Negócios

Family offices brasileiros ainda estão devendo no Venture Capital

Ao contrário dos EUA, family offices nacionais não alocam grande parte de sua carteira em venture capital

Um homem de costas, vestindo terno olhando para diversos gráficos - Startups

Hoje os family offices colocando dinheiro em venture capital não são mais uma novidade no Brasil. Desde que escritórios como a Turim começaram a popularizar por aqui essa tese já presente há muitas décadas em mercados como os EUA, mais e mais players que gerem investimentos para algumas das famílias mais abastadas do país estão olhando para essa classe de ativos. Mas isso não quer dizer que o Brasil não tem seus desafios neste segmento.


Esse foi um dos temas tratados no 2º dia do South Summit Brasil, reunindo representantes da Caravela Capital, Provence Ventures, e da própria Turim. A companhe a cobertura do evento feita pelo Startups aqui.

“O Brasil ainda está bem atrás dos padrões globais de family office”, largou de cara Rodrigo Vieira, sócio da Caravela, durante o painel. Segundo o executivo do fundo, especializado em investimentos early stage, as famílias brasileiras, em média, não alocam muito mais do que 5% ou 6% de sua carteira de investimentos em Venture Capital – nos Estados Unidos, por exemplo, esse percentual chega a ultrapassar os 15%.

Mas então, onde é que o ímpeto por investir empaca? O sócio da Provence, Thomaz Figueiredo, tem as suas teorias. Uma das principais é que se cria um certo desequilíbrio destas famílias investidoras na hora de misturar investimentos via fundos e os aportes diretos.

Segundo dados do levantamento Family Office Brasil 2020, da consultoria INEO, cerca de 38% dos family offices já alocam recursos em investimentos de venture capital, um número abaixo dos investimentos diretos em private equity (55,6%).

“Dependendo deste balanço, a barra do retorno sobre o investimento baixa demais. É preciso comparar os investimentos em ativos e os via fundos, ainda mais em um mercado como o brasileiro, em que retornos podem não ir apenas a zero. Eles vão a negativo”, avalia o executivo.

Para Thomaz, os representantes das famílias sabem que a possibilidade de lucrar – e lucrar bastante – é real, mas alguns medos ainda persistem. Para investir aqui dentro, existe o medo de colocar o dinheiro em alguma roubada. Para investir em negócios promissores no mercado internacional, falta o conhecimento. E colocar altas quantias nas mãos dos fundos pode ser complicado para famílias mais estilo Tio Patinhas, que gostam de manter seu rico dinheiro bem por perto.

Por isso, o papel de Multi-family offices (MFOs) como a Turim e dos fundos está cada vez mais focado em quebrar alguns estes paradigmas, oferecendo a segurança e a liquidez que estes investidores esperam. No caso da Turim, investir em negócios em mercados mais maduros foi uma solução que se mostrou atraente.

“Na nossa experiência, vemos mais family offices atuando em parceria com fundos para investir em startups nos Estados Unidos, por exemplo”, revela Rodrigo Louro, sócio da Turim. Segundo ele, 90% das famílias atendidas pela Turim optam no investimento via fundos e 10% optam por aportes diretos.

“Um padrão saudável é manter cerca de 1% de sua carteira de investimentos em empresas brasileiras – 1,5% se você for muito apaixonado pelo país”, dispara Thomaz.

Para completar, Rodrigo Louro aponta que a carteira de investimentos nacionais da Turim geralmente envolve startups com potencial de escala global. Um exemplo dado por ele mesmo foi o da Fazenda Futuro, em que a Turim entrou junto numa rodada série C de R$ 300 milhões liderada pela Monashees.

O outro lado

Por sua vez, o outro Rodrigo, da Caravela, falou um pouco sobre as razões que muitas famílias buscam uma abordagem mais “hands-on” em suas iniciativas de Venture Capital. Segundo o sócio, os investimentos também são vistos como uma aposta interna.

“É uma solução encontrada por estas famílias para envolver as novas gerações no empreendedorismo”, explica o executivo, apontando que membros das famílias acabam assumindo postos junto às investidas para aprender os “ossos do ofício”.

Outra estratégia, na visão de Thomaz, que também se alinha em parte com a alternativa anterior, é a de famílias que mantém seus investimentos perto do ramo de negócios que faz a sua fortuna. Ou seja, se trata de colocar o Smart Money para trabalhar, na expectativa de retornos não apenas financeiros, mas também para os negócios principais da família.

Não é só assinar o cheque

Independentemente do perfil de investimento, o conselho dos palestrantes é o mesmo: para as famílias, investir em venture capital não é só deixar o cheque. É fundamental ter comprometimento.

“Para [famílias que desejam] colocar dinheiro diretamente em uma startup, é necessário muita disciplina. Não são raros os casos em que founders se criam laços próximos com as famílias investidoras, e acabam criando uma relação quase de dependência”. Para ilustrar isso ele citou situações em que startups receberam aportes de R$ 500 mil, que escalaram rapidamente para R$ 600 mil ou R$ 700 mil sem muito critério.

Para os três painelistas, o alinhamento dos family offices e dos grandes fundos é um dos caminhos mais seguros e que está ganhando cada vez mais adeptos. Aos poucos, mais e mais famílias saem do “investimento amigo” e profissionalizam sua carteira de aportes.

Essa “fome” dos escritórios familiares por dar um upgrade no seu perfil de investimentos chegou a refletir até no mercado de trabalho, gerando uma corrida para atrair talentos mais qualificados para seus times internos, inclusive procurando os fundos de investimento.

“O Brasil tem muitas deficiências no mercado, e muita chance para investir em negócios que resolvam isso. Estar em contato com os fundos ajuda a ter esse conhecimento”, afirma Rodrigo Louro, convidando para a conversa. “Somos um setor acessível, palanque baixo. Queremos mais gente se aproximando e agregando”, finaliza.