Entre as dunas e arranha-céus, Dubai vem moldando uma narrativa para além do turismo de luxo e da arquitetura futurista. Nos últimos anos, o emirado se consolidou como um dos ecossistemas de inovação mais dinâmicos do mundo, apostando em tecnologia, infraestrutura e regulação para atrair startups e empreendedores de todos os continentes. Com hubs especializados, políticas públicas, incentivos à internacionalização e acesso a capital, a região tem atraído tanto investimento externo quanto talentos que veem na cidade um ambiente propício para desenvolver e escalar soluções tecnológicas em escala global.
Os resultados dessa estratégia já são visíveis. Em 2024, o PIB do emirado creceu 3,2%, ultrapassando us$ 120 bilhões, enquanto Dubai manteve o primeiro lugar mundial na atração de investimentos estrangeiros diretos em novos projetos (greenfield) e reforçou sua posição entre as dez economias mais competitivas do mundo. Ao mesmo tempo, startups locais ganharam visibilidade internacional e fundos globais passaram a olhar para a cidade como base estratégica para acessar mercados da África, Ásia e do Oriente Médio.
Para empreendedores brasileiros que buscam internacionalização, Dubai tem se tornado um destino cada vez mais atraente para acessar ecossistemas de alto crescimento e diversificar operações.
Por que Dubai?
Saeed Alnofeli, vice-presidente da incubadora in5, descreve o arcabouço regulatório de Dubai como “ágil e progressista” – um dos grandes atrativos para empresas que buscam expansão internacional. “O apoio dos Emirados Árabes a startups inovadoras permite que novos negócios testem conceitos mais rapidamente em um ambiente favorável”, afirma.
Ele observa que a postura proativa em relação à transformação digital, combinada com a infraestrutura de ponta da região, simplifica consideravelmente processos críticos, como a constituição de empresas e a obtenção de vistos, facilitando a expansão global.
Saeed destaca a localização geográfica de Dubai como uma vantagem adicional. Em um raio de oito horas de voo, Dubai alcança dois terços da população mundial, facilitando o acesso a novos mercados. Isso faz da cidade um ponto de conexão natural entre Oriente Médio, África e Ásia, com infraestrutura que inclui o porto de Jebel Ali, um dos maiores do mundo, e dois aeroportos que ligam mais de 100 companhias aéreas a 269 destinos.
“Essa proximidade atrai uma força de trabalho global, criando um pool de talentos diversificado, apoiado pela alta qualidade de vida, segurança e pelo programa Golden Visa para profissionais altamente qualificados”, explica o executivo. O Golden Visa é uma autorização de residência de longo prazo que permite a estrangeiros viver, trabalhar ou estudar nos Emirados Árabes Unidos por períodos renováveis de cinco ou 10 anos. Voltado a investidores, empreendedores, médicos, cientistas e talentos altamente qualificados, o programa oferece incentivos fiscais, facilidade para fazer negócios, entre outros benefícios.
A conectividade não é apenas física. Dubai lidera o ranking de digitalização governamental, com 99,5% dos serviços públicos disponíveis online, e abriga mais de 20 zonas francas que permitem 100% de propriedade estrangeira, zero imposto de renda e burocracia reduzida.
No campo financeiro, o Dubai International Financial Centre (DIFC) é um dos dez maiores centros financeiros do mundo. Ele concentra mais de 6.900 empresas – entre elas, 1.200 fintechs e scale-ups de inovação – e abriga hubs como o FinTech Hive e o Innovation Hub. Já no âmbito do capital de risco, a cidade abriga mais de 400 fundos de venture capital e 300 de private equity. Nos últimos dez anos, startups baseadas em Dubai levantaram mais de US$ 11 bilhões, o equivalente a 60% de todo o funding da região MENA (Oriente Médio e Norte da África).
“Os fundadores de startups globais encontram em Dubai uma série de oportunidades, impulsionadas pela visão estratégica dos Emirados Árabes Unidos para setores voltados ao futuro”, pontua Saeed.
Colaboração público-privada
Um dos pilares do sucesso de Dubai é a coordenação entre governo e iniciativa privada. Essa atuação conjunta garante agilidade nas decisões e alinhamento nas políticas de incentivo à inovação. Entre as principais diretrizes estão a Dubai Economic Agenda ‘D33’, que prevê dobrar o tamanho da economia até 2033, e a National AI Strategy 2031, que coloca a inteligência artificial no centro das políticas públicas e do desenvolvimento econômico.
Na prática, essas iniciativas são traduzidas em programas de apoio direto a startups. A in5, por exemplo, mantém parceria com a Future100, projeto dos ministérios da Economia e do Turismo dos Emirados que identifica e apoia empresas com alto potencial de impacto. “A forte disposição para inovar exige maior cooperação entre governo, academia e indústria, a fim de reter talentos e apoiar startups ao longo de todo o ciclo de desenvolvimento”, destaca Saeed.
Parceiros locais
A cidade oferece o suporte de players locais, que auxiliam empreendedores de todo o mundo em estratégias de entrada e crescimento no mercado. No caso da in5, a plataforma de incubação e aceleração apoia startups de tecnologia, mídia, design e ciência, oferecendo mentoria, networking e consultoria. Como parte do TECOM Group PJSC, a iniciativa já impulsionou mais de mil negócios desde a sua criação, em 2013.
A estrutura se conecta a distritos de inovação do TECOM Group, como o Dubai Internet City, Dubai Production City e o Dubai Design District (d3) – hubs setoriais que concentram startups, grandes empresas, investidores e universidades. “A integração da in5 com distritos especializados demonstra seu sucesso na criação de ambientes colaborativos focados em beneficiar inovadores”, avalia Saeed.
Além da in5, destacam-se players como o DIFC Innovation Hub, que abriga mais de 1.240 startups em estágio growth, empresas de inovação estabelecidas, laboratórios digitais, gestoras de venture capital, reguladores e entidades educacionais. O hub é amplamente reconhecido como um centro para fintechs, insurtechs, regtechs (tecnologia regulatória) e Islamic FinTech – este último segmento especializado oferece produtos financeiros compatíveis com a Sharia (lei islâmica), como a proibição de juros (Riba).
Já o Dtech Sandbox é um programa local voltado para fundadores de startups, apoiando empreendedores de tecnologia em estágio inicial ao longo de 12 meses. Oferecido pela equipe da Dtec Ventures, o programa aborda Desenvolvimento de Produto, Tração, Escalabilidade, Diagnóstico Financeiro, Suporte Jurídico e Bem-Estar+ por meio de workshops, mentorias e créditos de parceiros.
A região conta ainda com venture builders como GrowValley e FasterCapital, além do programa Dubai Smart City Accelerator, a Dubai Future Foundation, e outros players do ecossistema. O ecossistema local ainda conta com universidades internacionais, laboratórios de P&D e iniciativas como o Dubai Future Labs e o Dubai AI Campus, que combinam educação, pesquisa e ambiente propício para crescimento de carreiras tecnológicas.
O caso de Dubai oferece aprendizados valiosos para o Brasil. Saeed cita o papel das comunidades empreendedoras integradas e o investimento em hubs temáticos. “A integração entre distritos especializados e programas de inovação mostra como é possível criar ecossistemas colaborativos que realmente geram valor”, afirma. Setores como fintech, healthtech, logística e energia limpa aparecem entre os mais promissores para a internacionalização via Dubai.
Com metas ambiciosas – entre elas, abrigar 30 novos unicórnios até 2033 e gerar AED 100 bilhões (US$ 27 bilhões) anuais em PIB digital -, a cidade quer consolidar seu papel como ponto de encontro entre capital, tecnologia e talentos. Para além da vitrine de luxo, a combinação entre políticas públicas voltadas à inovação, ambiente regulatório favorável e conectividade global tem reforçado a posição do emirado como um dos principais polos de empreendedorismo do mundo, pronto para receber a próxima geração de empreendedores globais.