Ao longo de 2024, as gigantes da tecnologia investiram mais de US$ 120 bilhões para construir a infraestrutura de seus serviços de inteligência artificial. Isso é de três a quatro vezes do mais que elas aplicaram ano passado, e é uma base para o que ainda está por vir. E uma bolha pode estar em formação. “Podemos não estar em uma agora. Mas isso é inevitável para algo tão grande”, avalia Benedict Evans em entrevista ao Startups.
Para ele, a dispendiosa corrida das Big Techs se justifica pela avaliação de que é melhor gastar agora em uma infraestrutura que pode ser utilizado para alguma outra coisa no futuro, do que correr o risco de ser superada por um concorrente. “Se você não investe e isso se torna a plataforma dominante, o prejuízo é muito maior do que você adiantar um investimento (Capex) e estrutura ficar menos utilizada por dois ou três anos caso as projeções não se concretizem, acrescentou ele. Em sua primeira visita ao Brasil, Evans participou do Forward, evento promovido pela Oxygea no Cubo.
Evans destacou que os gastos são crescentes porque esse é o entendimento que se tem, no momento, sobre como os grandes modelos de linguagem natural evoluem. A teoria, baseada no que se aprendeu até agora, é que, com mais e mais dados e mais poder computacional, o modelo fica melhor. “A pergunta agora é: chegamos até aqui fazendo os modelos maiores e maiores. O que acontece se continuarmos a torná-los maiores. E a resposta é que não sabemos”, disse.
Segundo ele, ainda não existem modelos teóricos que explicam por que os LLMs entregam os resultados que entregam, e quais seriam os efeitos de torná-los maiores. “A avaliação é que cada vez que escalamos nos últimos cinco anos tivemos melhores resultados. Por que parar agora? Então parece que vale a pena tentar descobrir”, pontuou.
Ben faz um breve retrospecto da tecnologia de inteligência artificial lembrando que há uma década, o machine learning conseguiu transformar problemas de lógica em questões estatísticas. Assim, uma máquina passou a encontrar um gato em uma foto não porque ela sabe, como um ser humano, o que é um gato. Mas porque ela foi ensinada a detectar características do que é esse animal. E fazer isso melhor e para mais coisas exige mais e mais dados.
Com os modelos ficando maiores, mais complexos e exigindo mais poder computacional, as gigantes da tecnologia perceberam que suas infraestruturas não estavam preparadas para atender a demanda dos clientes a custos eficientes. Por isso a necessidade de construir grandes centros de dados que podem fazer o processamento mais barato.
Bolha da inteligência artificial?
Na avaliação de Evans, os pesados investimentos em inteligência artificial podem sim estar formando uma bolha. “Quando eu vejo banqueiros falando que têm tantos projetos de centros de dados que eles não conseguem dar conta, eu penso que a gente já viu esse filme antes”, ressaltou.
Como resposta à sugestão de uma bolha, a resposta sempre costuma ser que dessa vez é diferente. E de fato, cada momento tem suas características únicas. O problema, na avaliação de Evans, é que isso leva a argumentação de que, sendo uma mudança fundamental, com bases econômicas diferentes, o crescimento será eterno. “As pessoas param de questionar e de perceber que as coisas não funcionam direito. Pelo menos ainda”, argumentou. É isso que costuma acontecer em novos ciclos tecnológicos. E é aí que mora o perigo.
Isso não quer dizer, entretanto, que a bolha da inteligência artificial não deixará um futuro em que a IA será uma importante da sociedade. “Isso aconteceu com as ferrovias, aconteceu no século XIX. Muito do crescimento do mercado nos anos 1920 foi puxado pelo setor elétrico. E tivemos a bolha das ações da internet. Depois nas ações de fabricantes de celulares e das empresas de banda larga. E depois percebemos que a internet e os celulares eram uma boa ideia”, relembrou.
Ben reforça a análise com um comentário de seu antigo chefe, Marc Andreessen. Para o fundador da Netscape e da gestora a16z, qualquer projeto que falhou no fim dos anos 1990 pode dar certo na internet de hoje. “Talvez não exatamente todos. Mas quando você tem três quartos da população online com banda larga, coisas que não funcionaram podem funcionar”, pontuou.
Mas ele faz um alerta importante: uma coisa pode ser importante e ser uma bolha. Mas nem tudo que é uma bolha é importante. “Não funciona das duas formas”, brincou.
Forward
Em sua segunda edição, o Forward da Oxygea teve 478 ingressos vendidos. Os valores arrecadados foram destinados ao ecossistema de inovação de Porto Alegre, que foi duramente atingido pelas enchentes de maio.
O Forward foi organizado pela Oxygea, Cubo Itaú, Innoscience, MIT Sloan Review Brazil, Instituto Caldeira e a Touchdown Ventures. O evento também teve apoio da ABVCAP, Ambev, APTK, AWS, Emerge, Endeavor, Monking, Onono, Plug and Play São Paulo e RV Ventures.