Você deve ter ouvido por aí que a Neuralink, startup de tecnologias neurais fundada por Elon Musk, anunciou o seu primeiro implante cerebral bem-sucedido nesta semana. O anúncio foi feito pelo próprio Elon Musk em seu perfil no X, dizendo que o primeiro humano a receber o implante está se recuperando bem.
“Resultados preliminares são promissores na detecção de sinais neurais”, completou o empresário ao falar sobre o primeiro teste humano da tecnologia, chamada “Telepatia”, e que tem como meta ajudar pessoas com deficiência a controlar próteses a partir de estímulos neurais.
O primeiro teste humano veio no rastro da aprovação do Food and Drug Administration (FDA) dos EUA, que no ano passado autorizou a Neuralink a utilizar suas primeiras cobaias humanas, depois de diversos testes em animais.
Apesar da comemoração de Elon Musk, os detalhes sobre como o desenvolvimento das tecnologias da Neuralink será conduzido daqui pra frente ainda são uma incógnita. Mas isso não impede que o assunto vire tema de discussões. Inclusive, no grupo de WhatsApp de leitores do Startups, diversas pessoas deram sua opinião sobre ao responde à à pergunta: “Você colocaria um chip da Neuralink na sua cabeça?”.
As respostas foram as mais variadas possíveis, e, por incrível que pareça, não foram poucos os que já embarcaram no hype da empresa de Elon Musk.
Jamais!
Na enquete feita pelo Startups, que contou com a participação de 91 pessoas, 36% dos respondentes ficaram com os dois pés atrás, afirmando que jamais implatariam um chip da Neuralink na cuca. Os receios quanto a este tipo de tecnologia não são infundados, e desde a criação da startup, em 2017, geram discussão entre usuários e reguladores nos Estados Unidos.
Apesar de ter a aprovação para testes junto à FDA, muitos especialistas do mercado têm suas ressalvas quanto a estratégia da Neuralink, especialmente pelo modus operandi de seu líder Elon Musk, que é de andar mais rápido que muitos processos exigidos dentro da comunidade médica. Por exemplo, outras empresas como a NeuroPace, que fabrica implantes cerebrais para tratar a epilepsia, recebeu a aprovação final da FDA em 2013 – 16 anos após o lançamento da empresa.
Essa pressa também coloca em questão a segurança dos chips. Segundo dados dos testes em animais feitos pela companhia, cerca de 1,5 mil das cobaias morreram em decorrência de defeitos nos dispositivos, o que segundo especialistas médicos, é motivo para preocupação. Musk chegou a responder às acusações, alegando em um post no X que nenhum macaco morreu por conta dos chips, e que macacos “em estado terminal” foram utilizados para minimizar riscos.
“Esta é a abordagem dele nos negócios. Eu apostaria no fato de que este é um grande gesto ousado, em vez de algo meticulosamente elaborado. A questão é que ele tem um enorme exército de apoiadores que podem se voluntariar para esse tipo de coisa e eu acho que isso é muito perigoso quando se trata de enfiar coisas no corpo das pessoas”, afirmou Dean Burnett, pesquisador da Universidade de Cardiff, ao jornal Daily Mail.
Ainda é cedo para dizer
A maior parte dos respondentes estão em linha com o ceticismo dos médicos quanto às novidades da Neuralink. 54% dos leitores ainda estão incertos quanto ao futuro desta tecnologia, acham que ainda é cedo pra dizer se a proposta vai vingar ou não..
Não tem como não dizer que a ideia é fascinante. O dispositivo da Neuralink funciona convertendo a atividade elétrica do cérebro em sinais que um computador pode compreender. O dispositivo é inserido por um cirurgião robótico que opera como uma “máquina de costura”, removendo uma seção do crânio antes de anexar microeletrodos individuais ao cérebro. Esses eletrodos detectam os sinais elétricos em nossos neurônios e os traduzem em controles motores que podem ser usados para operar dispositivos externos.
Em uma postagem no X Musk disse que o dispositivo “permite o controle do seu telefone ou computador e, por meio deles, de quase qualquer dispositivo apenas com o pensamento”. De acordo com o empresário, os principais beneficiados com a tecnologia são pessoas que perderam o uso dos membros. “Imagine se Stephen Hawking pudesse se comunicar mais rápido do que um digitador rápido ou um leiloeiro. Esse é o objetivo”, destacou o bilionário.
Entretanto, entre as dúvidas e as promessas, muitos preferem esperar pelos próximos capítulos. Vale frisar que os testes aprovados pela FDA em maio do ano passado fazem parte de um estudo que deve durar seis anos. “A maioria dessas interfaces requer neurocirurgia invasiva e ainda está em fase experimental, portanto, provavelmente levará muitos anos até que estejam disponíveis ao público geral”, afirmou à BBC Tara Spires-Jones, presidente da the British Neuroscience Association.
Assim que liberarem eu já entro na fila
Do pessoal que respondeu à nossa enquete, 10% já embarcou com tudo no bonde de Elon Musk. Muitos compartilham a confiança no excêntrico empresário, tanto que a Neuralink já ultrapassou os US$ 5 bilhões em valor de mercado.
Só no ano passado, a companhia levantou US$ 323 milhões, a partir de uma rodada série D fechada em agosto e que recebeu uma extensão de US$ 43 milhões em novembro.
Apesar do ceticismo de alguns, outros experts da neurologia acreditam na proposta da startup, que na visão deles está repetindo a receita que Elon Musk aproveitou para a SpaceX: aproveitar pesquisas e projetos já desenvolvidos na área acadêmica e governamental, investir para torná-los mais eficientes do ponto de vista comercial, e prepará-los para o mercado.
Em entrevista à revista Scientific American, John Donoghue, especialista em interfaces cérebro-computador na Brown University, afirmou que Elon investiu no conhecimento criado pela área – e isso pode ter um lado positivo. “Ele pode pegar todo esse conhecimento e investir dinheiro para criar o tipo de produto que pode ser potencialmente comercial, embora isso ainda não seja uma certeza. Estou muito feliz em ver que haverá um produto comercial que um dia alcançará as pessoas e as ajudará”, pontua.
Apesar da empolgação de alguns, vale lembrar de uma coisinha. Por enquanto, a tecnologia da Neuralink tem um foco bem específico – o de ajudar pessoas com dificuldades motoras. Então para quem já está nutrindo fantasias futuristas de que um dia poderá desligar a TV com o cérebro, ou atender uma ligação sem pegar o celular, é melhor tirar o cavalinho da chuva.