A Razor, fabricante brasileira de máquinas de alta performance, concluiu recentemente sua rodada de crowdfunding na plataforma Kria. A oferta movimentou R$ 4,4 milhões de 487 investidores que se interessaram em financiar os planos da companhia de ingressar em novos mercados, como o de notebooks, e aprimorar seus processos internos.
“Acho sensacional ter tido tantos investidores acreditando no sonho da Razor, ainda mais considerando que o investimento mínimo era alto, de R$ 5 mil”, avalia Grégory Reichert, que cofundou a empresa ao lado do irmão André. Embora esteja orgulhoso do resultado, o executivo reconhece que o processo para chegar até ele não foi nada fácil.
Depois de levantar R$ 1,8 milhão em cerca de 30 dias no crowdfunding de 2020, o executivo esperava que a próxima rodada também fosse concluída em um prazo semelhante. No entanto, o processo levou quase 120 dias a mais do que o previsto, estendendo-se de novembro de 2021 a maio de 2022.
“A taxa Selic influenciou muito”, observa Grégory. Os reajustes feitos pelo Banco Central elevaram o indicador de 9,25% em dezembro/21 para 12,75% em maio/22. “Isso criou uma maior aversão ao risco, porque os investidores não queriam apostar em projetos que não tivessem um retorno rápido”, explica o fundador. Ele pontua que o cenário se intensificou com a Guerra na Ucrânia e o aumento da inflação no Brasil.
O atraso na captação atrapalhou os planos – e as metas dos fundadores. A expectativa era captar R$ 5 milhões, mas as regras do crowdfunding exigiam um teto de captação com prazo máximo de 180 dias. “Se a gente deixasse a oferta aberta por mais tempo, sei que conseguiríamos chegar na meta. Mas não dava para apertar mais”, explica Grégory.
Fundada em 2014 no interior do Rio Grande do Sul, a Razor desenvolve workstations para profissionais que trabalham com softwares exigentes e precisam de máquinas com forte poder de processamento e capacidade gráfica. Com uma fábrica de 1.000 metros quadrados, localizada em Passo Fundo, e capacidade produtiva de 25.000 máquinas por ano, hoje a Razor atende grandes clientes como Hospital Albert Einstein, Petrobras, Itaipu, USP, SAP, SBT e TV Globo.
Hardware não atrai?
Questionado sobre por que decidiram captar pela modalidade de equity crowdfunding, Grégory admite que “tem um lado mais bonito e o lado verdadeiro”. Primeiro é a questão da comunidade de investidores engajados a fazer a Razor crescer. “É do interesse deles alavancar a empresa, então o pessoal ajuda, tem contatos e nos conecta a potenciais clientes.”
Ainda que reconheça a importância da comunidade de investidores, ele revela o fator real por atrás da decisão. “Não encontramos outras formas. Buscamos de mais de 170 fundos no Brasil e não avançamos com nenhum para conseguir o financiamento”, afirma. Segundo Grégory, o hardware não é tão charmoso aos olhos do investidor quanto um software ou uma solução cloud.
“A jornada de hardware no Brasil é bem ingrata, porque parece algo velho, antigo. O mercado quer investir em inovação desde que seja um software as a service B2B. Querem investir mais no que já está testado e sabem que vai dar certo, ao invés de coisas tão tangíveis quanto indústria e hardware. Já o software é a menina dos olhos do momento.”
Ele até entende os motivos: o software é mais escalável e fácil de replicar. Por outro lado, afirma que esse modelo é também muito mais frágil. “Alguém pode copiar o que você fez, colocar em um ecossistema muito maior e, assim, o seu software não serve mais do dia para a noite. Com o hardware, isso é mais difícil de acontecer.”
Segundo Grégory, é difícil vender a tese da Razor no Brasil porque ainda não tem outros players parecidos. “As pessoas comparam com a Positivo ou a Multilaser, mas essas empresas não têm nada a ver com o que a gente faz. Não são focadas em máquinas premium e computadores de alta performance. É difícil quando não tem as referências”, pontua.
Internacionalmente, a Razor enfrenta gigantes da tecnologia como a Dell, Lenovo, HP e Apple, mas diz ainda não estar pronta para falar com os fundos internacionais. Grégory argumenta que a startup ainda não está madura o suficiente, e que precisa alcançar um porte maior para se tornar atrativa fora do país. A startup fatura hoje R$ 20 milhões reais – o que, para o empreendedor, é um número bom, mas muito pequeno quando convertido em dólar (cerca de US$ 4 milhões).
Próximos passos
Um dos principais desafios da Razor é reduzir o tempo de entrega das máquinas. Hoje são pelo menos 70 dias para o computador chegar nas mãos do cliente. Outra questão é que poucas formas de pagamento estão disponíveis. Os computadores têm preços elevados, em torno de R$ 20 mil e R$ 30 mil cada, mas os clientes normalmente precisam pagar à vista ou em até 12 vezes com acréscimo no valor final.
Segundo Grégory, esses problemas fazem com que a empresa perca quase 98% das oportunidades de venda. A startup vai usar o dinheiro da captação para otimizar a produção e acelerar os envios, além de criar a Razor Banking, com soluções de crédito para financiamento de clientes B2B e enterprise.
A companhia também quer lançar um braço de assinaturas. “O cliente recém-formado, por exemplo, precisa de uma máquina para trabalhar não vai ter o dinheiro para pagar à vista, e mesmo as parcelas acabam saindo caras. Mas se ele pagar R$ 300 – R$ 400 por mês para alugar os computadores, tem a chance de já começar a trabalhar e juntar dinheiro para um dia comprar a sua própria máquina”, explica Grégory. O serviço de assinaturas pode aliviar os bolsos de pequenas empresas e pessoas físicas no geral, além de melhorar o fluxo de caixa e gerar recorrência para a Razor.
Com o crowdfunding a Razor tem dinheiro para operar sem sufoco até o fim de 2022. Por isso, uma nova rodada deve ser estruturada no segundo semestre. Pelas contas de Grégory, o aporte deve ser uma série A, entre R$ 10 milhões e R$ 20 milhões. O executivo espera que, dessa vez, a proposta atraia fundos institucionais, já que a companhia começou a sair na mídia e agora tem o apoio de outros investidores.
“Além disso, a Razor estará mais madura como empresa e terá os resultados dos 2 crowdfundings para mostrar durante as negociações”, pontua o diretor. Segundo Grégory, este ano a startup intensificou as contratações e contratou mais 15 pessoas para o time para sustentar a demanda. A expectativa é dobrar de tamanho e fechar 2022 com um faturamento na faixa dos R$ 40 milhões.