
Com um diagnóstico de Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), dislexia e disortografia, que afetam a leitura e a escrita, a jovem Maria Eduarda Carvalho, de 17 anos, estava receosa de prestar Enem para o curso de seus sonhos: Arquitetura e Urbanismo. Angustiado pela dor da filha, o analista de sistemas e especialista em educação Luiz Carvalho decidiu colocar a mão na massa e programar uma plataforma educacional para ajudar a jovem a estudar, respeitando o seu quadro neurodivergente.
Em junho de 2025, nasceu em Salvador a Soff.iia, uma startup que oferece uma plataforma personalizada focada em inclusão e com o objetivo de desbloquear o potencial de estudantes neurodivergentes. De acordo com o empreendedor, a filosofia central — e radical — do negócio é a ideia de que é o mundo que tem que se adaptar ao indivíduo, e não o contrário.
“O foco é total na neurodiversidade. Diferenças neurológicas, como o TDAH, não são defeitos, são superpoderes ou vantagens competitivas”, diz. A plataforma cria planos de estudo sob medida, que reconhecem os pontos fracos de cada estudante e sugerem estratégias para o sucesso na aprendizagem, com métricas visuais e gamificação para acompanhar o progresso.
Os princípios pedagógicos da plataforma incluem objetividade — conteúdos sem rodeios; hiperfoco direcionado e conexão rápida para o processamento das informações. A tecnologia “premia” o usuário com vitórias rápidas, celebrando cada passo para manter o interesse em alta, e permite o acesso a tutores de IA que geram flashcards, resumos e mapas mentais em tempo real. Assim, a Soff.iia foi treinada para “conversar” com cérebros que funcionam diferente, entendendo as necessidades dessas mentes, sem julgamentos.
Transformar o projeto, caseiro, em um novo negócio foi rápido. Da ideação ao modelo de negócios, foram apenas 15 dias. O potencial da startup levou Luiz a buscar um investidor. Encontrou apoio na Lighthouse, gestora de venture capital especializada em rodadas seed, sediada na Bahia, que fez um aporte de R$ 2 milhões, que permitiu à Soff.ia estruturar o negócio, planejar a estratégia de marketing e se preparar para o passo seguinte: se tornar elegível ao Google for Startups Cloud Program. A iniciativa oferece entre US$ 2 mil e US$ 350 mil em créditos na nuvem para startups cujo modelo de negócios é baseado em IA.
Luiz desenvolveu a Soff.ia com a ajuda do Gemini, IA do Google, como auxiliar de programação, o que contribuiu para que o código fosse implementado em apenas 15 dias e configurar a startup como “AI native”, ou seja, que utiliza a IA generativa como base do seu modelos de negócios.
A empresa passou a ser apoiada pelo Google for Startups Cloud Program na categoria Ecosystem Partner, recebendo créditos na nuvem de US$ 100 mil pelo período de dois anos. A adesão ao programa, somado ao investimento seed, possibilitou à startup focar em seu crescimento. Hoje, a empresa oferece a plataforma para três escolas de Salvador e de Itabuna (BA) — uma pública e duas particulares — que estão utilizando o piloto, com alcance de 200 alunos.
Mas a atuação da Soff.iia não vai parar por aí. A startup apoiada pelo Google está em busca de novos parceiros. Para Luiz, as escolas são um caminho para conectar a tecnologia aos estudantes, de modo que a instituição, os professores e pais possam acompanhar o progresso dos alunos neurodiversos, contribuindo para melhorar o aprendizado e reduzir a evasão escolar.
Segundo o fundador, cada aluno que abandona a escola por não sentir que está tendo um bom desempenho pode levar a uma perda de receita para as instituições de ensino de até R$90 mil. “Com a tecnologia, as escolas podem ainda agregar alunos que não se encaixam nos modelos de aprendizagem padrão e ficavam pulando de instituição em instituição”, diz. A plataforma pode ser utilizada por alunos do ensino fundamental II, ensino médio (inclusive como preparação para o Enem), para o ensino superior e até para concursos públicos.
A prova de conceito da Soff.ia veio com a aprovação de Maria Eduarda em três vestibulares e no Enem — a estudante, que temia a redação do exame, conquistou a ótima nota de 850. Agora, como universitária do curso de Arquitetura e Urbanismo, vai contar com a plataforma desenvolvida pelo pai coruja para seguir estudando e se formar com maestria.