Confidencialidade, Freitas Ferraz
Confidencialidade, Freitas Ferraz

Por Eugênio Corassa e Guilherme Guidi 

No dia a dia de qualquer startup, ideias inovadoras e estratégicas são o coração do negócio. Muitas vezes, essas ideias são oriundas de ambientes colaborativos entre o seu time e parceiros ou investidores. Nessa dinâmica, porém, surge a questão crucial de como garantir que os segredos e as informações que podem mudar o rumo do negócio não sejam revelados ou utilizados de forma indevida.

É aqui que entra em cena a confidencialidade e a necessidade de sua formalização adequada. A velha “promessa de mindinho” pode até ser prática corrente entre amigos, mas no universo corporativo contar apenas com a confiança verbal não basta. Mas o que é preciso fazer para proteger as informações confidenciais e os segredos comerciais da sua startup? A gente te conta mais nesse artigo!

O que a confidencialidade protege?

Toda startup começa com uma ideia, seja um novo modelo de negócio, uma tecnologia inovadora ou uma estratégia de marketing vanguardista. Dessa ideia são construídos produtos e soluções, além de ser consolidada uma base de clientes, fornecedores e parceiros. Apesar de frequentemente se ouvir que na inovação a execução importa tanto quanto a ideia, todas essas informações são essenciais para o sucesso do projeto e precisam ser protegidas.

A confidencialidade, nesse contexto, não é apenas uma questão de preservar segredo de negócio, mas de garantir a competitividade. Em muitos casos, não é possível avançar em uma linha de negócios sem compartilhar informações com outras pessoas, como investidores, mentores, consultores e parceiros comerciais. Por isso a confidencialidade se preocupa basicamente com dois pontos principais: garantir que a informação não seja divulgada a pessoas não autorizadas e que (ii) mesmo a pessoa autorizada a receber aquela informação não a utilize de forma indevida. 

A violação da confidencialidade pode levar a consequências financeiras e legais significativas – que podem ser devastadoras para uma empresa em estágio inicial. Dois exemplos típicos: 

  1. A startup contrata os serviços de um consultor mas, ao final do contrato, o consultor utiliza informações confidenciais para aconselhar outra empresa concorrente. Mesmo que o concorrente não use a sua ideia, ele vai ter uma vantagem por poder evitar os mesmo problemas que você teve ou aproveitando as suas estratégias de sucesso.
  1. A startup discute um possível investimento com um parceiro institucional, mas quando as negociações não dão certo, o investidor cria um negócio concorrente, aproveitando-se das informações estratégicas recebidas (mesmo que não as compartilhe com ninguém).

Por isso, dosar corretamente quem pode acessar aquelas informações estratégicas e para que pode usar essas informações é essencial.

O que se busca proteger é uma série de informações associadas à operação empresarial, como os segredos de empresa, sinônimo de segredos de negócio ou informações confidenciais. Estão inclusos aí os segredos industriais, como aqueles relativos a processos de fabricação e fórmulas de produtos, e os segredos comerciais, que incluem estudos de marketing, listas de clientes e fornecedores, além de métodos internos de trabalho, estratégias, ideias de novos produtos etc. 

Embora patentes, marcas e registros de programas de computador sejam ferramentas poderosas para proteger a propriedade intelectual, nem sempre a proteção é imediata e nem tudo pode ser resguardado por essas vias legais. Ideias inovadoras, estratégias de mercado e informações comerciais valiosas, que muitas vezes não são passíveis de registro, dependem fortemente da confidencialidade para se manterem seguras.

A ilusão da “promessa de mindinho”

É comum, no entanto, que os ambientes de startups, em que a regra é a informalidade e o clima de colaboração é forte, sejam marcados pela confiança entre as partes envolvidas. Uma conversa informal entre amigos ou parceiros de negócios pode levar a um entendimento mútuo de que certas informações não serão compartilhadas com terceiros. No entanto, na ausência de um acordo formal, essa confiança é extremamente frágil.

Não é incomum situações em que ex-colaboradores ingressem em novas empresas em que vão exercer atuação semelhante e podem se valer de dados de clientes e processos de vendas do seu antigo trabalho para ganhar uma vantagem competitiva. Também não é raro que ex-parceiros se valham de ideias e informações de terceiros para um determinado empreendimento concorrente.

A famosa “promessa de mindinho” pode até ser um símbolo de lealdade entre amigos, mas no mundo dos negócios ela dá pouquíssimas garantias. Confiar apenas na boa fé das pessoas não é uma estratégia legal robusta. Afinal, até mesmo uma relação com um excelente colaborador pode azedar e terceiros podem oferecer condições favoráveis para a violação da confidencialidade.

Para não fugir da técnica, uma promessa oral de confidencialidade é de fato um contrato vinculante. Ele é legalmente válido, isto é, gera obrigações de confidencialidade. O problema é que, como qualquer contrato oral, o que ele protege e como ele protege dependerá do que você consegue provar diante de um juiz, por exemplo.

Vamos lembrar que no Brasil não é possível obrigar alguém fisicamente a fazer algo: se eu vendo uma casa a meu amigo mas ele não me paga, não posso simplesmente ir até a casa dele e tirar o dinheiro da carteira dele à força. Forçar o cumprimento dessa obrigação só é possível pela via judicial, em que o juiz no caso bloquearia o dinheiro na conta do devedor para pagar ao credor.

Com a confidencialidade, é o mesmo cenário. O acordo de confidencialidade é uma garantia de que, se houver a quebra daquela confiança que no início permitiu o compartilhamento de informações, a parte prejudicada pode (i) exigir judicialmente que quem quebrou o sigilo cesse esse comportamento e, eventualmente, (ii) exigir uma indenização ou compensação pela quebra do contrato. 

“Ah, mas e do que vale o contrato se eu tenho que entrar com uma ação judicial?”

O acordo de confidencialidade é justamente um reforço, um lembrete de que a confiança tem regras e que se elas não forem cumpridas haverá consequências. É o que chamamos de prevenção geral no Direito: desencorajar uma conduta pela ameaça da penalidade. 

Se você tiver um mero acordo verbal, levar o problema ao judiciário dependerá primeiro de você provar que esse acordo existiu e quais eram seus termos exatos. Ou seja, o outro lado pode questionar o que seria considerado informação confidencial, quais seriam de fato as restrições no uso dessas informações, qual era o prazo dessa obrigação e mesmo a própria existência do acordo de confidencialidade.

Precisamos concordar então que ter um acordo escrito (i) ajuda a deixar claro entre as partes o que se espera delas, (ii) reforça o aviso (ou a ameaça) a quem pretenda violar o segredo das informações, mas também (iii) facilita a resolução de um problema levado ao judiciário.

O que o acordo de confidencialidade precisa incluir?

O acordo de confidencialidade, também conhecido como NDA (Non-Disclosure Agreement), é um documento legal que formaliza a obrigação das partes envolvidas de manter determinadas informações em sigilo. Ele é a base para proteger a propriedade intelectual e outros dados sensíveis de sua startup. Da mesma forma, é possível que o NDA faça parte de algum outro contrato, como o contrato de prestação de serviço.

Um NDA eficaz precisa conter várias cláusulas importantes, como:

  • Definição das Informações Confidenciais: estabelece de forma clara o que é considerado confidencial, evitando ambiguidades que possam enfraquecer o acordo;
  • Obrigações das Partes: define as responsabilidades de cada parte em relação ao manuseio e proteção das informações confidenciais, além de obrigações associadas;
  • Duração da Confidencialidade: especifica por quanto tempo as informações devem ser mantidas em sigilo, mesmo após o término da relação comercial;
  • Exclusões da Confidencialidade: determina quais informações não serão consideradas confidenciais, como aquelas que já são de domínio público;
  • Consequências da Violação: descreve as penalidades ou ações legais que podem ser tomadas em caso de quebra do acordo;
  • Permissões Especiais: estabelecem permissões para o compartilhamento de informações confidenciais sob circunstâncias específicas, como ordens judiciais ou regulatórias, ou com o consentimento prévio por escrito da outra parte;
  • Devolução de Informações Confidenciais: estipula as condições para, ao término do acordo ou quando solicitado, a devolução das informações pela parte que as recebeu, ou estabelece a destruição das informações confidenciais em sua posse, incluindo documentos físicos e dados eletrônicos. 

A formalização dessas condições em um documento legal garante que todas as partes envolvidas tenham uma compreensão clara e inequívoca do que está em jogo. Isso não só protege sua startup, mas também promove um ambiente de negócios mais transparente e seguro.

Basta um contrato?

Mais do que um simples documento, a confidencialidade deve ser uma prática incorporada na cultura organizacional da startup. Isso significa que todos os colaboradores, parceiros e terceiros envolvidos no negócio precisam entender e respeitar a importância de manter informações sensíveis protegidas.

Implementar políticas internas que reforcem a confidencialidade, como treinamentos regulares e diretrizes claras, é fundamental para garantir que todos estejam alinhados com as expectativas da empresa. Além disso, é importante revisar periodicamente os NDAs e outras políticas de segurança da informação para garantir que estejam atualizados e eficazes frente às mudanças no ambiente de negócios. A confidencialidade é uma responsabilidade coletiva, e apenas com um esforço conjunto é possível garantir que as informações cruciais da sua startup permaneçam seguras. 

Além de um NDA robusto, uma startup deve considerar outras medidas legais para proteger a confidencialidade, como a implementação de contratos de trabalho que incluam cláusulas de não-concorrência e não-solicitação, garantindo que ex-colaboradores não utilizem informações sensíveis após deixarem a empresa. 

Também é essencial adotar regras de segurança da informação, que envolvam restrição de acesso a dados críticos e uso de ferramentas de criptografia. Por fim, monitorar e auditar regularmente o cumprimento dessas políticas e cláusulas contratuais assegura que a confidencialidade seja mantida de forma eficaz.

É possível fazer tudo por conta própria?

Elaborar um NDA pode parecer simples à primeira vista, especialmente com a vasta quantidade de modelos disponíveis na internet. No entanto, cada startup tem suas particularidades, e um documento genérico pode não oferecer a proteção adequada para as necessidades específicas da sua empresa.

Um advogado especializado pode ajudar a personalizar o NDA, garantindo que todas as nuances e particularidades do seu negócio sejam contempladas. Além disso, contar com a orientação jurídica evita que cláusulas mal redigidas ou lacunas legais comprometam a eficácia do acordo.

Por exemplo, um advogado pode identificar situações específicas em que uma startup precisa de proteções adicionais, como em acordos com investidores ou em parcerias de desenvolvimento de tecnologia. A falta de uma cláusula adequada pode levar a disputas legais complexas e onerosas, que poderiam ter sido evitadas com uma consultoria jurídica apropriada.

TL,DR: No mundo das startups, a confidencialidade é crucial para proteger a competitividade. Confiar em promessas informais pode ser arriscado e comprometer o futuro do negócio. Um NDA robusto, elaborado com a ajuda de um advogado, é essencial para proteger ideias e estratégias. Além disso, uma cultura interna de confidencialidade reforça essa proteção. No ambiente corporativo, a confiança deve sempre ser acompanhada de medidas legais sólidas.

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Teremos o maior prazer em atendê-lo(a).

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