*Por Rodrigo Amaral e Isabela Ardaya
Os planos de stock option (stock option plans) foram inicialmente implementados na década de 1950, nos Estados Unidos da América. Apesar de previstos na legislação societária desde a edição da atual Lei das Sociedades por ações que é de 1976, esse mecanismo de retenção de talentos e incentivo de longo prazo passou a ser difundido no Brasil apenas por volta de 1990 e, desde então, tem sido prática cada vez mais adotada em companhias brasileiras.
Por representarem um benefício que, em regra, não implica o desembolso de recursos financeiros pela companhia – mas sim a entrega de participação societária ao colaborador, os planos de stock option são muito utilizados por startups que desejam atrair e reter colaboradores estratégicos sem aumentar de forma proporcional os custos decorrentes da contratação de pessoas altamente qualificadas.
Neste artigo, explicaremos como são implementados os planos de stock option, alguns conceitos fundamentais para entender o seu funcionamento e como são utilizados para atrair, reter e motivar colaboradores estratégicos.
Antes de iniciar, gostaríamos de ressalvar que, por terem surgido nos Estados Unidos da América, grande parte da terminologia utilizada no contexto de planos de stock option é importada do inglês. Ao longo do artigo, fizemos a tradução livre de algumas expressões para facilitar a compreensão dos conceitos – ainda que os termos em português não representem fielmente as expressões originais e que no mercado os termos em inglês sejam mais comumente utilizados.
Como são implementados os planos de stock option?
Os planos de stock option são formalizados por meio de um contrato de opção de compra (dentre outros documentos acessórios), por meio do qual é concedida ao colaborador uma opção de compra (mas não a obrigação de compra) de participação societária na empresa, condicionada ao cumprimento de determinados requisitos preestabelecidos.
Caso o colaborador cumpra os requisitos e exerça a sua opção de compra, a empresa fica obrigada a entregar ao colaborador a participação societária, mediante o pagamento de um preço de exercício (conforme será tratado adiante, há planos em que o colaborador não precisa fazer o pagamento pela participação societária).
Conceitos fundamentais para entender os planos de stock option
No âmbito de planos de stock option, os seguintes termos são frequentemente utilizados e, por essa razão, é imprescindível compreender o significado de cada um para entender as principais características, as possíveis estruturas e o funcionamento prático dos planos:
- Granting (outorga): corresponde ao momento em que a opção de compra é outorgada (concedida) a determinado colaborador, por meio da celebração de um contrato de opção de compra. No momento de assinatura do contrato, são definidos todos os termos e condições relacionados à opção de compra do colaborador (percentual de participação ao qual terá direito, cliff, vesting, strike price, etc.). Em regra, no momento de assinatura do contrato, o colaborador ainda não adquire (nem recebe o direito) de adquirir participação societária, sendo necessário cumprir previamente determinadas condições estabelecidas pelo plano (cliff, vesting etc.).
- Cliff: é o período mínimo no qual, após a outorga da opção de compra (assinatura do contrato), o colaborador deve permanecer no exercício de suas funções na empresa para iniciar o período de aquisição do direito de compra da participação societária (vesting period). Em regra, caso o colaborador se desligue da empresa durante o período de Cliff, nenhum direito será adquirido ou poderá ser exercido pelo colaborador. O período de Cliff, cuja duração usualmente varia entre 1 e 2 anos, funciona como um “período probatório”, para que haja a confirmação de que há compatibilidade de longo prazo entre o colaborador e a empresa – razão pela qual nenhum direito ou participação societária é adquirida em tal período (que normalmente é suficiente para a identificação de incompatibilidades evidentes e encerramento de vínculo sem maiores complicações e burocracias). Também é bastante usual que planos criados para colaboradores que já estão vinculados à empresa possuam um período de Cliff reduzido ou até mesmo não possuam um período de Cliff (iniciando-se o vesting period imediatamente após a assinatura do contrato).
- Vesting Period (período de aquisição): é o período que se inicia após o término do Cliff (se existir) e durante o qual o colaborador, de forma progressiva, passa a adquirir o direito de exercer a opção de compra para receber efetivamente a participação na empresa. Geralmente, os Vesting Periods variam de 3 a 5 anos. A título exemplificativo, em um plano de stock option com vesting period mensal de 60 meses, a cada mês em que o colaborador permanece vinculado à empresa, ele adquire o direito de exercer a opção de compra sobre 1,66% da participação total à qual tem direito (o Vesting Period poderia também ser anual, de 5 anos, por exemplo, de modo que a aquisição do direito ocorreria apenas após o decurso de cada ano). Desse modo, ao final do 5º ano, o colaborador poderá ter exercido a opção de compra sobre 100% da participação que lhe foi outorgada. Ao contrário do que ocorre no período de cliff, quando o vínculo do colaborador é encerrado durante o Vesting Period, é comum que o colaborador mantenha os direitos de exercício da opção de compra já adquiridos (ou como se diz, já “vestidos”), proporcionalmente ao prazo do Vesting Period transcorrido até o encerramento do vínculo (salvo quando o desligamento decorre de faltas graves praticadas pelo colaborador, cujas hipóteses são definidas no âmbito do plano).
- Lock-up Period (período de bloqueio): é o período iniciado após a efetiva aquisição da participação societária, durante o qual é vedado ao colaborador vender ou transferir a participação societária. O Lock-up Period geralmente está vinculado a um período em que se espera que o colaborador permaneça como sócio da empresa e busque o desenvolvimento do negócio e atingimento de determinados objetivos (como a captação relevante de recursos, lançamento de um novo produto, aquisição de uma determinada participação de mercado, uma oferta pública inicial – IPO etc.). Além do Lock-Up de Ações (vedação à alienação de ações por um período determinado), é comum a previsão de um período de Lock-Up de Gestão, durante o qual o colaborador deve se manter no exercício das suas atividades na empresa.
- Strike Price (preço de exercício): refere-se à contrapartida paga pelo colaborador para aquisição da participação societária em caso de exercício da opção de compra. Este valor pode ser previamente determinado ou ser determinável com base em parâmetros delineados no contrato de opção de compra. Geralmente, o Strike Price é estabelecido considerando descontos em relação ao valor efetivo – o valuation atual – da participação adquirida, de modo a representar um benefício ao colaborador. Por exemplo, se a empresa atua em um setor no qual os valuations costumam se basear em múltiplos de 6 vezes o EBITDA ou lucro líquido, o plano pode estabelecer um critério de determinação do Strike Price com base em 4 vezes o EBITDA ou lucro líquido. Por fim, destaca-se que não é incomum que planos estabeleçam Strike Prices baixos ou irrisórios em relação ao valor de mercado da participação, representando um benefício ainda maior aos colaboradores (a despeito dos aspectos tributários e trabalhistas que precisam ser analisados quando há essa previsão).
- Expiration Date (data de vencimento): é o prazo limite previsto no contrato de opção de compra para o colaborador exercer a opção de compra. Após esse prazo, o direito de adquirir a participação societária se extingue. A depender do modelo de plano escolhido, a forma e o procedimento de exercício da opção de compra possuem diversas variações. Os dois procedimentos mais comuns são: (i) exercício único e integral da opção de compra após o decurso completo do Vesting Period e antes da Expiration Date; e (ii) exercícios parciais da opção ao longo do Vesting Period, usualmente realizados ao final de cada semestre ou ano, proporcionalmente à “participação vestida” no respectivo período. O procedimento de exercício estabelecido pelo plano deve se adequar à realidade de cada empresa, levando-se em conta os objetivos almejados e a complexidade operacional de implementação e controle decorrente de cada tipo de plano.
Para facilitar a compreensão, a linha do tempo abaixo demonstra, em uma perspectiva temporal, a aplicação de cada um dos conceitos tratados acima no âmbito de um plano de stock option:
É importante reforçar que essa linha do tempo, apesar de usual, não é obrigatória, uma vez que a adoção dos mecanismos indicados acima pode (e deve) ser customizada conforme objetivos que a empresa busca com a implementação do plano de stock options, bem como a sua maturidade e realidade operacional.
Por que e como os planos de stock option representam um benefício para o colaborador?
Após compreender os principais conceitos relacionados aos planos de stock option, é possível entender também como esses planos são utilizados pelas empresas para gerar benefícios visando a retenção e a atração de colaboradores estratégicos.
De modo geral, o Strike Price estabelecido no contrato de opção de compra é fixado com base em um valor de mercado predeterminado da empresa, em relação ao qual ainda pode (ou não) ser fixado um desconto adicional. Desse modo, ainda que a empresa tenha um ótimo desempenho e aumente o seu valor de mercado, o colaborador continuará tendo o direito de adquirir a participação societária com base no valor fixado em seu contrato. Com isso, o principal benefício financeiro ao colaborador consiste em pagar um preço menor por uma participação que já possui um valor de mercado muito superior, em razão do crescimento e bom desempenho da empresa.
Esse mecanismo acaba gerando um grande incentivo para que: (i) o colaborador permaneça na empresa durante o Cliff, o Vesting Period e o Lock-Up Period, visando a aquisição da participação e a possibilidade de venda futura; (ii) o colaborador mantenha um alto desempenho em suas funções, com o objetivo de gerar um crescimento e valorização da empresa e, consequentemente, da participação societária a que tem direito; e (iii) em caso de não ocorrência de um evento de liquidez (venda da participação adquirida), o colaborador possa usufruir dos direitos decorrentes da titularidade das ações da empresa (direito de voto, participação nos lucros, etc.).
Do ponto de vista de atração e contratação de colaboradores estratégicos, os planos de stock option são muito utilizados por startups que, apesar de possuírem muito potencial de crescimento e valorização, não contam com altos orçamentos para a contratação de profissionais altamente qualificados.
Resumidamente, o mecanismo utilizado para atração de profissionais funciona da seguinte forma: imagine uma startup que possui um valor de mercado (valuation) de R$ 60 milhões e deseja contratar um colaborador estratégico cujo salário de mercado é de R$ 30 mil, mas possui apenas R$ 20 mil mensais de orçamento para essa contratação. Uma alternativa para contratar esse colaborador seria ofertar um salário de R$ 20 mil em conjunto com um plano de stock option para que o colaborador adquira uma participação de 1% na startup ao longo de um Vesting Period de 5 anos.
A participação de 1% ofertada por meio do plano representaria um valor total de R$ 600 mil (considerando o valuation atual da startup) que, dividido pelos 60 meses de Vesting Period, representaria a aquisição mensal pelo colaborador de uma participação equivalente a R$ 10 mil (diferença entre o salário de mercado do profissional e o salário ofertado pela startup). Dessa forma, passaria a fazer sentido para o colaborador se vincular à startup mesmo com um salário fixo inferior ao salário que receberia no mercado, tendo em vista que receberá uma participação societária na startup para suprir essa diferença salarial (participação essa que ainda pode atingir uma valorização representativa ao longo do tempo, com potencial de gerar ainda mais benefícios financeiros ao contratado).
Uma observação importante: neste exemplo acima, para fins de simplificação, consideramos um Strike Price de valor irrisório e a inexistência de um período de Cliff. De toda forma, a mesma lógica se aplica a planos que possuem período de Cliff e Strike Price cujo valor seja considerável.
Os principais tipos de planos de stock option
Após entender a lógica geral dos planos de stock option, é possível entender os principais modelos de planos utilizados no mercado. A escolha entre esses modelos varia de acordo com cada contexto, necessidades e objetivos da empresa.
- Basic Stock Option Plan (Plano Básico de Opção de Compra de Ações): neste modelo, a empresa concede ao colaborador o direito de comprar participação societária a um preço definido após um período estabelecido no contrato de opção de compra. Neste caso, o colaborador efetivamente recebe a participação societária, tornando-se sócio da empresa e assumindo os direitos e obrigações relacionados a essa condição (participação em reuniões de sócios ou assembleias gerais, exercício do direito de voto, participação nos lucros, etc.).
- Employee Stock Purchase Plan (Plano de Opção de Compra de Ações para Colaboradores): esta estrutura é semelhante ao Basic Stock Option Plan. No entanto, para viabilizar a aquisição da participação societária, são feitos descontos periódicos nos pagamentos de salários dos colaboradores que fazem parte do plano para criar uma reserva de fundos com esse objetivo. Essa estrutura é menos comum no Brasil, principalmente devido às regulamentações trabalhistas relacionadas à remuneração dos colaboradores.
- Restricted Stock Plan (Plano de Opção de Compra de Ações Restritas): nesta estrutura, não há concessão de uma opção de compra de participação societária para o colaborador. A empresa concede um pacote de ações ao colaborador (ações restritas), a título gratuito, e o exercício da titularidade dessa participação ficará sujeito a algumas condições impostas pela empresa. Os requisitos para a doação dessa participação societária podem consistir em o colaborador permanecer na empresa por um certo período ou na ocorrência de um aumento específico no valuation (valor de mercado) da empresa.
- Phantom Stock Plan (Plano de Opção de Compra de Ações Fantasmas): os colaboradores adquirem o direito de receber um pagamento no futuro, vinculado ao aumento no valuation (valor de mercado) da empresa ou à ocorrência de um evento de liquidez (como captação de recursos, mudança de controle, oferta pública inicial – IPO). Geralmente, o colaborador não adquire as ações e, portanto, não se torna efetivamente sócio da empresa. Ao invés disso, o colaborador recebe a quantia correspondente ao aumento no valor patrimonial da participação societária, ou seja, a diferença entre o Strike Price e o preço de mercado futuro das ações. Em um cenário de evento de liquidez, o colaborador pode se tornar sócio da empresa por um breve período apenas para vender sua participação societária com o respectivo ganho. Ao contrário do Basic Stock Option Plan, os colaboradores não recebem direitos de sócio, mas são apenas compensados em função do aumento no valor da empresa ou da ocorrência de um evento de liquidez.
Quais empresas podem criar planos de stock option?
Os planos de stock option podem ser adotados diferentes tipos de empresas, desde empresas de capital aberto até startups. Os planos de stock option são especialmente úteis no contexto de startups, uma vez que essas empresas geralmente não têm, no momento inicial do seu desenvolvimento, recursos financeiros significativos para compensar, atrair e reter colaboradores estratégicos. Apesar disso, espera-se que essas empresas criem grande valor e se desenvolvam exponencialmente, o que pode se tornar muito atrativo para os colaboradores.
Os planos de stock option são ferramentas versáteis para empresas que desejam incentivar, atrair e reter colaboradores essenciais para o desenvolvimento dos negócios, sendo que a escolha apropriada de modelo e estrutura é fundamental para o sucesso do plano.
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