*Por Otávio Pimentel, sócio e head de M&A na Ace Ventures
O Brasil liderou os M&As na América Latina no primeiro semestre de 2024, segundo dados da Aon e da TTR Data. Mas, para entender as tendências que moldarão o próximo ano, é essencial olhar para o contexto dos últimos períodos e como eles impactaram o mercado, visto que muito do que aconteceu no passado, dificilmente irá se repetir nos próximos anos.
Após o impacto inicial da pandemia em 2020, que trouxe incertezas e esfriou o apetite dos investidores, o ano seguinte testemunhou um boom de transações, impulsionado por baixas taxas de juros globais e uma demanda reprimida, além de valuations muito esticados e que não refletiam a realidade das empresas.
Entretanto, o cenário começou a mudar em 2022. As taxas de juros foram retornando a patamares mais elevados e os investidores adotaram uma postura mais criteriosa e racional, algo bem diferente da abundância presente no ano anterior, quando algumas transações chegaram a superar em até dez vezes a receita da empresa adquirida. Em seguida, houve uma queda nos valores e quantidades de M&As.
Os big deals passaram a ser menos comuns e as transações começaram a se concentrar mais no middle market, sendo uma estratégia carregada majoritariamente pelas empresas locais. A estabilização, após cenários tão opostos, veio em 2024. Acredito que o ano se encerra com um ambiente bem mais favorável em comparação com os últimos períodos de inverno para as startups, mesmo com o cenário macroeconômico não tão favorável. Sendo assim, o prognóstico para 2025 é de que há oportunidade para boas empresas, principalmente no middle market.
A verdade é que negócios bons encontrarão compradores, mas os deals não terão valores estratosféricos. E essa tendência mais austera nos valores permanecerá assim pelos próximos anos. Entretanto, a variação da quantidade de zeros nas transações é apenas uma das tendências que marcaram os M&As nos últimos anos. Há outras particularidades que também devem ser levadas em consideração.
A primeira característica destaca como as aquisições brasileiras majoritariamente acontecem por causa do fit entre grandes corporações e startups. Entender esse fenômeno nos ajuda a entender como alguns setores, como o de fintechs, continuaram a ter M&As. Se por um lado as fintechs conseguiriam ameaçar grandes players, a aquisição de soluções financeiras inovadoras oferecidas amplia os ecossistemas e impulsiona a transformação digital de negócios tradicionais. Como resultado, nos últimos anos, o setor somou mais de 190 deals, sendo que 80% das transações são pautadas pelo fit e complementaridade entre os modelos de negócios, segundo dados da Fintech Overview, relatório da ACE Advisors.
Outra singularidade é o protagonismo das companhias brasileiras em comparação com players internacionais. Porém, engana-se quem pensa que tal cenário é composto apenas pela insegurança do capital estrangeiro diante de questões políticas e econômicas locais. Na verdade, também há o amadurecimento e maior capacidade dos negócios brasileiros.
Falando em amadurecimento, esse processo também fez surgir algumas transações com estruturas mais criativas e flexíveis. Há deals bem estratégicos com um perfil de médio e longo prazo nos quais o empreendedor, como pessoa física, recebe uma remuneração considerável no dia 0 e ainda consegue capturar valor ao longo da nova jornada em conjunto com o comprador. A popularização dessas novas nuances criativas também podem potencializar o mercado de M&As em 2025, viabilizando transações que poderiam gerar um gap de valuation no curto prazo. Além disso, o setor também pode ser impulsionado pela possível retomada de IPOs na B3.
Após um hiato que durou cerca de três anos, algumas casas já indicam que pode haver uma janela para IPOs entre o final de 2025 e 2026, mas tudo vai depender de um maior otimismo com o macro brasileiro e das primeiras empresas que se aventurarem em abrir capital. Consequentemente, ao conseguirem acesso a mais capital e serem capazes de resgatar estratégias inorgânicas, a aquisição de outras empresas pode acontecer.
Por fim, apesar de ser difícil determinar o timing exato de quando o mercado de M&A ganhará tração, é certo afirmar que estamos em um cenário que será vantajoso aos negócios mais resilientes que souberem ler e acompanhar as nuances da maturação do setor. Em suma, startups que fizeram a lição de casa de buscar eficiência operacional, receita recorrente e defensabilidade contra fraquezas e ameaças colherão os frutos de todo o esforço empenhado nos últimos anos. Por fim, uma coisa é certa, a questão não é “se” o M&A voltará a aquecer, e sim “quando”.