Floresta Amazônica | Foto: Canva
Floresta Amazônica | Foto: Canva

*Por Pedro Plastino, executivo de negócios climáticos e membro da delegação brasileira na COP30

Com a COP30 acontecendo em Belém, o debate sobre o Tropical Forests Finance Facility (TFFF) ganha força e se torna símbolo do desafio central das conferências do clima: transformar compromissos financeiros em resultados concretos para o planeta.

O TFFF surge como um fundo internacional voltado a captar e direcionar recursos para a proteção e o manejo sustentável das florestas tropicais, que concentram parte essencial da biodiversidade e do estoque global de carbono. O Brasil já anunciou a intenção de contribuir com cerca de US$ 1 bilhão, e espera-se que União Europeia e países do Brics se somem como principais doadores.

Na prática, o TFFF pode se tornar um novo modelo de finanças climáticas de impacto, capaz de integrar esforços públicos, multilaterais e privados. Mas seu sucesso dependerá menos do montante arrecadado e mais da governança e transparência na aplicação dos recursos.

As florestas tropicais respondem por mais de 60% da capacidade natural de absorção de carbono do planeta e são o principal freio do aquecimento global. Ainda assim, a perda de cobertura florestal segue em ritmo alarmante. O Brasil, por exemplo, apesar dos avanços recentes, ainda registra taxas significativas de desmatamento e queimadas ilegais.

É nesse contexto que o TFFF aparece como uma tentativa de criar um mecanismo financeiro permanente para custear a preservação e a transição produtiva das populações que vivem nessas regiões. Em vez de depender de doações pontuais ou acordos bilaterais, a proposta busca estruturar um sistema de financiamento contínuo, com metas claras e prestação de contas internacional.

A história das COPs é marcada por anúncios de fundos que raramente saem do papel. O Green Climate Fund, por exemplo, criado em 2010 para apoiar países em desenvolvimento, enfrentou anos de lentidão e subexecução. O TFFF pode ser diferente se adotar modelos ágeis de desembolso, privilegiando projetos locais com resultados mensuráveis, como manejo sustentável, agricultura regenerativa e recuperação de áreas degradadas.

O desafio é evitar a armadilha do simbolismo. Não basta anunciar cifras bilionárias em palcos internacionais; é preciso garantir que o dinheiro chegue a quem implementa ações no território. Isso implica criar mecanismos de governança que incluam governos locais, comunidades tradicionais e atores privados, reduzindo a distância entre o discurso diplomático e a realidade da floresta.

Por sediar a COP30 e ser o país com a maior floresta tropical do planeta, o Brasil tem um papel decisivo na consolidação do TFFF. Além de anfitrião político, o país pode ser laboratório de implementação: testar formatos de governança, rastrear resultados e mostrar que é possível canalizar recursos internacionais para resultados concretos de conservação.

A Amazônia, nesse contexto, deixa de ser vista apenas como território de proteção e passa a ser tratada como ativo econômico global, cujo valor depende da manutenção da floresta em pé e da inclusão das populações locais em cadeias sustentáveis. A criação de indicadores e métricas de impacto será essencial para dar legitimidade e atrair novos investidores.

O TFFF também representa um tabuleiro geopolítico. De um lado, a União Europeia e os países do Brics devem liderar as doações e pressionar por transparência. De outro, os Estados Unidos, fora do Acordo de Paris e com posição contrária a novos mecanismos de taxação de carbono, tendem a adotar uma postura cética. A China, por sua vez, pode enxergar no fundo uma oportunidade de ampliar sua influência sobre as cadeias verdes globais, especialmente por meio de parcerias com países da África e da América Latina.

Nesse contexto, o Brasil pode exercer uma liderança diplomática inédita, articulando blocos e assegurando que a agenda climática não se perca em disputas políticas. A legitimidade brasileira vem não apenas do discurso ambiental, mas da capacidade de demonstrar resultados concretos na redução do desmatamento e na criação de instrumentos de mercado para o carbono.

A principal medida de sucesso do TFFF será sua capacidade de gerar impacto mensurável. Isso significa transparência nos fluxos financeiros, clareza nas metas e mecanismos de auditoria independentes. A experiência mostra que fundos climáticos só ganham tração quando conseguem comunicar resultados tangíveis: hectares preservados, emissões evitadas, renda gerada localmente.

A COP30 oferece o palco ideal para esse reposicionamento. A comunidade internacional espera menos promessas e mais entrega. O TFFF será observado como o primeiro grande teste de maturidade das finanças climáticas globais — e o Brasil, como país-sede e principal beneficiário potencial, carrega a responsabilidade de mostrar que a proteção da floresta pode ser também um modelo de desenvolvimento sustentável.

O sucesso do TFFF dependerá da capacidade de transformar a narrativa ambiental em uma agenda econômica estruturada. O mundo não precisa de mais compromissos, mas de mecanismos de ação que criem valor a partir da preservação.

Se conseguir cumprir essa missão, o TFFF poderá inaugurar uma nova etapa das finanças climáticas, em que o dinheiro deixa de ser promessa e passa a ser instrumento de transformação real. O Brasil, mais uma vez, tem a chance de estar no centro dessa virada — como guardião da maior floresta tropical e como exemplo de que proteger pode ser também sinônimo de prosperar.