*Por Thiago Braichi, Anna Laura Lacerda e Anna Flávia Moreira
Recentemente, em coluna anterior, discutimos como a escolha do regime tributário pode impactar o desenvolvimento de uma startup, especialmente em seus estágios iniciais. Na oportunidade, tratamos das principais opções – Lucro Real, Lucro Presumido e Simples Nacional –, destacando as diferenças entre esses regimes no que diz respeito à base de cálculo dos tributos, às alíquotas aplicáveis e à forma de recolhimento.
Nesse artigo, nosso foco estará no Simples Nacional, regime simplificado de apuração e recolhimento de tributos instituído pela Lei Complementar nº 123/2006 (Lei do Simples Nacional), que é frequentemente utilizado pelas startups em fases iniciais – motivada pelo fato de ainda estarem configuradas como microempresas (ME) ou empresas de pequeno porte (EPP).
O Simples Nacional foi criado, dentre outros, para apoiar o desenvolvimento de empresas em estágio inicial, quando o fluxo de caixa pode ser in suficiente para arcar com a alta carga tributária brasileira. Além do recolhimento simplificado de tributos (IRPJ, CSLL, PIS, Cofins, Contribuições Previdenciárias, ICMS, ISS), o regime oferece uma alíquota conjunta efetiva que pode variar de 4% a 33%, aplicada sobre o faturamento dos últimos 12 meses de acordo com a atividade desenvolvida pela startup.
Contudo, ao optar pelo regime do Simples Nacional, muitos empreendedores concentram sua preocupação apenas em observar o limite de faturamento anual – até R$ 360.000,00 para MEs e até R$ 4.800.000,00 para EPPs – quando a legislação tributária federal prevê outras restrições importantes que buscam evitar o uso indevido do regime como uma forma de planejamento tributário abusivo.
Essas limitações podem comprometer a permanência de algumas startups no regime do Simples Nacional, afetando diretamente seu planejamento fiscal e sua capacidade de atrair investimentos. Por isso, é importante conhecer as regras desse regime de forma abrangente, especialmente se sua startup está em fase de captação de recursos.
Simples Nacional e formas de receber investimentos
Entre as principais regras para o enquadramento no Simples Nacional, algumas estão diretamente relacionadas ao quadro societário das empresas optantes por esse regime de tributação. O descumprimento dessas regras resulta no desenquadramento do regime, obrigando as empresas a optarem pelo Lucro Presumido ou pelo Lucro Real.
De acordo com a Lei Complementar nº 123/2006, não podem optar pelo Simples Nacional as empresas que tenham (i) sócio estrangeiro, (ii) sócio pessoa jurídica, (iii) sócio pessoa física que possua participação em outras sociedades (salvo quando o faturamento total das entidades for inferior a R$ 4,8 milhões), ou (iv) sócio que possua participação societária superior a 10% em empresa tributada por outro regime.
Essas limitações afetam diretamente as startups que estão em fase de crescimento e de captação de investimentos, visto que, muitas vezes, esses investimentos implicam na necessidade inclusão, no seu quadro societário, de um sócio que a torna impossibilitada de optar pelo Simples Nacional.
Nesse cenário, em 2016, a Lei do Simples Nacional foi alterada para permitir a figura do investidor anjo. Esse investidor – pessoa física, pessoa jurídica ou fundo de investimento – pode aportar recursos na startup optante pelo Simples Nacional sem que isso implique aumento de capital ou alteração no quadro societário da empresa. Essa mudança tornou possível o aporte de investimentos sem comprometer os benefícios fiscais do regime simplificado.
Como funciona e quais são os benefícios de ter um investidor anjo?
Startups que cumpram os requisitos de enquadramento ao Simples Nacional relativos à receita bruta anual, poderão receber aportes de capital por um investidor anjo, desde que os valores não integrem o seu capital social.
O investidor anjo (i) poderá ser pessoa física, pessoa jurídica ou fundo de investimento, (iI) não será considerado sócio e não terá poderes de gerência ou voto na administração da startup, (iiI) não responderá por qualquer dívida da startup, inclusive em recuperação judicial, (iii) não poderá agir em nome da startup, e (iv) poderá exigir prestação de contas e documentos contábeis.
O investimento deve ser formalizado por meio de contrato de participação, com vigência máxima de 7 anos, e, no instrumento, as partes podem estipular remuneração periódica ao investidor anjo e prever a possibilidade de conversão do aporte em participação societária (que, na prática, desenquadrará a empresa do Simples Nacional).
Por fim, para não limitar o valor do aporte e trazer maior segurança para a startup, o investimento não será considerado receita da sociedade e o investidor anjo somente poderá exercer o direito de resgate após pelo menos 2 anos. Neste último caso, o valor a ser restituído não poderá ultrapassar o valor do investimento corrigido.
Portanto, a figura do investidor anjo surge como uma oportunidade valiosa para as startups que desejam atrair investimentos sem perder benefícios fiscais. Com um planejamento estratégico adequado, é possível otimizar a estrutura tributária da startup e, ao mesmo tempo, garantir o acesso a recursos financeiros que serão cruciais para o seu desenvolvimento e sucesso no mercado.
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