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Apuração de haveres: o que é e o que você deveria saber sobre

Quando o conflito estoura, os alinhamentos prévios podem significar um grande alívio para os sócios e proteção à própria sociedade

Apuração de haveres
Apuração de haveres (Foto: Freitas Ferraz Advogados)

Por: Ana Moreira 

Nesta edição, vamos abordar um tema que, muitas vezes, é tido como nebuloso ou até mesmo subestimado no momento da criação de uma sociedade: o procedimento de apuração de haveres. 

Como já mencionamos em artigos anteriores, o otimismo e entusiasmo na fase de constituição de uma sociedade, por vezes, fazem com que temas importantes, especialmente os espinhosos, sejam negligenciados. Isso inclui, sobretudo, os temas que tratam de futuros e eventuais litígios decorrentes da dissolução (parcial ou total) da sociedade. 

Afinal, quando se está criando algo, a última coisa que se pretende prever ou mensurar são as hipóteses de encerramento, certo? 

Pois bem. Apesar dessa comum aversão a ajustes contratuais para hipóteses de saída, seja por exclusão ou retirada de um sócio, com o tempo, mais certeza temos de que o alinhamento prévio pode facilitar – e muito – um eventual processo de saída da sociedade, preservando, na medida do possível, a relação amigável entre os envolvidos. Fato esse, inclusive, já destacado em nosso artigo “Tenho uma startup e briguei com o meu sócio. E agora?”. 

A verdade é que, evitar litígios e desajustes futuros é sempre a melhor solução. Quando o conflito estoura, os alinhamentos prévios podem significar, em boa medida, um grande alívio para os sócios e proteção à própria sociedade. Dito isso, vamos direto ao ponto.

Afinal, do que se trata o procedimento de apuração de haveres em dissolução parcial da sociedade? Qual a relevância de se ter a metodologia e regras previamente definidas no Contrato Social? 

O procedimento de apuração de haveres nada mais é do que a definição do valor da participação do sócio, no caso de exclusão ou exercício de seu direito de retirada. 

Neste ponto, é crucial notarmos que, aquele alinhamento de vontades mencionado no começo, em regra, não é mais vislumbrado neste momento. A verdade é que, da tensão entre a necessidade de se garantir um valor justo ao sócio retirante e a preservação do patrimônio dos sócios remanescentes, bem como da própria sociedade, surgem impasses e controvérsias que dificultam o ajuste final. 

Comumente, a maioria das situações de apuração de haveres decorrem de um evento minimamente conflituoso, que desencadeia a saída do sócio, ou seja, uma situação caracterizada pela contraposição de interesses entre os sócios que ficam e o sócio que sai.

Assim, em busca de soluções para os impasses e para os casos de omissão do contrato, a legislação, especificamente no artigo 1.031 do Código Civil, dispõe que o valor da sociedade será calculado a partir de um balanço especialmente levantado. E mais, na tentativa de preencher a lacuna sobre tema, especialmente sobre o “o que” e “como” se deve considerar ativos no cálculo deste balanço especial, o artigo 606 do Código de Processo Civil ainda dispõe que: o juiz poderá definir como critério de apuração de haveres o levantamento de valor patrimonial apurado no balanço especial, avaliando-se os bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, “a preço de saída”, sendo o passivo apurado de “igual forma”. 

Bom, é incontestável que o critério dominante será a avaliação patrimonial da sociedade, o que também segue em linha com o posicionamento dos tribunais. Contudo, certas (na verdade, muitas) discordâncias ainda podem surgir a partir destas definições mencionadas na lei. 

 Dentre as dúvidas que pairam este tema estão os seguintes questionamentos: ao se calcular os ativos intangíveis, serão consideradas então as perspectivas de lucros futuros? Carteiras de cliente, marcas e patentes, direitos autorais ou softwares utilizados, todos esses ativos entram nesta conta? 

Ou ainda mais, em um outro cenário que a sociedade tenha passivos contingentes:  os passivos relacionados a eventos passados que geram um risco de desembolso futuro pela sociedade (como processos judiciais, contingências fiscais ou obrigações contratuais, por exemplo), mas que não se sabe o valor exato da contingência naquele momento de saída do sócio, como o cálculo deve ser feito?

 É fato que, em caso de tratativa acerca destes passivos apenas no momento da dissolução parcial (seja por exclusão ou exercício de direito de retirada) as discussões podem ser fervorosas. O embate é claro: de um lado, os sócios que ficam na sociedade apostarão no desembolso futuro e adotarão o pensamento conservador de incluir estes riscos e projeções na avaliação patrimonial (o que levará à depreciação da participação societária).

Contudo, do lado do sócio retirante, é certo que esse não desejará, de bom grado, a depreciação de sua participação por uma avaliação que se baseia apenas no risco e não na certeza do desembolso futuro. Dito isso, imagina-se, portanto, que ele vá pleitear a inclusão de todos os ativos e exclusão dos passivos, no intuito de agregar valor a sua participação que será liquidada.

Pois bem. Essas são apenas algumas das inúmeras discussões que podem surgir quando não se tem bem amarrado ou devidamente negociada a forma de cálculo dos haveres, em uma hipótese de dissolução parcial da sociedade. Daí se extrai a importância de ter os critérios previamente definidos!

É justamente por isso que, o que se aconselha é o diálogo e o esforço conjunto para que sejam definidos, o quanto antes, os parâmetros para situações como essas. Quando os sócios “ainda” estão em uma relação pacífica, se esforçando apenas para que haja a prevenção de conflitos, desde a constituição da sociedade. 

Adianta-se, desde já, que certos arranjos negociais podem contribuir para a dinâmica e o procedimento de apuração de haveres. Dentre estes arranjos estão as cláusulas que definem, linha por linha, os ativos e passivos a serem incluídos neste cálculo, como também, eventuais cláusulas que contenham uma metodologia dinâmica e contínua de apuração de haveres, sujeita a ajustes posteriores ao momento de saída do sócio.

Esse último mecanismo alivia a tensão de se ter um valor fechado assim que o sócio se retira ou é excluído. Isto significa que, os sócios podem acordar um preço fixo, calculado pelo balanço especialmente levantado no exato momento de saída do sócio, nos termos da lei, e, ao longo do tempo, irem fazendo ajustes com base nas variações de suas receitas ou desembolsos posteriores, que decorrem de fatos passados, ou seja, da época em que aquele sócio retirante ainda fazia parte do negócio. 

A partir disso, com mecanismos flexíveis como a cláusula mencionada (comumente nomeada como “cláusula de ajuste de preço” e que se trata de apenas um entre os possíveis ajustes) tem-se que a estruturação de acordos de saída de sócios podem ser mais pacíficos, alcançando com maior assertividade o real valor da participação societária a ser liquidada, em vista de afastar ajustes irreais ou desproporcionais para ambos os polos da negociação.

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