Quando estreou no mercado em 2019, a Onfly nem imaginava o quanto teria que se readaptar para não fechar as portas pouco tempo depois. Fundada por Marcelo Linhares e Elvis Soares, a startup mineira nasceu como uma plataforma de gestão de viagens e despesas corporativas e no primeiro ano de existência registrou mais 1.200 reservas de hotéis, 5 mil bilhetes aéreos emitidos, 2.500 empresas cadastradas e 500 atendidas, segundo um post no blog da empresa.
No ano seguinte, porém, o negócio virou de cabeça para baixo. Com a pandemia e as restrições no setor de viagem e turismo, a startup viu seu volume transacionado despencar de R$ 1,7 milhão em fevereiro de 2020 para R$ 14 mil em abril do mesmo ano. A receita caiu para cerca de 0,3% ao que era antes e a companhia, que crescia com recursos próprios, teve que repensar as operações.
Em novembro de 2019, eram 19 pessoas na equipe. Mas a startup teve que cortar praticamente todo o time, deixando apenas os sócios e 4 pessoas na área de tecnologia. “Desligamos os funcionários, ajudamos todos a se recolocarem no mercado e ficamos com uma operação enxuta”, afirma Marcelo, presidente da Onfly, em entrevista ao Startups. A decisão de manter alguns colaboradores tech foi tomada na expectativa de que, com a retomada, o investimento interno em pesquisa e desenvolvimento da plataforma se tornasse um diferencial no mercado.
Até então, a Onfly atendia majoritariamente empresas de tecnologia, que representavam 90% da base de clientes. “É um perfil de cliente muito receptível, que gosta de testar soluções novas e de propostas mais self-service”, diz o executivo. Contudo, os entusiastas de tecnologia, ressalta Marcelo, rapidamente se adaptaram ao modelo remoto, adotando reuniões virtuais e reduzindo significativamente as viagens a trabalho. “Já os outros 10% do portfólio, formado por empresas de saúde, consultoria, entre outros, continuavam viajando e vimos a necessidade de acessar novos mercados”, pontua.
Repensando o negócio
Nos últimos 2 anos, o lema da startup tem sido: enquanto tem avião no ar, tem negócio para a Onfly. A companhia decidiu montar uma máquina especializada para atender outros segmentos, mas aí veio outro desafio. Diferentemente de empresas de tecnologia, outros setores ainda não tinham uma maturidade digital tão forte. “Havia certa dificuldade para usar a plataforma, entender a tecnologia e dar autonomia para os colaboradores”, analisa Marcelo.
Felizmente, a pandemia trouxe vantagens nesse sentido, estimulando a transformação digital de pessoas e empresas. Uma recente pesquisa do fundo Atlantico revela que o surto de Covid-19 acelerou a transformação digital em 3 anos na América Latina. “Tudo mudou. As companhias começaram a se digitalizar, inovar, reduzir custo e aumentar a produtividade. Nesse sentido, acabamos nos beneficiando, porque setores que não estavam olhando para a digitalização começaram a novs procurar”, afirma Marcelo.
A estratégia deu certo – tanto que atraiu a Cedro Capital para o negócio. Em janeiro de 2021, a gestora sediada em Brasília anunciou que havia investido R$ 2 milhões na traveltech. Na época, Alessandro Machado, sócio e diretor da Cedro Capital, disse que a Onfly já havia chamado a atenção em 2019 com seu posicionamento de mercado, qualidade da plataforma e competitividade de preços. “Quando veio a pandemia, percebemos a aceleração da digitalização dos serviços em vários setores e então focamos na oportunidade. Quando as viagens corporativas retomarem ao estado normal, as empresas voltarão mais digitais do que nunca e a Onfly está pronta”, avaliou Alessandro, em nota.
Com o investimento, a Onfly conseguiu o gás adicional que precisava para se reestruturar. Este ano, a startup lançou um cartão de crédito para acabar com os reembolsos de despesas de viagens. A solução inclui também uma conta digital e serviço de gestão, permitindo maior controle das despesas de viagens com visualização em tempo real dos pagamentos efetuados. A companhia também retomou as contratações, fechando 2021 com cerca de 40 colaboradores. Hoje, o time já gira em torno de 107 pessoas, com previsão de chegar a 120 até dezembro.
Além da Cedro Capital, a Onfly conta com o apoio da Endeavor Brasil, rede que apoia empreendedores que aceleram o crescimento do país. A travel tech acaba de ser selecionada para a 2ª edição do programa Scale-Up e durante 5 meses receberá consultorias individuais e coletivas de mentores com foco em crescimento e escalabilidade. “Aplicamos para a Endeavor 5 vezes até sermos selecionados, porque temos uma grande admiração pela rede”, conta Marcelo. Ele destaca as experiências de networking, troca de conhecimento e parcerias para gerar novas oportunidades de negócio.
Próximos passos
Marcelo diz já estar conversando com fundos de investimento para uma próxima rodada, que deve ser concluída no ano que vem. “O mercado de turismo B2C já está completamente digitalizado, com sites como Decolar, ViajaNet, e das próprias companhias aéreas. Mas o B2B não acompanhou essa digitalização. Queremos ser para as empresas o que a Decolar é para os consumidores”, afirma o executivo.
Vale lembrar que a própria ViajaNet não saiu ilesa da crise dos últimos anos. A companhia foi adquiria pela Decolar em maio, por US$ 15 milhões. Em dezembro/20 o Startups noticiou que companhia tinha feito uma captação de US$ 6,5 milhões dois meses antes para reforçar o caixa para enfrentar as dificuldades trazidas pela pandemia. A injeção de recursos veio dos investidores da época pela dificuldade de se engajar com novos nomes diante do cenário trazido pela pandemia.
Além da sede em Belo Horizonte, a Onfly tem um base em São Paulo, no Cubo Itaú. Hoje a companhia opera no break-even (sem lucros, nem prejuízos) e atende cerca de 600 clientes. Segundo Marcelo, em agosto a traveltech movimentou R$ 21 milhões em volume transacionado e projeta crescer 5 vezes em relação a 2021.
Ele afirma que o novo aporte virá para acelerar os negócios, mas não por uma questão de sobrevivência. Para 2023, a meta é dobrar de tamanho comparado a 2022 e continuar evoluindo o produto com aprimoramentos na tecnologia. “Mapeamos que 50 mil empresas são potenciais clientes da Onfly e hoje não temos 2% do mercado. Tem um desafio forte de gestão e posicionamento de marca, marketing e vendas para continuar escalando”, pontua.
A rodada virá justamente para isso, com possibilidades também de iniciar uma estratégia de M&A. A Onfly já está de olho no mercado e mapeando oportunidades há cerca de 6 meses e pode fechar a primeira aquisição em breve. “Olhamos para segmentos que tenham complementariedade com o nosso negócio. Estamos avaliando e se captarmos uma grana conseguimos concretizar essa estratégia”, conclui o executivo.