
Diariamente, somos bombardeados com conteúdos (promocionais ou não) nas redes sociais. Vemos influencers aderindo a produtos que viram “itens de moda”, mesmo não tendo sido criados originalmente com essa ideia — é o caso do atual ‘Labubu’ (boneco de pelúcia) e do ‘Bobbie Goods’ (livro de colorir). O que parece um simples modismo incentiva um consumismo desenfreado.
Um feed infinito de vídeos e fotos com produtos “queridinhos” cria o desejo onde antes não existia nada. Você nunca tinha ouvido falar no Labubu — e, de repente, quer um. Nunca ligou para livros de colorir — mas agora o Bobbie Goods parece irresistível. Você quer ou só foi influenciado? Comprando por desejo ou pelo algoritmo? A linha entre o que queremos de verdade e o que fomos programados a querer está cada vez mais confusa.
Tendências que não duram
De acordo com a pesquisa ‘O Efeito da Influência no Consumo’, realizada pela Nielsen (empresa global de medição de audiência, dados e análises) e pela YPX (consultoria especializada na Creator Economy), 80% dos consumidores (de 1000 respondentes da pesquisa) já compraram algum produto recomendado por um influenciador. E, claro, em um mundo cada vez mais digitalizado, tendências (muitas vezes apresentadas por influenciadores) vêm e vão, estimulam um consumismo desenfreado e depois somem.
Há alguns meses, a febre do momento era o Carmed — hidratante labial do qual inúmeros influenciadores digitais fizeram conteúdo sobre e hoje já não falam mais tanto a respeito. Toda hora um Carmed novo entrava na mira dos criadores de conteúdo: era o Carmed com gosto de bala, com glitter ou de algum personagem famoso (como a Hello Kitty).
O fenômeno foi tanto que até mesmo o Burger King aderiu à moda, lançando um modelo com aroma de hambúrguer grelhado em abril de 2024.
Muita gente fez coleção de Carmeds, simplesmente para deixá-los passar do prazo de validade na prateleira do armário. Afinal de contas, é impossível uma pessoa só usar tanto hidratante labial.
Ter um Carmed era como um “acessório” a ser mostrado: não é sobre os benefícios do produto, e sim sobre ter — afinal de contas, usar manteiga de cacau na era do Carmed seria o maior mico!
Hoje, o Carmed está perdendo suas forças aos poucos. Se antes os conteúdos a respeito do hidratante labial eram extremamente positivos para aderir à moda e ao consumismo, agora existe uma tendência de criticar o produto. Alguns influenciadores estão dizendo que o Carmed não hidrata totalmente os lábios, dando uma falsa sensação de maciez.
Outro exemplo é o copo Stanley. Ninguém - a não ser quem curte acampar - ligava para os copos térmicos, até um vídeo no TikTok bombar: um carro destruído por um incêndio, enquanto o copo Stanley ficou inteiro. Isso foi um marketing gigantesco para a marca, que começou a ter um "boom" nos Estados Unidos e depois teve reflexos no Brasil.
Agora, há quem pague mais de R$ 300 em um copo térmico apenas para carregá-lo por aí como uma espécie de “complemento” para o look. Nisso, estou falando de apenas um copo, já que existem colecionadores que têm copos de todas as cores possíveis para todas as ocasiões.
Consuma, mas não utilize
Há dez anos, a moda era pintar o livro de colorir Jardim Secreto, que muito provavelmente está parado tomando pó em algum lugar da sua casa — sendo que você nem sequer terminou de pintá-lo, mas agora quer o Bobbie Goods (provavelmente para também tomar pó em algum lugar).
O padrão se repete: algo viraliza, desperta um desejo coletivo imediato e, pouco tempo depois, é substituído por uma nova febre. E assim seguimos acumulando objetos que, um dia, pareceram indispensáveis — mas que hoje mal lembramos por que compramos.
Quero ou preciso?
No fim das contas, a influência constante das redes sociais pode nos deixar cercados por objetos que, na prática, pouco acrescentam à nossa vida. São produtos que compramos no impulso — seja pela promessa de facilitar a rotina, pela estética viral ou pela pressão de acompanhar as tendências.
Muitos desses itens perdem a utilidade em pouco tempo e o resultado é um acúmulo silencioso de coisas que já não fazem sentido, mas que revelam um padrão preocupante de consumismo.
Parar para refletir antes de cada compra, questionar a real necessidade e entender o papel da influência digital são passos importantes para escapar desse ciclo e consumir com mais consciência.
* Nota: para refletir mais sobre seu consumo, a autora deste artigo recomenda o documentário ‘A Conspiração Consumista’, disponível na Netflix.