*Por João Cesconi e Pedro Vidigal
No cenário dinâmico e competitivo das startups, a relação entre os sócios é fundamental para alcançar o sucesso do empreendimento. Contudo, essa relação pode ser complexa, especialmente à medida que a empresa cresce, novos desafios surgem e a quantidade de sócios vai aumentando, em razão de novos investimentos. Para garantir harmonia entre os fundadores e novos sócios e, em última instância, mitigar riscos de potenciais conflitos futuros, a celebração de um acordo de sócios é essencial.
Neste artigo, explicaremos o que é um acordo de sócios e quais são os principais aspectos que ele deve contemplar, para assegurar a longevidade e o sucesso do negócio.
O que é um Acordo de Sócios?
Um acordo de sócios, como o próprio nome diz, é um instrumento jurídico que regula a relação entre os sócios, estabelecendo regras, procedimentos, direitos, obrigações e/ou restrições relacionadas a diversas matérias, como a transferência de quotas/ações entre os sócios e para terceiros, o exercício do direito de voto pelos sócios para definir os rumos da sociedade, a estrutura de governança da sociedade, a solução de eventuais conflitos, entre outras questões.
O acordo de sócios não se confunde com o contrato social (no caso de startups constituídas sob a forma de sociedades empresárias de responsabilidade limitada) ou o estatuto social (no caso de sociedades anônimas) de uma sociedade – para saber mais sobre as diferenças entre uma sociedade empresária limitada e uma sociedade anônima, acesse o nosso artigo “Ltda. ou S.A.? Como determinar o tipo societário mais adequado para a sua startup”. Enquanto o contrato/estatuto social prevê a estrutura e as informações essenciais da sociedade, como nome, endereço da sede, objeto, capital social, composição dos órgãos da administração, formas de representação da sociedade, entre outros, o acordo de sócios vai abordar especificamente a relação entre os sócios – por isso, os acordos de sócios são chamados de instrumentos parassociais.
Outro ponto de distinção entre contrato/estatuto social e o acordo de sócios se refere à sua publicização. Contratos/estatutos sociais são instrumentos públicos, que precisam ser registrados perante a Junta Comercial, para fins de produção de efeitos perante terceiros. De outro lado, o acordo de sócios é um documento estritamente particular e, portanto, não precisa ser registrado na Junta Comercial, conferindo maior liberdade e privacidade aos sócios para estabelecerem as regras que regerão a relação entre eles, bem como a relação com eventuais novos sócios.
Quais são as principais questões reguladas por um Acordo de Sócios?
O conteúdo de um acordo de sócios varia de acordo com a estrutura da sociedade e o perfil dos seus sócios e, apesar de não existir uma regra, usualmente regula as seguintes questões:
- Direito de Preferência: estabelece regras e procedimentos para que os sócios tenham o direito de preferência na aquisição das quotas/ações dos outros sócios que pretenderem aliená-las para terceiros e/ou para os demais sócios.
- Direito de Venda Conjunta (Tag Along): garante aos sócios minoritários o direito de venderem suas quotas/ações em conjunto com o sócio majoritário que pretenda alienar suas quotas/ações para um terceiro, nas mesmas condições ofertadas pelo terceiro ao sócio majoritário.
- Direito de Venda Forçada (Drag Along): garante ao sócio majoritário o direito de obrigar os sócios minoritários a venderem suas quotas/ações em conjunto com o sócio majoritário, caso o terceiro adquirente condicione a operação à aquisição da totalidade das quotas/ações da sociedade, nas mesmas condições ofertadas pelo terceiro ao sócio majoritário.
- Lock-Up de Quotas/Ações: impede os sócios que estejam sujeitos à regra – normalmente, que possuem um papel fundamental na sociedade – de alienarem suas quotas/ações durante determinado período.
- Transferências Permitidas de Quotas/Ações: estabelece as transferências que não se sujeitarão ao direito de preferência, direito de venda conjunta, direito de venda forçada e/ou ao lock-up de quotas/ações, conferindo certa flexibilidade aos sócios que pretenderem transferir suas quotas/ações dentro desses parâmetros definidos.
- Oneração de Quotas/Ações: define regras e procedimentos para a instituição voluntária de ônus pelos sócios sobre suas quotas/ações (p.ex., usufruto, alienação fiduciária, penhor, direito de preferência, empréstimo), bem como estabelece as diretrizes caso incida um ônus involuntário sobre as quotas/ações (p.ex., foram objeto de penhora judicial em processo que envolva um dos sócios).
- Exercício do Direito de Voto: estabelece regras e procedimentos para o exercício do direito de voto em reuniões/assembleias de sócios e reuniões do conselho de administração, sendo possível, inclusive, estabelecer mecanismos de realização de reuniões prévias para definir a orientação do voto de determinado grupo de sócios ou estipular quóruns qualificados (superior ao quórum de maioria) para a aprovação de determinadas matérias.
- Governança: estabelece a estrutura da administração da sociedade, inclusive mediante a criação de órgãos e comitês que vão auxiliar nas atividades rotineiras ou estratégicas da sociedade, bem como regras e procedimento para a eleição de administradores.
- Lock-Up de Gestão: estipula um prazo mínimo que determinado(s) sócio(s), que também exercem a administração da sociedade, permaneçam no cargo de administrador, em razão de sua relevância para a gestão dos negócios e sucesso do empreendimento.
- Avaliação da Sociedade: define regras e procedimentos que devem ser observados nas situações em que for necessário avaliar a sociedade, com a indicação dos métodos e/ou premissas que serão utilizados.
- Distribuição de Lucros/Dividendos: define uma periodicidade de distribuição de lucros/dividendos. Além disso, os sócios podem se comprometer a votar no sentido de maximizar ou minimizar a distribuição de lucros/dividendos.
- Financiamento e Captação de Recursos: define uma ordem de preferência na captação de recursos financeiros necessários ao desenvolvimento e evolução das atividades, de acordo com os projetos e o orçamento da sociedade.
- Não Concorrência: estipula regras que vedem ou limitem que os sócios desenvolvam, invistam, adquiram ou de qualquer forma participem em atividades concorrentes com a sociedade.
- Não Solicitação: estipula regras que vedem ou limitem que os sócios contratem, assediem ou de qualquer forma instiguem empregados e colaboradores a deixar seu vínculo com a sociedade.
- Resolução de Conflitos: define o método de resolução dos conflitos para questões relacionadas com o acordo de sócios (mediação, arbitragem ou Poder Judiciário).
Por que a minha startup deve ter um Acordo de Sócios?
A celebração de um acordo de sócios é uma etapa crucial para qualquer startup que almeja sucesso sustentável e crescimento ordenado. Ao definir com clareza os direitos e deveres dos sócios, bem como os procedimentos para a resolução de possíveis conflitos, este instrumento jurídico contribui significativamente para a solidez da relação entre os fundadores e demais sócios e para a estabilidade da empresa.
Conforme abordamos no artigo “Prevenindo disputas societárias em startups”, ignorar a importância desse acordo pode resultar em litígios custosos e prejudiciais ao negócio. Portanto, recomendamos fortemente que os fundadores de startups procurem orientação jurídica especializada para a elaboração de um acordo de sócios que atenda às necessidades específicas do seu empreendimento.
Este artigo é o primeiro de uma série dedicada aos acordos de sócios, onde exploraremos detalhadamente as principais cláusulas desse instrumento essencial para startups. Não deixe de acompanhar os próximos artigos para entender como um acordo de sócios bem elaborado pode ser determinante para o sucesso e a longevidade do seu negócio.
Caso tenham ficado com alguma dúvida ou precisem de auxílio na elaboração de um acordo de sócios para a sua startup, entre em contato com o nosso time. Teremos o maior prazer em atendê-lo(a).
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