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Após rodada com iFood, Shopper detalha estratégia e acelera expansão

Startup conta os bastidores do aporte de R$ 150 milhões e fala sobre os planos de crescimento para o próximo ano

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Shopper
Fábio Rodas Blanco e Bruna Vaz, fundadores da Shopper (Foto: Gabriel Reis/Divulgação)

A rodada de R$ 150 milhões com iFood, GIC e Minerva nunca foi oficialmente anunciada pela Shopper. A operação avançou discretamente enquanto passava pelo crivo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e agora começa a “dar as caras”, evidenciando o novo momento do supermercado digital, que consolida uma parceria construída ao longo de anos e coloca em prática estratégias ambiciosas de crescimento.

“A gente já conversava com o iFood há cerca de cinco anos, pensando em algum dia fazer negócio juntos, mas sem saber qual seria o modelo”, conta o CEO e cofundador da Shopper, Fábio Rodas Blanco, em entrevista ao Startups. Com o ganho de maturidade da startup e o interesse crescente do iFood na categoria mercados, a sinergia enfim se concretizou. “Decidimos fazer essa rodada com eles para expandir nossa área de produção, abrir novos Centros de Distribuição (CDs) e integrar a Shopper ao ecossistema do iFood”, explica Fábio.

Segundo o executivo, a série D foi estruturada para acomodar a entrada do iFood no captable. GIC e Minerva, investidores que já faziam parte do quadro societário, acompanharam a operação com investimentos follow-on.

Ele afirma que, “em breve”, a Shopper estará disponível no app do iFood, permitindo que os clientes façam grandes compras de supermercado para reabastecer a despensa de casa. Um novo centro de distribuição deve ser inaugurado nos próximos meses – o terceiro da empresa, que hoje opera CDs em Osasco e Ribeirão Preto, além de um ponto de apoio em Campinas. A companhia também planeja abrir um novo Fulfillment Center, responsável pela separação e expedição dos pedidos aos clientes.

Com mais de 12 mil Unidades de Manutenção de Estoque (SKUs) ativas, entre itens frescos, refrigerados, congelados, mercearia, limpeza e pet, a Shopper atende mais de 130 cidades do estado de São Paulo, com o suporte de mais de 700 fornecedores. Para garantir eficiência operacional, a startup desenvolveu 10 módulos proprietários que cobrem toda a jornada: desde a previsão de vendas e compra direta com fornecedores, até o sistema de gestão de armazéns (WMS), roteirização de entregas e atendimento no pós-venda.

Fase de expansão

Atualmente, a Shopper opera com três modelos de entrega: Compra Programada (com agendamentos mensais, quinzenais ou semanais para itens não perecíveis); Programada Fresh (voltada a produtos perecíveis – itens refrigerados, congelados e frutas, legumes e verduras – com entregas semanais ou quinzenais); e Compra Única, sem recorrência e com entregas no mesmo dia.

Apesar de a Programada Fresh ser, até agora, a modalidade que mais cresceu, com uma taxa média anual (CAGR) superior a 200% nos últimos quatro anos, a expectativa da startup é que a Compra Única ganhe ainda mais relevância, impulsionada pelo modelo de entrega expressa, em até 2 a 3 horas após o pedido.

O chamado same-day delivery é justamente a grande aposta para 2025. “Lançamos em abril do ano passado e, mesmo sem fazer muito alarde, esse é o modelo que mais vai crescer este ano”, prevê o CEO da Shopper. O serviço já atende grande parte da cidade de São Paulo, além de algumas regiões de Barueri e Ribeirão Preto.

Segundo Fábio, a entrega expressa da Shopper se posiciona de forma diferente do que costuma acontecer no mercado. Em geral, o same-day delivery é utilizado para situações de emergência – quando acaba o detergente, o papel higiênico ou falta um ingrediente essencial para o jantar. Na Shopper, porém, o modelo já vem sendo adotado também para compras de abastecimento. “Estamos falando de, em média, 35 kg por entrega no same-day delivery. São entregas robustas, com várias caixas de produtos, ainda que um pouco menores do que a compra mensal”, destaca.

A Shopper planeja dobrar de tamanho nos próximos 12 meses. Com mais de 1.600 colaboradores atualmente, a meta é superar os 3.000 funcionários até abril de 2026. Segundo Fábio, há cerca de 200 vagas abertas no momento, distribuídas entre Ribeirão Preto, São Paulo e Osasco. As oportunidades abrangem diversas áreas, como tecnologia, marketing, compras e atendimento ao cliente.

Crescimento sustentável

Fábio afirma que, desde 2022, todos os Centros de Distribuição (CDs) da Shopper são autossustentáveis e geram lucro suficiente para financiar o headquarter da empresa. “A partir disso, escolhemos qual será o foco do semestre – investimentos em tecnologia, marketing, entre outros”, destaca.

O crescimento recente, segundo Flávio, foi superior a dois dígitos mesmo nos anos mais difíceis do mercado. “Crescemos mais de 100% em 2020 e 2021, mais de 80% em 2022 e mantivemos esse ritmo em 2023 e 2024”, revela. “Mantivemos um nível saudável nos últimos anos, além de melhorar a unit economics, ampliar as ocasiões de consumo e aumentar as vendas para a base ativa.”

Ele reconhece que a instabilidade e a piora no mercado de capitais impactam a operação. Ainda assim, considera que a Shopper enfrentou esses desafios com cautela. “Quatro anos atrás, já percebíamos que havia uma bolha acontecendo. Muitas startups recém-criadas apresentavam valuations surreais e captavam muito dinheiro. Estávamos atentos, um pouco receosos, e isso nos fez manter um pouco o pé no chão”, analisa.

E a concorrência?

Em maio de 2025, o CEO do iFood, Diego Barreto, revelou ao Startups que cerca de 25% dos pedidos da plataforma já não envolvem restaurantes. Verticais que vão além da alimentação, como supermercados e farmácias, já representam 20% do total. A categoria de mercados cresce, em média, 5% ao mês, enquanto a de farmácia também avança em ritmo acelerado.

Com a entrada da Shopper, o iFood passa a contar com dois grandes supermercados digitais em seu marketplace: a própria Shopper e a Daki. Fábio destaca, no entanto, que as propostas dos players são distintas. “A gente não atua com entrega ultrarrápida, como Daki e Zé Delivery. Esses players não competem com a Shopper”, afirma. 

Ele conta que a principal concorrência é o varejo físico. “O brasileiro ainda abastece sua despensa nos supermercados físicos e deixa o online para compras de emergência”, observa. “O mais difícil é convencer quem nunca comprou online a fazer o primeiro pedido. Mas, normalmente, depois que a pessoa experimenta, tende a continuar com a gente.”

Segundo Fábio, a Shopper mantém um gasto reduzido com marketing e Custo de Aquisição de Cliente (CAC). “É claro que, em alguns momentos, aumentamos o investimento nessas áreas. Mas, considerando o negócio como um todo, ao longo do ano, o percentual de gasto é muito, muito baixo se comparado a outras empresas do setor”, pontua.

Diferentemente da Daki, que já investe em uma linha de produtos de marca própria, a Shopper adota uma abordagem mais cautelosa em relação a essa estratégia. “Ainda não vimos valor”, afirma Fábio. “Temos conversas com uma empresa para um projeto piloto, mas, por enquanto, o ganho de margem, frente ao esforço necessário, nos fez optar por não seguir adiante”, explica.

Ele ressalta que a Shopper só dará esse passo quando o produto de marca própria for realmente melhor do que os que já existem no mercado – ou, ao menos, tão bom quanto, mas com uma margem significativamente maior. “Caso contrário, acaba sendo mais uma distração do que uma entrega de valor. Então, por enquanto, não temos”, conclui Fábio.