*Por Ana Paula Franco e Sérgio Oliveira
Nos últimos anos, o mercado imobiliário tem passado por uma revolução digital. Um dos avanços mais notáveis é em relação à assinatura digital de contratos. Com o uso crescente de plataformas digitais para assinar documentos, a burocracia que antes tornava o processo de assinatura lento e cansativo, hoje caminha para o desaparecimento. Você pode fechar uma negociação imobiliária sem sair de casa, com apenas um clique. Isso significa economia de tempo, dinheiro e um fluxo de trabalho mais eficiente, algo que faz toda a diferença para startups e empresas que buscam soluções rápidas.
Mas, como em qualquer inovação, é preciso ficar atento aos detalhes. É fundamental tomar certos cuidados para garantir que esses contratos tenham validade jurídica e cumpram todas as exigências legais.
Para garantir a utilização correta desse valioso instrumento tecnológico, portanto, é preciso conhecer alguns conceitos importantes.
O que garante a validade jurídica de uma assinatura eletrônica?
Em vista a crescente adoção de documentos eletrônicos, o mercado imobiliário passou a se beneficiar de maior celeridade, segurança e eficiência nas transações. Mas, o que garante que esses documentos assinados eletronicamente terão validade? Em resumo, é a existência de um conjunto de regras jurídicas que regula de forma minuciosa a sua utilização.
A regulamentação das assinaturas eletrônicas envolvendo contratos em geral e contratos imobiliários se encontra em diferentes atos normativos, com destaque para os seguintes:
- Medida provisória 2.200-2/2001: criou a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) e estabeleceu as normas para a criação e utilização, assegurando a validade jurídica das assinaturas digitais qualificadas;
- Lei federal nº 14.063/2020: é a lei que regulamenta o uso de assinaturas eletrônicas no âmbito público e privado, classificando-as em simples, avançadas e qualificadas;
- Resolução CNJ nº 180/2024: dispõe de regulamentações específicas sobre documentos eletrônicos em atos de notários e registradores, determinando um padrão de segurança e integridade para documentos digitais no âmbito imobiliário.
Os instrumentos normativos acima referidos consolidaram e regularam o uso de assinaturas eletrônicas em negócios jurídicos em geral, e, em particular, negócios jurídicos imobiliários, estabelecendo critérios e requisitos que devem ser observados para garantir segurança contra fraudes e falsificações, como a criação de uma entidade responsável por fiscalizar e garantir a higidez de todo o sistema.
Assim, a fim de que sejam respeitadas e analisadas as exigências de cada tipo de contrato, em especial para aqueles que necessitam de escritura pública, é preciso conhecer um pouco sobre os tipos de assinatura eletrônica existentes.
Quais os tipos de assinatura digital?
Existem diferentes tipos de assinaturas digitais, cada uma com diferentes níveis de segurança e requisitos legais, as quais são regulamentadas no Brasil pela Lei federal nº 14.063/2020, antes mencionada, sendo elas:
- Assinatura Simples: embora permita identificar o signatário, associando outros dados em formato eletrônico (endereço eletrônico, por exemplo), oferece um nível básico de segurança, justamente por se valer de formas menos refinadas de identificação. É útil para documentos do dia a dia, não sendo recomendável para contratos que exigem maiores formalidades ou que envolvam questões complexas e valores elevados;
- Assinatura Avançada: proporciona maior segurança, pois vincula o signatário ao documento, de modo que qualquer modificação posterior pode ser detectada. Esse tipo de assinatura é amplamente usada em contratos de maior complexidade, incluindo operações comerciais e contratuais formais.
- Assinatura Qualificada: esse é o nível mais elevado de segurança, realizado com certificados digitais emitidos por uma autoridade certificadora (como o ICP-Brasil). Ela é exigida especialmente em contratos que precisam ser levados a registro ou averbação em cartório, como é o caso de transações envolvendo direitos reais sobre bens imóveis.
O entendimento dos tipos as assinaturas eletrônicas existentes são essenciais à garantia do nível de segurança e validade jurídica de cada tipo de documento. A utilização de assinaturas inapropriadas pode comprometer a autenticidade, integridade, validade e/ou eficácia de um contrato. Portanto, é muito importante se atentar para a escolha da assinatura mais adequada ao negócio jurídico que será celebrado, a fim de garantir o reconhecimento legal dos documentos e resguardar os direitos das partes.
É possível utilizar assinatura eletrônica em contratos imobiliários?
Se as assinaturas eletrônicas têm validade assegurada por Lei, é possível utilizá-las em qualquer contrato imobiliário? A resposta exige cautela.
É preciso analisar qual é o tipo de negócio imobiliário que será firmado, e, aqui, é necessário fazer um rápido aviso: alguns contratos imobiliários exigem escritura pública, correspondente à forma pública conferida pelos tabelionatos de notas, e outros não o exigem. Entender essa distinção é fundamental não apenas para saber se é possível utilizar uma assinatura eletrônica, mas também qual tipo usar, como explicado acima.
O art. 108 da Lei federal nº 10.406/2002 (“Código Civil”) estabelece que, salvo disposição legal em contrário, é obrigatória a lavratura de escritura pública para a validade de negócios jurídicos que visem a constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis cujo valor seja superior a 30 vezes o salário-mínimo. A escritura pública constitui documento a ser formalizado perante cartórios de notas e que, a partir da Resolução CNJ nº180/2024, pode ser feita e assinada de forma eletrônica, desde que observados os padrões de segurança estabelecidos nessa resolução
Independentemente de ser firmada física ou eletronicamente, a escritura deve ser registrada posteriormente em cartório de registro de imóveis no qual o imóvel estiver registrado, a fim de que o negócio jurídico nela consubstanciado produza efeitos não só entre as partes contratantes, mas também perante terceiros.
Contudo, há casos em que a legislação confere “força de escritura pública” a contratos particulares, tornando-os títulos aptos a serem registrados diretamente nos cartórios de registros de imóveis independentemente de adotarem a forma pública. Esse é o caso de contratos de financiamento imobiliário e/ou que contenham e alienação fiduciária de bem imóvel como modalidade de garantia atrelada ao negócio jurídico principal, desde que celebrados com entidades pertencentes ao Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI.
Para os negócios imobiliários celebrados por simples instrumento particular, vale a regra geral de que a assinatura eletrônica é possível, devendo ser observado apenas o grau de segurança que se quer garantir à operação. Meios comuns de assinatura eletrônica simples, disponíveis na internet de forma gratuita ou paga (como o Docusign e D4sign), podem ser usados.
Para os contratos que exigem escritura pública, de outro lado, a utilização de assinaturas eletrônicas é possível, mas a resposta definitiva variará caso a caso, sendo preciso ficar atento a algumas questões de ordem jurídica e prática antes de adotar esse meio de assinatura.
Algumas exigências para validade jurídica dos contratos imobiliários eletrônicos sujeitos a registro
Em relação aos negócios imobiliários celebrados por escritura pública, a Resolução nº 180/2024 do CNJ traz pontos relevantes sobre como esses documentos devem ser gerados sob a forma eletrônica, sobre como devem ser assinados e lavradas e registrados no âmbito notarial e registral, respectivamente. Podemos destacar os seguintes requisitos:
- Assinatura eletrônica qualificada: a maioria dos contratos imobiliários, especialmente os que exigem escritura pública, é necessária a assinatura eletrônica qualificada, emitida por certificado digital vinculado ao ICP-Brasil. Esse tipo de assinatura certifica a integridade e autenticidade do documento, garantindo que ele não seja alterado após a assinatura;
- Formato padrão do documento: os documentos devem ser gerados em formatos compatíveis com os sistemas dos cartórios de notas e de registro de imóveis, sendo o PDF/A o formato mais aceito, uma vez que ele impede modificações após o seu arquivamento, garantindo ainda mais a integridade dos registros realizados;
- Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI): regulamentado pela Lei federal nº 11.977/2009 e pela Resolução nº 180/2024 do CNJ, deve ser utilizado para o envio de documentos eletrônicos ao cartório de registro de imóveis, garantindo que o processo de registro dos contratos imobiliários ocorra de forma digital;
- Proteção de dados e conformidade com a LGPD: todos os dados pessoais envolvidos na celebração de um contrato imobiliário (p.ex.: identidade, CPF etc.) devem ser tratados em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
É fundamental que as partes envolvidas se utilizem de plataformas seguras e reconhecidas para a gestão e armazenamento dos documentos eletrônicos, assegurando que os requisitos legais sejam respeitados.
Plataformas comuns de assinatura de documentos eletrônicos do dia-a-dia podem não servir nesse caso. A escolha da plataforma adequada dependerá do que for exigido ou recomendado pelo cartório da região em que o documento eletrônico deva ser assinado e, posteriormente, registrado.
É preciso ter atenção nesse ponto, pois as plataformas de assinatura podem não ser uniformes e podem usar diferentes métodos ou programas para alcançar o mesmo resultado final, que é a aposição das assinaturas eletrônicas dos signatários nos documentos. Muitas vezes, uma determinada plataforma pode ser aceita por um cartório e não aceita por outro, o que exige atenção em cada caso.
A necessidade de observar as formalidades exigidas por cada cartório traz ainda uma outra questão de ordem prática: nem todos os cartórios estão adaptados para a digitalização dos atos notariais e registrais. A assinatura eletrônica nesses casos não será possível se o cartório não possuir um sistema adaptado para o processamento de documentos assinados eletronicamente.
Conclusão
As assinaturas digitais estão transformando a forma como os contratos são firmados, inclusive no setor imobiliário. Contudo, é essencial estar atento aos requisitos legais, como o uso de assinaturas qualificadas para registros e a exigência de documentos em formato PDF/A para garantir a sua registrabilidade e evitar problemas futuros.
A tecnologia trouxe praticidade, mas a conformidade com as normas jurídicas ainda é o alicerce para a validade e eficácia dos negócios, exigindo que os utilizadores das assinaturas digitais estejam sempre atentos às questões de natureza jurídica e prática em cada caso.
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