Coluna

Escolas e startups: como aproximá-las?

Escolas inovadoras não revolucionam somente sua sala de aula, mas permitem que a inovação aterrisse em todos os seus processos internos

Educação e tecnologia
Educação e tecnologia | Foto: Canva

*Por Ulisses Cardinot, fundador e CEO da International School,  principal programa de educação bilíngue do país e corporação membro do Cubo Itaú

Houve um tempo na educação brasileira em que inovar significava comprar diversos computadores e enfileirá-los naquilo que as escolas chamavam de Laboratório de Informática. Ali, os alunos tinham aulas de Informática Básica uma vez por semana. Teoricamente, tais aulas provavam que aquela instituição estava verdadeiramente atenta às tendências do futuro.

É curioso que, 25 anos depois, muitos ainda acreditem que a mera presença de equipamentos eletrônicos nas salas de aula seja suficiente para classificar uma escola como inovadora. Essa, aliás, é uma confusão comum não apenas entre educadores, já que poucos sabem que o real conceito de inovação não necessariamente envolve o uso de tecnologias. Inovar é encontrar soluções criativas e eficientes para resolver desafios cotidianos.

Se a cosmovisão da escola continua a mesma, se suas aulas são as mesmas, e se os alunos que ela entrega à sociedade não aprenderem a solucionar desafios de forma criativa, de nada adianta entregar um tablet a cada um deles. Isso não é inovação!

A verdadeira inovação começa a partir da construção de uma cultura pedagógica e administrativa. Escolas inovadoras não revolucionam somente sua sala de aula, mas permitem que a inovação aterrisse em todos os seus processos internos.

Como, porém, fazer isso e ainda conseguir dar conta das demandas diárias?

É aqui que chegamos à oportunidade ainda pouco explorada de escolas e startups dialogarem mais de perto. As startups precisam da validação e capilaridade das escolas; estas, por sua vez, carecem da agilidade e rapidez das startups. Se temos escolas em busca de inovação e, em contrapartida, temos soluções inovadoras querendo ser testadas, por que esses dois ecossistemas ainda parecem estar tão distantes um do outro?

A resposta não é simples e começa com o mesmo sentimento que levava à construção dos hoje folclóricos laboratórios de informática: a noção de que a tecnologia é um “equipamento” e que o mundo corporativo é um universo à parte das escolas.

Gestores escolares são desconfiados por natureza, e é preciso dar um passo atrás para compreender as raízes dessa desconfiança, que não é gratuita. Cabe ressaltar que a principal missão de uma escola é promover o desenvolvimento de crianças e jovens, preparando-os para o mercado e para a vida, mas, para isso, tendo que seguir parâmetros curriculares rigorosos, sempre sob o escrutínio das famílias. Não é uma tarefa simples e, justamente por isso, o medo de mudar processos e implementar novidades é grande. Afinal, uma leve alteração na metodologia pedagógica de uma sala do 1º ano do Ensino Fundamental, por exemplo, pode impactar aquelas crianças pelo resto de suas jornadas escolares.

Por outro lado, profissionais ligados ao ecossistema de inovação tendem a ter um perfil mais dinâmico e disruptivo, já que esse trabalho envolve um processo comum de “erro e acerto”, com a intenção de romper paradigmas existentes. Tal mindset pode assustar um educador acostumado a modelos pedagógicos e administrativos já validados.

Vale ressaltar que essa distância entre o segmento da educação e o mundo das startups é um fenômeno observado em diversos países, não sendo uma particularidade do Brasil. Diante disso, há uma urgência em criar pontes entre esses dois mundos: nas startups, a presença de profissionais de educação como pedagogos e professores, capazes de avaliar os principais desafios desse mercado e as melhores soluções, com a capacidade de adequá-las ao ambiente escolar e de se comunicar com esse público; e nas escolas, o desenvolvimento de um olhar mais empático e confiante para a tecnologia que não necessariamente nasce como “educacional”, mas que pode descobrir-se como tal.

A Inteligência Artificial é o exemplo perfeito disso. Se a IA já é parte da nossa realidade, daqui a 10 ou 20 anos, quando as crianças que estão na escola hoje estiverem no mercado de trabalho, ela estará ainda mais difundida. É preciso preparar esses estudantes para lidarem com as plataformas digitais de forma consciente e responsável a partir de sua inclusão nos programas educacionais. 

Para os professores, a IA é um suporte que não só pode, como deve ser usado. Hoje, algumas tecnologias podem ajudar os professores a personalizarem planos de aula, por exemplo, considerando a pluralidade dos alunos. Não podemos ignorar que cada criança e jovem tem um ritmo de aprendizado e características específicas. Mas como um só professor pode adaptar dezenas de aulas para mais de 20, às vezes 30 estudantes? Com IA. Esse mesmo professor pode usar plataformas de customização de atividades, dedicando melhor o seu tempo para compreender melhor as necessidades dos alunos.

Há uma infinidade de possibilidades para criar novas soluções para os mais diferentes desafios cotidianos das escolas. Mas a principal lição que tanto os profissionais de educação quanto os de inovação precisam entender é que não estamos buscando uma mudança estrutural, e sim cultural. Não é mais sobre adquirir equipamentos; é sobre construir uma nova visão de mundo.