Deeptech

Deeptech brasileira cria IA para auxiliar na detecção precoce do câncer

Fundada em 2022, a Huna busca tornar o processo diagnóstico mais preciso e eficiente por meio da tecnologia

Daniella Castro, CTO e cofundadora da deeptech Huna
Daniella Castro, CTO e cofundadora da Huna (Foto: Divulgação)

Quanto mais cedo o diagnóstico, maior é a possibilidade de cura e qualidade de vida de pacientes com câncer. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), as chances de cura chegam a 90% quando a doença é diagnosticada nos estágios iniciais, o que evidencia a importância de tecnologias e exames para detectar a doença ainda no começo.

É justamente nesse contexto que nasce a Huna. Fundada em 2022, a startup desenvolve soluções com inteligência artificial para apoiar a detecção precoce multi câncer, por meio de exames de sangue de rotina feitos anualmente como hemograma, colesterol, glicose e outros marcadores sanguíneos. A solução tem como foco apoiar gestores de saúde, hospitais oncológicos e outros profissionais do setor, tornando o processo diagnóstico de cânceres mais preciso e eficiente por meio da tecnologia.

“Já temos algoritmos super sofisticados sendo utilizados nas redes sociais e no marketing digital, mas na medicina ainda estamos muito presos a padrões lineares. No entanto, os processos biológicos do nosso organismo não são lineares. As lentes da inteligência artificial nos permitem identificar padrões que acontecem no nosso corpo com muito mais assertividade”, afirma Daniella Castro, CTO e cofundadora da Huna, em conversa com o Startups.

A empreendedora alerta que o objetivo não é substituir exames cruciais como a mamografia, e sim servir como uma ferramenta de apoio para o diagnóstico precoce. “A gente não fala se o paciente tem ou não o câncer, mas a partir da análise do hemograma conseguimos classificar qual é o nível de risco dele em relação à doença”, explica Daniella, que além de empreendedora é inovadora na área de TI, com vasta experiência em liderança, machine learning, planejamento estratégico e PhD em inteligência artificial.

Antes de criar a Huna, Daniella atuou em organizações como a Petrobras e na Kunumi, empresa de inteligência artificial onde participou de uma série de projetos em áreas como predição da doença de Alzheimer, diagnóstico da Covid-19 e detecção precoce do câncer. “Em todos eles, identificamos um painel sanguíneo preditivo para a doença. Porém o objetivo não era desenvolver soluções, e fiquei um pouco triste de ver essas pesquisas e inteligências não impactarem as pessoas de fato. Foi quando me juntei a Vinícius Ribeiro e Marco Kohara, também da Kunumi, para desenvolver uma solução específica a partir disso”, explica.

Potencial de impacto

Em 2022, a Huna recebeu um pré-seed de quase US$ 1 milhão com Big Bets, Niu Ventures e Kortex, fundo de corporate venture capital do Grupo Fleury e Grupo Sabin. Os recursos foram direcionados para o desenvolvimento da tecnologia.

O primeiro produto desenvolvido pela Huna é focado na detecção do câncer de mama – um dos tipos da doença que mais atinge as brasileiras. “Passei pela experiência pessoal de ter uma amiga diagnosticada com câncer de mama em estágio avançado. Foi quando descobri que essa doença é super tratável quando identificada logo no início. Começamos nossos trabalhos pelo câncer de mama pela relevância que ele têm não só na minha vida, mas para na de milhares de pessoas em todo o mundo.”, afirma Daniella.

“A maioria das mulheres do país não realizam o exame de mamografia, que é crucial para o diagnóstico precoce da doença. O diferencial da Huna é justamente a possibilidade de detectar os cânceres com exames de rotina, mais baratos e acessíveis do que exames complexos, o que torna o rastreamento da doença mais democrático para todos”, pontua.

Agora, a expectativa é investir em pesquisa para ampliar a tecnologia e para a detecção precoce de outros tipos da doença – principalmente os mais prevalentes a nível global como o câncer colorretal, de próstata e de colo de útero – além de aumentar o esforço de comercialização da solução. Para isso, a startup vai iniciar a captação de uma rodada seed”.

No entanto, Daniella reconhece as dificuldades não só do momento atual do mercado, ainda sentindo os efeitos do reajuste e das altas taxas de juros, mas também do panorama geral do ecossistema quando o assunto é investimento em deeptechs – startups baseadas em tecnologias profundas e científicas. Estima-se que na próxima década os investimentos nessas empresas cresçam 20 vezes na América Latina, saltando dos US$ 172 milhões em 2022 para US$ 3,44 bilhões em 10 anos, segundo o relatório “Deep Tech – The New Wave”, do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

Embora promissor, o cenário no Brasil ainda enfrenta alguns desafios para que se consolide como um ambiente maduro para o desenvolvimento e crescimento dessas empresas. “Empreender tem sido uma montanha-russa de sentimentos. Nosso maior desafio é lidar com o pouco investimento direcionado para empresas de tecnologia intensiva em ciência”, conta a empreendedora brasileira.

Por isso, é provável que a próxima captação da Huna seja com investidores internacionais – que já começaram a mostrar interesse pela solução. “Temos visto que há espaço no exterior, e recebido convites para conversar com parceiros de fora”, conta Daniella.

Reconhecimento global

Mesmo com poucos anos de vida, a Huna já vem chamando a atenção de players de peso. No ano passado, a deeptech foi uma das cinco vencedoras do Prêmio Women Empowerment, da Bayer Foundation e, mais recentemente, Daniella foi selecionada como uma das 20 finalistas do Aurora Tech Award 2024, programa global da inDrive que reconhece mulheres fundadoras de startups de TI que desafiam a desigualdade de gênero com projetos de impacto social positivo. Com isso, ela se tornou a primeira brasileira a estar entre as finalistas desde que a iniciativa foi lançada, em 2021. 

“Reconhecer a conquista de mulheres é muito importante. Esses tipos de premiações contribuem para que a gente tenha outras empreendedoras de exemplo, e também vire um modelo para as demais – um ciclo contagiante. Para a empresa, é um reconhecimento do nosso esforço para  criar algo novo, com uma chancela de que nossa abordagem e os problemas que buscamos solucionar são realmente relevantes”, explica. Para chegar à final do Aurora Tech Award, Daniella disputou com 649 projetos de candidatas a nível mundial, e aproveitará a visibilidade para atrair potenciais parceiros e investidores.