Pavlina Tcherneva, Cory Doctorow e Katie Collins no Web Summit 2025 em Lisboa | Foto: Divulgação
Pavlina Tcherneva, Cory Doctorow e Katie Collins no Web Summit 2025 em Lisboa | Foto: Divulgação

Este ano, mais de 60 mil demissões em empresas como Amazon, Target e UPS foram atribuídas a “mudanças causadas pelos avanços em inteligência artificial”. Mas será que o desemprego é uma consequência da tecnologia ou é o objetivo final das corporações? “A IA não é a causa da insegurança no trabalho”, defendeu, durante painel no Web Summit Lisboa 2025, a economista Pavlina Tcherneva, presidente do Levy Economics Institute do Bard College, nos EUA. “O desemprego é uma ferramenta econômica. Por exemplo, uma forma de baixar a inflação é deliberadamente criar desemprego.”

Há duas semanas, a Amazon anunciou a demissão de 14 mil trabalhadores, ou 4% das funções administrativas, enquanto o YouTube adiantou “grandes mudanças na força de trabalho”, citando IA e oferecendo programas de demissão voluntária, enquanto a Salesforce demitiu 4 mil funcionários de apoio e declarou que a IA poderia fazer 50% do trabalho da empresa. “Os donos das empresas estão loucos por qualquer justificativa para mandar gente embora,” afirmou Cory Doctorow. “Ele são capazes de dizer que vão substituir pessoas por IAs – que não são capazes de fazer o trabalho.” 

“Não existe uma escolha entre tecnologia ou empregos. A IA poderia ser usada para resolver problemas sociais e para fortalecer a democracia”, segundo Pavlina. “É importante lembrar que a nostalgia que temos por bons empregos e segurança no trabalho foi uma exceção dentro da história do capitalismo, criada por políticas específicas do pós-guerra,” observou. “E isso mudou a partir dos anos 70.”

Nos EUA, já existem “Ubers para enfermeiros”, alerta Cory, explicando que estes apps permitem avaliar as circunstâncias de cada indivíduo e oferecer valores diferentes para cada um. “Quem garante que eles não vão cruzar essas informações com dados de cartão de crédito, para descobrir quem são os funcionários com muitas dívidas, oferecendo salários mais baixos para os mais desesperados?”

Segundo ele, a tecnologia pode ser usada também a favor dos trabalhadores. “Na Indonésia, cooperativas de entregadores usam apps, conhecidos como Tuyul, para recusar certas entregas e criar condições mínimas de trabalho”, pontuou. No Brasil, existem iniciativas como a StopClub e o app Rebu

“Mas nos EUA isso não é possível por causa das leis de proteção de direitos autorais”, um dos fatores do processo que ele chama de “enshittification” das plataformas. Para o autor, sem uma abordagem séria, que inclua mudanças políticas e de legislação, não será possível resolver a crise do desemprego. “E nós já provamos que isso é possível. Durante o Covid, vários governos implementaram proteções e garantias de emprego que permitiram que a economia desses países se recuperasse rapidamente nos anos seguintes”, concluiu.