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Bitcoin vai chegar a zero em 10 anos, diz Nobel de Economia

Para Eugene Fama, da Universidade de Chicago, as criptomoedas não possuem um valor real, mas desafiam a teoria econômica tradicional

Eugene Fama, prêmio Nobel de Economia em 2013, é considerado o "pai das finanças modernas"
Eugene Fama, prêmio Nobel de Economia em 2013, é considerado o "pai das finanças modernas" | Reprodução/UChicago

As criptomoedas alugaram um triplex na cabeça dos economistas da Universidade de Chicago, conhecida pelo pensamento econômico que defendeu o liberalismo nos anos 50. Mas, em tempos de blockchain, o quanto da teoria monetária tradicional ainda pode ser aplicada aos mercados?

Para Eugene Fama, ganhador do Nobel de Economia em 2013 e considerado o “pai das finanças modernas”, as criptomoedas não possuem um valor real e, em dez anos, o Bitcoin terá seu valor reduzido a zero.

Em conversa com o economista Luigi Zingales e a jornalista Bethany McLean no podcast Capitalisn’t (gostaram do trocadilho?), Gene Fama reconhece a dificuldade de fazer previsões e diz que os modelos econômicos não são uma verdade absoluta.

O Bitcoin passou por uma valorização de quase 50% desde que o presidente Donald Trump foi eleito nos Estados Unidos com uma política pró-cripto. A moeda digital vale hoje mais de US$ 100 mil e há quem diga que pode chegar a US$ 150 mil durante a administração do republicano.

Com mais de US$ 2 trilhões em valor de mercado, o Bitcoin já atingiu o mesmo patamar das Magnificent Seven, as gigantes de tecnologia negociadas nas bolsas de Wall Street. Perguntado se isso poderia significar o início de uma bolha, Gene diz que “espera que sim”.

“Não posso prever quando vai estourar, então espero que vá estourar, mas não posso prever. Espero que isso aconteça porque, caso contrário, teremos que começar tudo de novo com a teoria monetária”, diz.

O economista também explica que é preciso cuidado ao caracterizar bolhas financeiras, o que segundo ele tem sido feito de forma leviana. “Minha definição de uma bolha financeira é muito simples: é algo que tem um fim previsível. Se você não pode prever quando vai terminar, você só está usando essa expressão solta. Eu cancelei a minha assinatura da The Economist porque eles estavam usando essa palavra toda hora sem dizer o que eles querem dizer com isso. Se é tão simples quanto um fim previsível, então eu quero ver você fazer a previsão”.

Luigi então pergunta qual a probabilidade de, em dez anos, o valor do Bitcoin chegar a zero. Gene responde que as chances são próximas de 1, ou seja, têm muita probabilidade de ocorrer. “Mas eu ainda acredito na teoria monetária. Eu posso estar errado”, ressalta.

Qual o problema do Bitcoin?

Mas, afinal, por que o Bitcoin poderia perder o seu valor na próxima década? Luigi e Gene abordam alguns pontos, como a falta de uma instituição global que fiscalize as transações e assegure os pagamentos, gerando mais confiança no mercado. Outro ponto são as flutuações às quais essas moedas estão expostas.

“O problema com todas as criptomoedas é que, para criar um sistema confiável, você basicamente limita a oferta. E quando você limita a oferta, o preço é dirigido apenas pela demanda. Quando a demanda flutua, os preços flutuam loucamente. E porque eles flutuam loucamente, ninguém quer usar como moeda. E é por isso que o movimento, especialmente com o Bitcoin, é dizer que não se trata de uma moeda, mas de ouro digital”, explica Luigi.

Nesse momento, Gene recorre à teoria subjetiva do valor, que determina que o valor de um produto é decidido por quão escasso ou útil ele é para o indivíduo. “Só é ouro digital se tem um uso. Se não tem utilidade, é só papel. Nesse caso, nem papel é. É nada”, afirma o economista, que complementa: “Isso é o que a antiga teoria diz”.

Luigi lembra que, ao longo da História, diversas moedas abstratas foram criadas para representar o valor de algo, e que não necessariamente elas possuem um valor de uso. A discussão chega até as stablecoins, o que Gene reconhece fazer sentido, dado o seu valor real, mas questiona: “Mas se você substituir o dólar no blockchain por uma stablecoin lastreada em dólares, por que não usar apenas dólares? Quero dizer, que problema você está resolvendo aí?”.

“Na verdade, acho que você está resolvendo um enorme problema em garantir que você poderá realizar transações, independentemente do que o governo decida fazer”, defende Luigi, citando um caso em que manifestantes em Ottawa, no Canadá, ficaram impedidos de receber dinheiro de apoiadores durante a pandemia porque estavam protestando contra o governo.

Com o blockchain e as criptomoedas, os bancos perdem poder, diz o economista, o que pode ser tanto positivo, quanto negativo, do ponto de vista social. Isso facilita, por exemplo, crimes como evasão de divisas.

Por fim, Gene Fama é perguntado sobre o que o governo deveria fazer com relação às criptomoedas, se esse mercado deveria ser regulado ou se a teoria do livre mercado continua valendo neste caso. O economista pondera que, caso haja, de fato, uma bolha, os investidores de cripto que perderem seu dinheiro quando a bolha explodir acabarão recorrendo ao governo para evitar uma falência.

“Então, se você é um libertário, como eu sou, você diz que o governo nunca deveria fazer nada. Mas se o governo vai fazer algo depois do fato, então você tem que resolver o problema de trás para frente e decidir o que vai fazer antes do fato para minimizar o custo de fazer isso. E não sei o que é isso neste momento. Isso significa que você deve começar a impor regras sobre o Bitcoin e como ele é negociado? Talvez essa seja a direção que você terá que seguir”, diz.