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Quando acabará a atual fase?

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O menor sinal já é um sinal. Aquela refração lá na frente em um dia escaldante no deserto nem sempre é uma miragem, pode ser o Bruno Serra Fernandes, Diretor de Política Monetária do Banco Central do Brasil, apontando para uma saída. Explico. Maio viu um aumento de 1% na Selic, que bateu em 12,75% ao ano. Soa como um indicativo de tempestade de areia que cega o olho, quase um presságio de que as temperaturas baixas da noite anterior vão cobrar as cabeças dos que nasceram sob os 2% ao ano. Mas a declaração do diretor do BC foi clara: “A preferência é por menos flutuação da taxa de juros”.

Pronto, já dá para pensar em tomar um gole do cantil, mesmo estando no deserto. A declaração de Serra é a sinalização de que não há a intenção de continuar a elevar a taxa de juros para muito além da próxima reunião do Copom, uma senha para o mercado entender que o aperto monetário não deve ir muito longe. Isso todo mundo  sabe, mas o que vale destacar é o paralelo histórico entre o aumento da Selic e as quedas da bolsa ­– e vice e versa. Justamente no final de um ciclo de aumento de juros – exatamente o que estamos tomando na cabeça – aparecem as mínimas da bolsa para o período.

O exemplo das ações small caps na bolsa, que são empresas menores e com menos liquidez – mais parecidas com as startups –, ilustra bem esse raciocínio. Uma parada no crescimento da Selic – perto de uns 13,75% –, e teremos a tendência de recuperação das ações dessas empresas, indicativo de que o pânico dos investidores pode ter alcançado o extremo. Ninguém precisa achar que voltaremos no tempo. Continue inovando. Tudo indica que ficaremos nesse patamar por mais tempo. No lugar de subidas e descidas, vamos baixar a altitude. E isso é bom.

Em três meses poderemos ver a recuperação das small caps por conta dessa linha reta nos juros, o que precifica para cima o valuation das startups. Nosso mercado deve voltar a clarear e ganhar estímulo em todos os sentidos. Lembre-se que a bonança não mostra quem você realmente é. Jogue bem durante a tempestade. Ou seja, saiba minuciosamente onde seu negócio ganha ou perde e tenha a antifragilidade como parte da sua estratégia. O oposto é encarar o deserto sem cantil, pedindo água para os beduínos. Faça ajustes, fique atento ao burn rate. Não se deixe mimar pela liquidez de outros tempos, por valuations que têm um componente de miragem.

Olhando pela ótica do mercado americano, as empresas normalmente compram de volta suas ações quando estão confiantes sobre o futuro e veem os preços subvalorizados. As recompras de ações dos EUA estão batendo recordes, mesmo com investidores preocupados com a crescente ameaça de inflação e uma possível recessão. Novos anúncios de recompra de empresas norte-americanas atingiram mais de USD 300 bilhões no primeiro trimestre, segundo a EPFR – Informa Financial Intelligence.

Mas se você quer mais argumentos, vamos lá. O problema inflacionário no mundo está concentrado nas commodities e os principais bancos centrais atuam para tirar suas economias do derretimento. É possível que o Bacen brasileiro realmente não tenha de aumentar a Selic além das duas próximas reuniões. Há quem acredite em uma taxa de 9,75% para o próximo ano, se o petróleo e o câmbio não atrapalharem. Jogue com a realidade atual e a futura.

Quando se fala na crise atual – não vou negar, ela realmente existe, o supermercado não deixa dúvidas –, não estamos nos referindo ao dominó financeiro de 2008. Diferentemente daquele momento, quando os governos injetaram mares de dinheiro para salvar a vida como a entendíamos, não vai haver ninguém para salvar em massa as startups – portanto, tenha mão firme no arreio da gastança geral. E mais: não estamos num cenário como o de dano fiscal e recessivo lá de 2014/2016, em que o PIB caiu 10%. Estamos melhores, friamente falando, historicamente falando. O que se discute no Brasil é se nosso crescimento será de zero ou 2%. Percebe como o cenário é outro e existem crises e crises?

Ainda há crescimento

Ainda que baixo, o crescimento do mercado continua. Estamos extremamente conectados com o resto do mundo, com um ecossistema irrigável e com uma indústria ainda pouco digitalizada – um revés bom para quem quer injetar modelos disruptivos de negócio. Um exemplo: a mexicana Kavak, de compra e venda de carros usados, maior unicórnio da América Latina, avaliada atualmente em US$ 8,7 bilhões, chegou ao Brasil em 2021 com uma abordagem digital e de marketing acelerado, assustando os vendedores de lojas físicas tradicionais. No entanto, terá o mesmo desafio de outras startups: se provar e se sustentar a médio prazo – o nosso médio prazo, de dois anos, não o de décadas, como era na Velha Economia.

Mais dados que indicam mais sinais positivos: depois de quedas nas captações desde janeiro, as startups latino-americanas tiveram um bom resultado em maio, levantando US$ 1,4 bilhão em investimentos, de acordo com a Sling Hug. Os números de maio cresceram 61% sobre abril, além de ter alçado três startups ao posto de unicórnios. O Brasil representou  52% dos investimentos, com 48 startups captando quase  US$ 700 milhões.

O BC diz que tem na conta a meta inflacionária, não passou nenhuma borracha nela – ou seja, apesar de dar sinais de que não pretende escalar ainda mais os juros para conter a inflação, quer calibrar a mistura para encontrar o prumo da balança em um cenário de incertezas no mundo todo. Existe, por exemplo, uma guerra do outro lado do hemisfério, sem sinal de quando vai acabar, o que mantém elevada a pressão econômica. Enquanto isso, calma. E siga no deserto com cautela. 

P.S.: Sei que alguns tiozões da Velha Economia vão dizer: “Ah, isso é otimismo demais!” Para eles, lembro um comentário do empresário Jorge Paulo Lemann, sócio-fundador do 3G Capital e acionista da AB InBev, sobre o atual momento das startups: “Esse é um tempo maravilhoso para investir. Os preços recuaram e os empreendedores estão prontos para aceitar ofertas um pouco mais baixas. É possível achar coisas boas”. Na Nova Economia sabemos o valor do entendimento dos ciclos e de ter perspectiva.

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