*Por Larissa Vargas e Rodrigo Amaral
Em continuação à série de artigos sobre Acordos de Sócios, neste artigo explicaremos as chamadas cláusulas de lock-up de ações e de lock-up de gestão: cláusulas que impõem, a sócios e administradores relevantes, restrições à transferência de ações e obrigações de permanência na administração de uma startup.
Após a realização de um investimento em uma startup, é natural que o investidor deseje manter os sócios na startup investida e/ou os administradores considerados pessoas-chave na administração do negócio. Apesar de essa realidade ser aplicável em todos os mercados, no ambiente de startups ela tem ainda mais destaque: a manutenção dos sócios fundadores ou dos administradores é notadamente relevante em empresas em estágio inicial de desenvolvimento, especialmente porque foram essas pessoas que conduziram o desenvolvimento da startup até o momento da captação de um investimento. Em decorrência disso, são essas pessoas que detêm o know-how sobre os negócios e sobre o mercado da startup, de modo que sua desvinculação da operação provavelmente causaria impactos negativos e muitas vezes impeditivos para a continuidade do negócio.
O lock-up de ações estabelece a vedação para que determinados sócios transfiram as suas ações para terceiros ou para outros sócios durante um prazo determinado, cuja contagem normalmente se inicia após determinado evento. Essa cláusula é uma forma de impedir ou restringir, de forma temporária e pré-determinada, a saída dos sócios fundadores após a ocorrência de terminado evento (captação de investimentos, exercício de stock options, etc.). Essa cláusula torna-se pertinente nos casos em que:
- os investidores desejam manter os fundadores com participação na startup, visando a um alinhamento de interesses econômicos (por se manterem titulares ações, a valorização ou desvalorização da startup afetará diretamente os fundadores);
- não há interesse em admitir terceiros na startup, evitando que os investidores tenham que desembolsar recursos para exercer eventual direito de preferência para impedir o ingresso de outros sócios;
- os investidores desejam evitar que os sócios fundadores vendam grande parte de suas participações e, com o recebimento de uma liquidez relevante, passem a se dedicar menos ao desenvolvimento das atividades da startup; e
- pretende-se manter determinado colaborador vinculado à startup por um período mínimo adicional, caso esse colaborador tenha adquirido sua participação por meio de programas stock options.
O lock-up de gestão estabelece uma obrigação para que determinados administradores ou colaboradores relevantes permaneçam na gestão da startup durante um prazo determinado. Por sua vez, em contextos de captação de investimentos ou de venda de participação, essa cláusula tem como principais objetivos:
- manter a estabilidade na condução das atividades da startup, sem que haja uma mudança abrupta de diretrizes ou cultura;
- garantir que os administradores e colaboradores estratégicos façam uma transição ou integração na gestão com os novos membros indicados pelos investidores ou compradores;
- prever um período de dedicação mínima ou a dedicação exclusiva dos administradores ou colaboradores às atividades da startup;
- permitir que os administradores e colaboradores estratégicos conduzam as atividades da startup em busca do atingimento de metas que tenham sido estabelecidas como condição para que aufiram determinado proveito econômico (a chamada cláusula de earn-out).
Com relação ao último objetivo listado (permitir que os administradores e gestores conduzam as atividades para o atingimento de metas), o lock-up de gestão muitas vezes representa um direito (e não apenas uma obrigação) muito relevante para viabilizar o atingimento das referidas metas. Nessas hipóteses, a destituição dos administradores e gestores estratégicos sem justa causa costumam acarretar penalidades relevantes, como o pagamento de multas ou mesmo o pagamento integral do earn-out (como se as metas tivessem sido atingidas).
É importante ressaltar que, embora possa ser livremente estabelecida entre os sócios, a restrição imposta pelas cláusulas de lock-up de ações ou de gestão deve ser razoável, por tempo determinado, compatível com a natureza das atividades sociais e com os investimentos realizados pelo investidor, pois o art. 5º, XX, da Constituição Federal do Brasil garante que ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado. Especificamente em relação ao lock-up de gestão, também é importante destacar que há diversas discussões em matéria de direitos trabalhistas que podem limitar a aplicação dessa cláusula e que devem ser observadas para garantir a eficácia das disposições estabelecidas.
Para que as obrigações de permanência como sócio ou colaborador da startup sejam plenamente válidas e exequíveis, é necessário que as cláusulas de lock-up contenham regras muito bem definidas, sendo usual a inclusão, no mínimo, das seguintes disposições:
- existência de contraprestações pelas obrigações assumidas pelo sócio ou pelo administrador;
- prazo pelo qual os sócios fundadores e/ou administradores deverão permanecer na sociedade ou na gestão;
- percentual de quotas/ações que não poderá ser transferido durante o prazo de lock-up de ações, caso o lock-up não se aplique a todas as quotas/ações dos sócios fundadores;
- especificação de quais sócios e/ou administradores estarão sujeitos ao lock-up;
- exceções e transferências permitidas, caso existam; e
- penalidades por descumprimento das obrigações estabelecidas na cláusula de lock-up.
Ademais, apesar de serem cláusulas frequentemente solicitadas pelos investidores como condição para a realização dos investimentos, as cláusulas de lock-up de ações e de gestão devem ser negociadas pelos sócios fundadores e pelos colaboradores para que os termos e condições estabelecidos se adequem à realidade e aos objetivos da startup investida, dos investidores e dos próprios sócios e colaboradores sujeitos às obrigações. Nesse sentido, é comum que haja a negociação de exceções às obrigações estabelecidas, como a liberação do lock-up de ações ou de gestão em caso de novos eventos de liquidez, por exemplo. Assim, quando bem negociada, as cláusulas de lock-up podem favorecer todas as partes envolvidas na transação.
Continue acompanhando nossa série sobre Acordos de Sócios para mais insights sobre como proteger e potencializar sua startup. Caso tenham ficado com alguma dúvida ou precisem de auxílio na elaboração de um acordo de sócios para a sua startup, entre em contato com o nosso time. Teremos o maior prazer em atendê-lo(a).
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