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Saúde mental dos fundadores de startups: entre a pressão e a resiliência

É imprescindível ver a saúde mental tão estratégica quanto um modelo de negócio bem desenhado ou uma tecnologia disruptiva

Foto: Canva
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*Deivison Pedroza é cofundador e CEO da Way Minder

Ser fundador de uma startup é frequentemente comparado a estar em uma montanha-russa emocional. O ambiente é altamente competitivo e o dia a dia é repleto de altos e baixos: são comemorações por pequenas vitórias, como conseguir uma primeira rodada de investimentos, um novo cliente ou desenvolver uma inovação disruptiva que ganha destaque no mercado, mas também são noites sem dormir devido a desafios inesperados.

A pressão é ainda maior quando consideramos a necessidade de gerir equipes e a responsabilidade perante investidores que depositam capital e expectativas. E aí começa a existir uma alta irritabilidade com coisas pequenas, falta paciência e parece que nada mais tem um propósito.

Acredito que a maioria de nós, empreendedores, temos uma chama interior que nos impulsiona a superar barreiras. Mas essa mesma paixão pode se transformar em uma espada de dois gumes quando colocada à prova no turbilhão de uma startup. Por isso, a pressão constante para inovar, para entregar resultados e para escalar rapidamente pode levar muitos de nós ao limite, resultando em quadros de estresse, burnout e ansiedade, gerando dificuldades com os relacionamentos dentro e fora da empresa.

E assim, existe uma questão muito importante que geralmente é subestimada: como anda a saúde mental dos fundadores de startups?

O peso das expectativas: uma pressão invisível

Alguns estudos indicam que fundadores de startups têm mais chances de enfrentar questões de saúde mental do que a média da população. A ansiedade, depressão e o burnout, infelizmente, não são raros neste ambiente.

Um estudo conduzido pela Harvard Business Review revelou que 72% dos empreendedores relataram enfrentar problemas de saúde mental, com muitos deles relacionando esses problemas diretamente ao processo de construção de suas empresas.

A Way Minder, startup na qual sou cofundador e CEO (então sei muito bem o que significa fundar uma startup), conduziu um estudo envolvendo mais de 600 profissionais para entender a condição da saúde mental e o estado emocional no ambiente corporativo. Os dados revelaram preocupantes níveis de estresse e burnout, derivados principalmente da pressão e fadiga contínuas.

Os participantes, vindos de variados setores do mercado, demonstraram que áreas como RH, vendas, educação, liderança, administração e TI enfrentam as maiores incidências de desgaste profissional.

Para quantificar os níveis de burnout, na Way Minder estabelecemos uma escala: nulo (0 a 8), baixo (19 a 32), moderado (33 a 49), alto (50 a 59) e grave (60 a 75). Dentre os mencionados, profissionais de RH, vendas, educação, liderança e administração estão predominantemente na faixa moderada, com scores entre 43 e 36,61.

A pesquisa ainda apontou que na esfera de lideranças, cargos de alto escalão, como CEOs e diretores de startups, registram pontuações chegando a 44,41. Quando analisados por faixa etária, líderes nascidos entre 1990 e 2010 são os mais impactados pelo burnout, seguidos pelos nascidos entre 1960 e 1980.

Entre as razões que potencializam a exaustão, identificamos fatores como investimento emocional profundo, falhas de comunicação, decisões inadequadas, queda de produtividade e faltas frequentes.

Então, temos um problema. E se a liderança não está bem, como ela vai ter a capacidade de cuidar dos seus liderados e da sua empresa?

A boa notícia é que é possível melhorar a qualidade de vida e minimizar os efeitos adversos desse mal nos negócios que torna o mundo das startups um cenário complexo e desafiador.

Estratégias para a saúde mental

Nesse universo, muitas vezes exaltamos a imagem do líder resiliente, aquele que permanece inabalável perante adversidades, sempre pronto para o próximo desafio. Essa visão, no entanto, pode ser duplamente perigosa: por um lado, alimenta a ilusão de que mostrar vulnerabilidade é sinal de fraqueza; por outro, ignora a importância da saúde mental.

Que fique claro: resiliência não é sinônimo de lidar com tudo sozinho.

Por isso, existe algumas recomendações que eu deixo para fundadores e líderes que desejam cuidar de sua saúde mental:

  • Conscientize-se: o bem-estar mental não deve ser uma reflexão tardia, mas sim um pilar fundamental na construção de qualquer negócio. Aceitar que todos nós temos pontos fracos e momentos de fragilidade é humano e, mais do que isso, é um passo essencial para buscar soluções.
  • Busque ajuda profissional: a ideia de que apenas quem está “doente” procura tratamento é ultrapassada. Profissionais especializados são muito importantes e fornecem estratégias e ferramentas para lidar com as pressões do dia a dia, entender nossas emoções e melhorar nossa qualidade de vida.
  • Construa uma cultura de suporte: um ambiente de trabalho onde a saúde mental é valorizada e discutida abertamente beneficia não só as pessoas, mas a empresa como um todo. Por isso, promova discussões, workshops e treinamentos que abordem o tema. Incentive os membros da sua equipe a expressar suas preocupações e a buscar apoio quando necessário.
  • Una-se a uma comunidade: ter um grupo de colegas empreendedores para conversar, desabafar e compartilhar experiências pode ser extremamente enriquecedor. Através dessas conexões, percebemos que os desafios, dúvidas e ansiedades que enfrentamos são comuns a muitos. Essa rede de apoio mútuo não só traz alívio emocional, mas também insights e soluções que talvez não tivéssemos se estivermos sozinhos.
  • Utilize a tecnologia a seu favor: embora não tenha a pretensão de substituir um acompanhamento psicológico profissional, a Way Minder tem como principal produto uma plataforma online avançada, que é capaz de identificar o estado da saúde mental dos profissionais. E a partir disso, ela oferece intervenções cientificamente validadas e uma comunidade on-line de apoio, além de utilizar práticas comprovadas de saúde mental com Inteligência Artificial generativa, jornadas de resiliência emocional e prevenção ativa de transtornos emocionais e mentais.

Saúde mental no centro do ecossistema das startups

Como já destaquei, não fazemos nada sozinhos. Dessa forma, é imprescindível que todo o ecossistema – que inclui não só os empreendedores, mas também os investidores, incubadoras e aceleradoras – perceba que a saúde mental é tão estratégica quanto um modelo de negócio bem desenhado ou uma tecnologia disruptiva.

Em relação aos investidores, é preciso que eles tenham em mente que, ao investir em uma startup, não se está apenas aportando capital em uma ideia, mas também em pessoas. E o bem-estar delas pode ser um diferencial competitivo no mercado. Além de analisar planos de negócio e projeções financeiras, é fundamental considerar e apoiar iniciativas que promovam a saúde mental dos envolvidos.

Já as incubadoras e aceleradoras, elas têm um papel que vai muito além de auxiliar no desenvolvimento de produtos ou na expansão de negócios. Elas têm a responsabilidade de moldar a cultura das startups desde seus estágios iniciais. Isso significa incutir a importância da saúde mental desde o começo, fornecendo recursos, treinamentos e conexões nesse aspecto.

E obviamente, os fundadores devem reconhecer a própria vulnerabilidade, e que isso não significa sinal de fraqueza, mas sim de autoconsciência. A busca ativa por equilíbrio, bem-estar e suporte não só beneficia a si próprio, mas reverbera positivamente em toda a estrutura da empresa.

Por isso tudo, o sucesso sustentável no mundo das startups não deve ser definido apenas por valuations, rodadas de investimento ou expansão de mercado. Deve ser, também, a capacidade de criar um ambiente onde pessoas possam trabalhar com paixão, mas também com saúde e equilíbrio.

Precisamos estar sintonizados com os desafios internos, nossos e das nossas equipes. É nossa responsabilidade garantir que, enquanto perseguimos metas ambiciosas, também estejamos construindo um ambiente de trabalho onde a saúde mental e o bem-estar sejam priorizados.

Portanto, faço um chamado à ação para todo o ecossistema: valorizar a saúde mental nessa montanha-russa emocional do mundo das startups não é apenas uma questão ética ou humanitária, mas também estratégica. A saúde mental é, e deve ser sempre, sinônimo de sucesso.