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Com inovação, GreenV tenta destravar gargalos para carros elétricos

Criada em março de 2018, a companhia tem 1,5 mil postos de recarga EVs pelo Brasil e tem como parcerias as montadoras Porsche e BMW

Com inovação, GreenV tenta destravar gargalos para carros elétricos

Mais do que uma tendência para os próximos anos, os carros elétricos já são uma realidade. Por operarem a partir de baterias recarregáveis, de energia renovável, os EVs são hoje um dos queridinhos quando o assunto é encontrar alternativas menos poluentes do que os carros convencionais. 

Não é à toa que o bilionário Elon Musk se tornou uma das pessoas mais ricas do mundo e a Tesla -que não foi fundada por ela, diga-se de passagem – foi a 1ª montadora da história a atingir a marca de US$ 1 trilhão de valor de mercado, valendo muito mais do que todas as suas concorrentes juntas. A fabricante vendeu quase 70% de todos os carros elétricos nos EUA em 2021, com 194.165 unidades emplacadas até agosto, de acordo com a Experian.

O Brasil acompanha a tendência. Em 2020, houve um aumento de 66,5% nas vendas de modelos eletrificados no país, em relação ao ano anterior, segundo a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE). A previsão é que este número cresça ainda mais no próximo ano, à medida que empresas e pessoas adotem práticas mais sustentáveis de olho na preservação do planeta.

É nesse contexto que surge a GreenV, startup que desenvolve soluções inteligentes de mobilidade elétrica. Criada em março de 2018 por Junior Miranda, a mobilitytech tem 1,5 mil postos de recarga EVs pelo Brasil e tem como parceria com as montadoras Porsche e BMW.

Ainda em estágio inicial de amadurecimento, a companhia recebeu um aporte de R$ 22 milhões em setembro de um fundo norte-americano cuja identidade não foi divulgada. Os recursos serão utilizados para ampliar os postos de recarga pelo país e desenvolver novas soluções para frotas, montadoras, concessionárias e veículos pessoais.

Junior Miranda, fundador da GreenV

Como tudo começou

Junior é engenheiro por formação, graduado pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), mas, contrariando a velha rixa humanas vs exatas, atuou na área de marketing durante 10 anos. “Durante todo esse período tive vontade de empreender, tendo a tecnologia como o DNA de um futuro negócio”, diz.

A virada aconteceu em 2011, quando fundou a AZ HOME, empresa de automação residencial e predial com soluções de câmeras de segurança, fechaduras biométricas e digitais, alarmes, sistemas de sonorização, entre outros. O contato com o tema da sustentabilidade veio 2 anos depois, quando a companhia lançou produtos para aumentar a eficiência energética, como placas fotovoltaicas, torres eólicas e – a grande sacada – carregadores de carros elétricos.

“Lançar o braço de sustentabilidade foi um divisor de águas”, comenta Junior. O movimento foi tão significativo que para escalar os negócios o empreendedor decidiu criar a marca AZ Energy, com foco na promoção da sustentabilidade por meio da tecnologia.

A empresa começou com o pé direito. Em 2014, ficou responsável por lançar os veículos elétricos i3 e i8 da BMW no Brasil e eletrificar todas as concessionárias BMWi. Depois, vieram contratos com a EnelX para lançar o Nissan Leaf (2019) e com a locadora de veículos Movida, para implementar os pontos de recarga para a frota elétrica da companhia. 

“Com o tempo, percebemos que, em termos de eletromobilidade, o mercado precisava de mais coisas além da a eletrificação e da instalação de carregadores”, diz Junior. A inquietação fez com que o empreendedor buscasse a aceleradora 10X Digital, do empreendedor Mauro Amaral Jr, para criar um spin-off da AZ Energy dando origem à GreenV, fundada com o apoio do empreendedor Marcos Nogueira.

“Uma companhia que assume o legado da AZ Energy com a instalação de carregadores, mas expande os negócios como um hub de mobilidade”, diz Junior

Criada em março de 2018 a partir da empresa-mãe, a mobilitytech ficou responsável por lançar o veículo Porsche Taycan e eletrificar todas as suas concessionárias. O modelo já é o mais vendido na categoria 100% elétrico no Brasil em 2021, de acordo com a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE).

Mais inovação

A GreenV não pretende pisar no freio. Com o caixa reforçado, a startup quer aumentar o portfólio de produtos e serviços, criando pelo menos 70 inovações até 2025. A primeira delas é um aplicativo mobile que indica onde estão os pontos de recarga para veículos elétricos da marca. O app deve ser lançado ainda este ano e, com o tempo, ganhará novas funcionalidades. 

“Um dos recursos será uma espécie de Uber com profissionais de elétrica”, antecipa o fundador da GreenV. Com a ferramenta, o cliente que precisar instalar um carregador poderá solicitar o serviço e, instantaneamente, encontrar profissionais disponíveis para o serviço e próximos geograficamente. Segundo o executivo, a rede de colaboradores recebe treinamentos e certificações para garantir o melhor serviço aos clientes.

Também está nos planos um carregador wireless para veículos elétricos e a possibilidade de integrar as funcionalidades do app dentro do carro. “O motorista poderá acessar todas as funcionalidades, inclusive buscar os pontos de recarga, sem precisar abrir o celular enquanto dirige.”

Outra novidade é o hardware IoT conectado ao carregador. “Hoje, a maioria dos aparelhos disponíveis no mercado são do tipo dumb chargers (carregadores burros), porque eles só carregam”, diz Junior. Já os inteligentes funcionam como um mini cérebro. Não só ligam e desligam o carregador, como também fazem a leitura de medições de corrente, tensão e potência, reunindo todas as informações na nuvem para otimizar a gestão.

“Sabemos que há uma necessidade latente por ensino de eletromobilidade. Então, vamos lançar a GreenV Academy”, anuncia o empreendedor, em referência a uma escola com cursos técnicos e teóricos sobre o mercado. A ideia é compartilhar informações sobre transição energética e desenvolvimento do setor no Brasil, além de capacitar aqueles que queiram prestar serviços na área. 

No médio prazo, a intenção é levar as operações para fora do país. A GreenV já instalou um de seus carregadores no Paraguai e, a partir do ano que vem, deve começar a explorar outros lugares da América latina. “O software é escalável, o que facilita o processo. Já estamos conversando com outras montadoras para executar o plano”, diz Junior.

Crise energética

Falar de crise energética no Brasil não é uma novidade, causada, em grande parte, pela alta dependência (cerca de 65,2%, segundo relatório de 2020 do Ministério de Minas e Energia em parceria com a Empresa de Pesquisa Energética) que temos das hidrelétricas. De um lado, vantagens: o uso de recursos naturais e a redução das emissões de gases poluentes.

Do outro, desafios: uma forma de gerar energia que está à mercê das mudanças climáticas, refletidas na falta de chuvas e baixa no nível dos reservatórios. Com o risco de apagões e racionamento no fornecimento de eletricidade, fica a dúvida se o país está pronto para suportar o aumento dos EVs, que aumentarão a demanda por eletricidade. 

“Todo ano temos, em algum nível, uma crise energética, por causa da baixa dos reservatórios. No entanto, isso não é algo perene”, argumenta Junior. O empreendedor explica que o investimento nos EVs vem acompanhado do aumento da energia solar fotovoltaica, gerada pela conversão da luz em eletricidade.

A adesão à energia solar cresceu 44,3% no primeiro semestre de 2021, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).como uma alternativa à crise hídrica e aos reajustes na conta de luz. A GreenV enxerga o movimento como uma evolução saudável para o setor, com novas oportunidades de geração de energia.

“Se o Brasil transformasse hoje toda a sua frota de 50 milhões de veículos em carros 100% elétricos, teríamos um impacto de 3% a 8% na demanda de energia, uma porcentagem muito pequena”, diz Junior. A questão é que a mudança não será de uma única vez. É um processo gradual e de longo prazo, com previsão de acontecer apenas em 2030 ou 2040, quando a situação do país já não será a mesma e alternativas às hidrelétricas devem continuar se fortalecendo. “Tudo isso indica que estamos sim preparados para suportar a evolução dos carros elétricos.”