou em 2020 o programa GameRS, que reúne ações de capacitação, estímulo à exportação e editais de financiamento voltados à cadeia produtiva dos jogos digitais. Minas Gerais, mais recentemente, lançou o PlayMinas, um projeto que conecta games, educação, cultura digital e empreendedorismo, e que terá como ponto alto a realização da Game Fest Minas, prevista para 2026. Já na Paraíba, o Circuito Game Dev Quest busca mobilizar talentos e oferecer apoio financeiro a equipes independentes, combinando formação, aceleração e oportunidades de apresentação a investidores. São experiências que demonstram como políticas públicas estaduais podem funcionar como sementes para o fortalecimento do ecossistema.
No âmbito federal, o avanço mais relevante foi a aprovação do Marco Legal dos Jogos Eletrônicos, sancionado em 2024. A nova lei estabelece regras para a fabricação, importação, comercialização e desenvolvimento de games no país, além de permitir que projetos acessem mecanismos de incentivo fiscal já conhecidos da cultura, como a Lei Rouanet e a Lei do Audiovisual. Trata-se de um passo importante porque oferece segurança jurídica, desburocratiza processos e amplia o acesso a recursos para quem deseja empreender e inovar no setor. Ao incluir os jogos no mesmo patamar de outras manifestações culturais, o Estado brasileiro reconhece sua relevância econômica, social e artística.
Nesse processo de fortalecimento do setor, o papel de iniciativas privadas e comunitárias também é essencial. O Ibrawork, em parceria com o EAI Jogos, por exemplo, tem atuado para ampliar a visibilidade de novos desenvolvedores brasileiros, criando pontes entre talentos emergentes, investidores e o público consumidor. Além disso, o hub oferece capacitações com palestras, mentorias e workshops. Ao abrir espaço para que estúdios independentes apresentem seus projetos em eventos, a iniciativa contribui para a consolidação de uma cena mais diversa e inclusiva, onde a inovação e a identidade cultural brasileira ganham protagonismo.
Esse conjunto de iniciativas mostra que há uma base consistente para o crescimento do setor. O ambiente de negócios começa a se tornar mais favorável, e o reconhecimento dos games como parte da economia criativa abre espaço para que talentos nacionais ganhem mais visibilidade.
Mas os desafios ainda são grandes. O acesso a financiamento segue restrito, e a formação de mão de obra especializada em áreas críticas, como programação avançada, game design e narrativa interativa, não acompanha a velocidade da demanda. A boa notícia é que já existe um princípio de articulação estratégica entre governos, empresas e academia. O bom diálogo entre as partes será capaz de transformar ações pontuais em políticas estruturantes.
Outro obstáculo recorrente é a pouca valorização da produção nacional dentro do próprio país. Muitos jogos brasileiros só recebem destaque depois de premiados ou reconhecidos no exterior, o que revela a necessidade de ampliar canais de distribuição, espaços de divulgação e premiações que deem protagonismo ao que é produzido aqui. A consolidação de uma indústria nacional passa não apenas pela capacidade de competir globalmente, mas também por conquistar o próprio público interno.
O Brasil vive um momento promissor para os games. Há políticas públicas emergindo em diferentes esferas, um marco legal que garante novos instrumentos de fomento e um mercado consumidor que cresce de forma consistente. O futuro, no entanto, depende da convergência entre criatividade, investimento e políticas de longo prazo. Se conseguirmos unir esses elementos, os games brasileiros deixarão de ser apenas consumidores de tendências globais e se tornarão protagonistas de narrativas autênticas, capazes de projetar nossa identidade cultural e a inovação do país para o mundo.