Uma boa parte do PIB brasileiro se reuniu no glamuroso hotel Rosewood em São Paulo na terça (21) e na quarta (22) para acompanhar o Bloomberg New Economy, evento realizado pela toda poderosa Bloomberg, que contou com a participação do próprio fundador da companhia, Michael Bloomberg, e até Bill Gates (por videoconferência).
Entre discussões sobre os rumos da economia, sustentabilidade e geopolítica, um desentendimento entre dois painelistas no palco virou motivo de ti ti ti nos corredores (e certamente nos grupos de WhatsApp).
Em uma conversa sobre os dilemas do mundo digital, o clima ia morno até o publicitário Nizan Guanaes ser convidado a falar logo depois de Fábio Coelho, presidente do Google no Brasil. “Ele é meu melhor amigo, meu vizinho, mas eu vou dar uma outra perspectiva sobre o que ele falou”, começou dizendo, após Fábio ter tecido louros ao papel da tecnologia e das plataformas na democratização do acesso a informações e também no estímulo ao empreendedorismo.
Ele então contou que quatro anos atrás, sua esposa fez uma festa de aniversário na Bahia e foi acusada de fazer uma comemoração com temática racista. “Isso se espalhou pelas plataformas de conteúdo e ela teve que se demitir do emprego dela”, contou. Nizan é casado com Donata Meirelles, que era diretora da Vogue Brasil. Segundo ele, eles foram ao Ministério Público e confirmaram que as alegações eram falsas, mas que o nome dela estava por toda parte.
Nizan então pediu a Fábio que tirasse o conteúdo do ar. “Ele disse que não podia. Por causa dele? Não. É por causa das regras do Google. Mas ninguém sabe o efeito que isso teve na nossa família. E o que eu estou dizendo é que se o Google está no Brasil, ele tem que cumprir as coisas por aqui. As coisas não podem vir de fora”, defendeu o publicitário depois de pedir à moderadora Joumanna Bercetche, âncora da Bloomberg Television, para continuar falando mais um pouco uma vez que outro painelista, Dario Werthein, do Werthein Group, tinha feito uma fala de cerca de cinco minutos.
Nizan continuou dizendo que o problema com as plataformas é que a retórica delas é muito bonita, que todas querem mudar o mundo. Mas daí, Jeff Bezos vai lá e compra um barco de US$ 500 milhões. “Um cara que compra um barco de US$ 500 milhões odeia o mundo e odeia o mar”, cravou. “Eu sou totalmente capitalista. Mas devem haver frameworks”, disse. Ele voltou a dizer que o rant não tinha nada a ver com Fábio Coelho, mas com a governança das coisas.
Depois de Dario fazer mais uma (breve) fala, Fábio Coelho foi convidado a responder mais uma pergunta, e começou a usar seu tempo para se ‘defender’ do que Nizan havia dito antes. “Eu não posso remover conteúdo. Não é sobre mim”, disse, sendo interrompido por Nizan dizendo que esse é justamente um dos problemas. “Me permita continuar”, disse Fábio com calma.
O executivo disse que orientou Nizan Guanaes e que, se ele apresentasse uma decisão judicial, ela seria avaliada. Segundo ele, trata-se de seguir a lei, que prevê a retirada de conteúdos de crime de ódio ou racismo mediante notificação judicial. Nizan então se exaltou: “Mas esse foi o problema. Desculpa, mas você está mentindo”, disse. Segundo ele, a esposa demorou quatro anos para provar tudo na Justiça e ele mandou os documentos do MIniste´rio Público para Fábio. “Não estou sendo muito gentil com você. Mas você não está sendo gentil comigo, com a minha esposa, e com a democracia”, desabafou. Segundo o Startups apurou, uma notificação judicial de retirada de conteúdo nunca foi apresentada por Nizan ao Google.
Fábio então mudou de assunto passando a falar de inteligência artificial e o Marco Civil da Internet. Nizan também defendeu o papel da regulação, como algo necessário para conter o “velho oeste” no qual se transformaram as plataformas. “Qualquer um pode fazer o que quiser”, cravou.
A alta temperatura da discussão teve um tom pessoal do episódio acontecido com a esposa de Nizan Guanaes, mas não deixa de ser um reflexo também dos questionamentos do mercado publicitário (e da sociedade em geral) com os altos custos, falta de transparência e poder excessivo das big techs. Especialmente com o advento da inteligência artificial, o momento é propício para o debate. O que muita gente se perguntou foi se o palco para fazer isso foi o mais correto.