Coluna

Abri uma startup. E agora? Como a definição dos aspectos tributários pode impactar seu negócio

Tributários
Tributários

*Por Júlia Barreto, Ligia Merlo e Sarah Partika

Começar um negócio no Brasil não é uma tarefa fácil, especialmente considerando todos os aspectos que envolvem a constituição e a manutenção de uma sociedade. Além da complexidade envolvendo a constituição, contratação de colaboradores, a atração de investidores, manutenção de fluxo de caixa e outros desafios, ainda surge outra relevante questão: como essa startup será tributada?

A resposta a essa pergunta está diretamente vinculada à escolha do regime tributário. Isso pode impactar significativamente na carga tributária e, consequentemente, na saúde financeira da startup. Mas quais seriam esses regimes?

Atualmente existem três regimes tributários principais: Lucro Real, Lucro Presumido e Simples Nacional. As principais diferenças entre esses regimes dizem respeito à: (i) base de cálculo (valor sobre qual os tributos são recolhidos); (ii) alíquota (percentual aplicável sobre a base de cálculo que é específico de cada tributo e/ou regime); e (iii) forma de recolhimento dos tributos. Essas diferenças possuem maior repercussão para a apuração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (“IRPJ”) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (“CSLL”), que são os tributos que são cobrados sobre o lucro.

Contudo, cabe ainda relembrar que outros tributos poderão ser indiretamente impactados pela escolha do regime tributário: tributos federais (Contribuições ao PIS e Cofins, Contribuição Previdenciária), impostos estaduais (ICMS) e impostos municipais (ISS), a depender da atividade desenvolvida.

Nesse artigo, vamos desvendar os três regimes tributários principais no Brasil e como a escolha de cada um destes pode impactar a sua startup.

Lucro Real

Nesse regime, o IRPJ e a CSLL são recolhidos tendo o lucro líquido como base, ou seja, as receitas auferidas subtraídas das despesas. Em outras palavras, sociedades que lucram mais, em teoria, suportam uma carga tributária maior, uma vez que o lucro líquido será maior. Dessa forma, o Lucro Real tende a se mostrar como uma escolha mais vantajosa para os negócios que operam com menor lucratividade.

Quem pode optar por esse regime? Qualquer pessoa jurídica pode optar pelo Lucro Real. No entanto, esse regime é obrigatório para sociedades que: (i) tenham tido faturamento anual superior a R$ 78 milhões; (ii) tenham registrado lucro no exterior; (iii) ou cujas atividades estejam relacionadas a instituições financeiras, companhias de seguros, corretoras e outros negócios de cunho financeiro. 
Qual é a base de cálculo para o IRPJ e a CSLL? É o lucro líquido, ou seja, todas as receitas auferidas subtraídas as despesas e custos, com as devidas adições e exclusões. Adições e

exclusões são ajustes feitos na apuração do IRPJ e da CSLL, que geram efeitos apenas tributários (normalmente, despesas que não são dedutíveis e receitas que não são tributáveis). 

Consequentemente, nos casos de startups que registrarem prejuízo no ano é provável que não será necessário recolher IRPJ e CSLL.

A startup poderá aproveitar prejuízos apurados em exercícios anteriores? Sim. A legislação permite que as sociedades utilizem os prejuízos fiscais apurados em períodos anteriores para reduzir o lucro tributável do período, observados os requisitos legais. Dessa forma, é possível reduzir a base de cálculo em até 30% usando, parcial ou totalmente, o valor registrado como prejuízo fiscal acumulado em períodos anteriores. Esse percentual é conhecido como a “trava de 30%”. 

Qual é a alíquota do IRPJ e da CSLL? Os tributos, combinados, estão sujeitos a uma alíquota de até 34%, dos quais se tem: (i) 15% de IRPJ como alíquota fixa e 10% de adicional de IRPJ (devido quando o lucro mensal for superior a R$ 20.000,00); e (ii) 9% de CSLL.

Quando o IRPJ e a CSLL são pagos no Lucro Real? A startup pode optar por pagar os tributos trimestralmente ou anualmente.

Apesar de ser um regime tributário benéfico para startups que não estão lucrativas ou estão com a lucratividade baixa, o Lucro Real é um regime tributário um pouco mais complexo. Diz-se isso porque será necessário ter um controle apurado das despesas do período, o que não acontece com o Lucro Presumido e com o Simples Nacional (detalhados a seguir), os quais possuem apenas a receita como base tributável. 

Portanto, além do recolhimento tributário em si, a startup que desejar optar por esse regime, deverá considerar os efeitos operacionais. 

Lucro Presumido

O Lucro Presumido, por sua vez, é um regime que não depende do resultado entre receitas e despesas. Esse regime se fundamenta em uma presunção do lucro de acordo com a atividade desenvolvida por cada pessoa jurídica. Ou seja, a legislação tributária atribui um determinado percentual de presunção para cada atividade, que é utilizado para o cálculo do lucro tributável, tendo como base a receita da startup.

Em termos práticos, a startup tem R$ 100 de receita e R$ 200 de despesa. No Lucro Presumido, será aplicável o percentual de presunção sobre o valor de R$ 100 de receita, independentemente do montante registrado como despesa. Por essa razão, há uma presunção do lucro, visto que o lucro efetivamente apurado (contábil) não importa para fins tributários.

Quais startups podem optar por esse regime? Pode optar pelo Lucro Presumido qualquer sociedade com faturamento anual de até R$ 78 milhões ou que, em razão de suas atividades e circunstâncias, não estejam obrigadas ao Lucro Real. 

Qual é a base de cálculo para o IRPJ e a CSLL? O percentual de presunção é aplicado sobre a receita, que irá variar de acordo com a atividade desenvolvida pela startup. Esses percentuais de presunção estão definidos em lei, mas – em regra – tem-se que o percentual de presunção do IRPJ e da CSLL para prestação de serviços é de 32%, enquanto para venda de mercadorias é de 8% para IRPJ e 12% para a CSLL. 

Qual é a alíquota do IRPJ e da CSLL? São as mesmas aplicáveis ao Lucro Real, ou seja, os tributos combinados podem chegar a uma alíquota conjunta de 34%. 

Quando o IRPJ e a CSLL são pagos no Lucro Presumido? Trimestralmente.

O Lucro Presumido é o regime mais adotado por sociedades de médio porte, pois permite uma tributação relativamente simplificada (com foco nas receitas), mas com um limite de faturamento consideravelmente maior ao do Simples Nacional (detalhado a seguir).

Esse regime costuma ser o mais recomendado para startups que estejam com alta lucratividade, uma vez que o lucro contábil não é considerado para o cálculo do IRPJ e da CSLL, mas tão somente o lucro presumido, obtido pelo percentual de presunção. 

Simples Nacional

Por fim, o Simples Nacional é um regime de tributação simplificado que tem como principal objetivo facilitar o recolhimento de tributos por microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP).

Quais startups podem optar por esse regime? Sociedades que possuam faturamento anual de até R$ 4,8 milhões e que não se enquadrem nas vedações previstas na legislação.

Não poderão optar pelo Simples Nacional, a título exemplificativo, sociedades que: (i) tenham sócio estrangeiro; (ii) tenha sócio pessoa jurídica; ou (iii) sócio (pessoa física) que possua participação em outras sociedades, salvo quando a soma do faturamento destas não ultrapasse limite de R$ 4,8 milhões, entre outros.

Qual é a base de cálculo para o IRPJ e a CSLL? Os tributos são pagos sobre o faturamento bruto. 

A principal diferença do Simples Nacional em relação aos demais regimes é a possibilidade de recolhimento unificado dos tributos, por meio de uma alíquota única e em pagamento mensal que abrange grande parte dos tributos devidos (IRPJ, CSLL, PIS, Cofins, Contribuições Previdenciárias, ICMS, ISS etc.).

Qual é a alíquota unificada de recolhimento? A alíquota efetiva pode variar de 4% a 33%, levando em consideração: (i) o faturamento dos últimos 12 meses; e (ii) a atividade desenvolvida pela pessoa jurídica.

Além do pagamento único, existe algum outro benefício neste regime? Um aspecto que merece destaque nesse regime é a forma de recolhimento das Contribuições Previdenciárias. Regra geral, a alíquota da Contribuição Previdenciária é fixada em 20% sobre a folha de pagamento. Contudo, no Simples Nacional, as contribuições são inclusas na alíquota única, ou seja, estão “dentro” da alíquota de 4% a 33%, mencionada anteriormente.

Afinal, como escolher o melhor regime tributário para a minha startup?

É possível defender que o Simples Nacional sempre será a melhor opção para startups que estão iniciando suas operações, em razão do recolhimento simplificado, alíquotas mais baixas e unificação dos tributos. Contudo, entendemos que essa nem sempre será a resposta correta, pois o regime tributário mais adequado irá depender de diversos fatores, como faturamento, ramo de atividade, despesas envolvidas, entre outras circunstâncias. 

Para fins comparativos, é importante ter em mente as principais vantagens e desvantagens de cada um desses regimes tributários para a sua startup: 

REGIMES TRIBUTÁRIOS
Regime TributárioCarga Tributária (IRPJ/CSLL)PrósContras
Lucro Real34% sobre o lucro líquidoRedução da base cálculo com deduções e prejuízo fiscalMaior complexidade e necessidade de controle de custos
Lucro Presumido34% sobre a base presumida, de acordo com a atividadeRegime mais simples Sem deduções ou uso de prejuízo fiscal
Simples Nacional4% a 33% sobre a Receita bruta para pagamento de todos os tributosPagamento mensal único Receita bruta anual limitada a R$ 4,8 milhões e limitação a atividades específicas

De qualquer modo, o segredo para a escolha do regime tributário mais adequado é conhecer bem o seu negócio. Todas as circunstâncias possíveis devem ser analisadas e é imprescindível estar ciente das opções disponíveis, o que poderá ser o grande diferencial em termos de redução de custos e longevidade da sua startup. Em síntese, abrir um negócio e gerir uma startup, considerando o complexo cenário tributário brasileiro pode ser desafiador, mas com as informações apropriadas, prosperar é o caminho mais provável.

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