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Dealflow: Com fundo de R$ 300 mi, SP Ventures mira AgFoodtechs latinas

Segundo a gestora, o surgimento de unicórnios brasileiros do agro é apenas uma questão de tempo

Dealflow: Com fundo de R$ 300 mi, SP Ventures mira AgFoodtechs latinas

Apesar do cenário conturbado do venture capital no mundo, a gestora brasileira SP Ventures se prepara para aumentar os investimentos em startups early-stage focadas no agronegócio ainda em 2022. Com cerca de R$ 300 milhões em seu fundo AgVentures 2, a companhia projeta fazer de 7 a 10 aportes até o fim do ano.

Fundada em 2007 pelo empreendedor Francisco Jardim, a SP Ventures começou como responsável pela operação em São Paulo do fundo Criatec, capitalizado pelo BNDESPar. O negócio nasceu com uma tese generalista, investindo em empresas de todos os setores com base no tamanho de mercado, diferencial tecnológico, potencial de crescimento e vantagens competitivas. Para a surpresa do executivo, das 8 empresas selecionadas, metade era de agro.

Foi quando o setor começou a chamar a atenção de Francisco. Ao mesmo tempo, o executivo estava cada vez mais incomodado de tomar decisões de investimento sem um viés específico. “Era almoço com healthtechs e jantar com fintechs, o que deixava as conversas muito rasas. Não conseguíamos ajudar o empreendedor estrategicamente, da forma que eu queria, porque não aprofundávamos as discussões. Então decidimos nos especializar”, pontua.

A mudança foi gradual. No Criatec 1, a projeção era ter de 10% a 20% das startups de agro, mas por causa do potencial das empresas o número chegou a 50%. Em 2014, quando a SP Ventures captou seu primeiro fundo próprio, de R$ 105 milhões, 80% dos investimentos foram para o agro. Já o AgVentures 2, de R$ 300 milhões, foi fechado no fim do ano passado com uma tese exclusiva para agtechs. A gestora contratou um time especializado para escalar as investidas e ajudá-las a tomar decisões, encontrar talentos, acessar canais de venda e clientes de forma recorrente. 

Segundo Felipe Romano, associado da SP Ventures, a especialização trouxe como oportunidade a expansão para a América Latina. “Provavelmente um fundo pequeno e  generalista no Brasil não conseguiria achar boas oportunidades no continente. Sendo 100% agronegócio, empresas do setor que estão fora do país começam a nos enxergar como um parceiro valioso para as ajudarem a expandir para o Brasil, principal país da região”, pontua.

As foodtechs fazem parte da tese, uma vez que impactam o mercado principal. “A cadeia do agro é muito integrada, da produção ao fertilizante, do campo ao consumidor”, afirma Francisco. O executivo cita 3 tendências que prometem transformar a cadeia do agro: a demanda dos consumidores por sustentabilidade, sáude e bem-estar animal.

“Se não investirmos no final da cadeia teremos um ponto cego. Por isso, estamos incluindo cada vez mais food no portfólio.” Uma das empresas investidas pelo fundo neste setor é a Frizata, foodtech argentina que vende alimentos congelados e chegou no Brasil em 2021, graças a uma série A de R$ 25 milhões liderada pela SP Ventures.

Rumo aos unicórnios

O agro no Brasil é responsável por quase 30% do PIB, diz Francisco. Segundo o investidor, o setor envolve uma cadeia muito grande que inclui, além da produção, a parte de financiamento, cadeia de insumos e distribuição dos alimentos.

“Em um planeta que tem 7 bilhões de pessoas e pode passar para 10 bilhões em 2050, a produção vai ter que aumentar. Isso vai acontecer em um ambiente mais desafiador, no qual a mudança climática torna a atividade agrícola cada vez mais complexa e arriscada. Para gerenciar tudo isso, o mercado vai precisar de mais tecnologia”, argumenta.

O ecossitema de inovação já começou a se movimentar nesse sentido. Segundo a SP Ventures, os investimentos em AgFoodtechs na América Latina saltaram de US$ 34 milhões para US$ 116 milhões entre 2016 e 2021. Apesar do aumento dos aportes e de o Brasil ser potência agrícola, o país ainda não tem um unicórnio agro. “É um setor de maturidade lenta, porque a validação do produto é feita pelo prazo da safra, passando por 2 ou 3 ciclos até estar realmente validado”, explica. 

Além de ter um ciclo de inovação e desenvolvimento mais longo, Francisco explica que o agro demanda forte especialização por parte dos investidores. “Acho que eles preferiram entrar em áreas mais conhecidas ao invés de estudar um novo segmento que estava mais distante de suas realidades”, considera. “Negócios escaláveis precisam de infraestrutura e conectividade, que chegaram depois no campo. A pandemia acelerou a digitalização dos produtores rurais”, completa.

A gestora está confiante de que o primeiro unicórnio brasileiro do agro já nasceu, e é só uma questão de tempo para alcançar o valuation de US$ 1 bilhão. “Estamos bem confiantes de que seja alguém do nosso portfólio, porque temos empresas que fizeram grandes rodadas e estão bem avaliadas”, aposta o associado do fundo, Felipe Romano.

Felipe cita a Agrolend, de concessão de crédito para pequenos e médios produtores, que levantou R$ 120 milhões com Valor Capital Group, SP Ventures e outros investidores, como uma das referências do setor. Outro exemplo é a Traive, plataforma que conecta a cadeia agrícola ao mercado de capitais, recebeu US$ 17 milhões no fim de 2021 em um round coliderado por SP Ventures e Astella Investimentos.

“Há grandes oportunidades para empresas de soluções financeiras para o agro, já que o setor se tornou intensivo em capital de giro, com enormes dificuldades de acessar os riscos e levar o dinheiro para o produtor”, pontua Francisco.

Além das agfintechs, a gestora está de olho em marketplaces, produtoras de fertilizantes biológicos e climatechs que ajudem a reduzir as mudanças climáticas que afetam diretamente a produção do campo. “Há oportunidades em toda a cadeia. O setor precisa dar um salto em tecnologia, com soluções de computação na nuvem, soluções mobile e sensoriamento remoto”, explica.

Francisco Jardim, fundador da SP Ventures
Francisco Jardim, fundador da SP Ventures
Foto: Divulgação/Sérgio Lima/Isto É Rural

Crescendo na crise

O principal objetivo da SP Ventures, segundo seu fundador, é oferecer às startups uma proposta de valor que vá além do capital financeiro. O fundo baseia-se em 4 pilares: acesso a talentos, conhecimento estratégico, amplo networking e conexão com os investidores. 

“Construímos elos de relacionamento com grandes fazendeiros, canais de distribuição e investidores que possuem expertise no mercado e dão suporte às empresas”, afirma Francisco. Ele acrescenta que a gestora se preocupa em realmente ouvir a dor dos parceiros e transmitir a lições de cada negócio para o restante do portfólio, evitando que outras empresas cometam os mesmos erros.

A companhia fez 7 deals em 2021 e hoje conta com 29 empresas no total – sendo 12 do último fundo. A nova captação reúne investidores como Banco do Brasil, BB Seguridade e a norueguesa Yara, uma das maiores produtoras de fertilizantes do mundo. O investimento mais recente foi o aporte de R$ 9 milhões na Decoy, anunciado em abril.

Em tese, cerca de 10 investimentos devem ser concluídos em 2022. Porém, Francisco diz que o número de novas investidas deve ser maior. “O importante é não deixar uma boa oportunidade passar”, comenta. Segundo o empreendedor, a gestora está tocando 3 aportes no momento, a serem anunciados nos próximos 3 meses.

Olhando de fora, esse pode não ser o momento ideal para acelerar o ritmo dos investimentos, devido à combinação de juros altos, instabilidade política, guerra e incertezas diversas. No entanto, o executivo afirma que o setor tem se mostrado “extremamente resiliente nos últimos anos”. “É um setor que performa bem quando o ambiente macroeconômico vai mal”, afirma.

Isso acontece por alguns fatores. Primeiro, porque a receita do agro é em dólar. Assim, quando a moeda norte-americana valoriza, a receita do produtor e a cadeia como um todo aumentam. Além disso, Francisco destaca que o agro trabalha com um produto de demanda inelástica – as pessoas fazem outros cortes antes de diminuir o consumo de alimentos. “A partir de 2020, nossos produtores mostraram que mesmo com o colapso das cadeias de suprimento global, o mundo podia contar com eles como provedor de alimentos”, afirma.

Por esses motivos, quando estourou a guerra Russo-Ucraniana, a SP Ventures não se preocupou tanto com os negócios. Segundo o empreendedor, a crise deixou o cenário ainda mais positivo para as agtechs. “Com a ameaça de abastecimento de fertilizantes o produtor precisa adotar mais tecnologia para usar melhor os insumos que já tem e substituí-los por produtos biológicos. É aí que entram as startups,” pontua.

Segundo o executivo, o trabalho da SP Ventures neste momento é amenizar os efeitos da crise para os produtores e a população em geral (que sofre com o aumento dos preços), apoiando empresas a desenvolverem soluções que otimizem o trabalho no campo.