Edtech

Letrus capta R$ 36 milhões para melhorar escrita e leitura de alunos

Com pegada de impacto, Letrus usa IA para criar programa pedagógico personalizado e atraiu Crescera e Owl Ventures

Alessandro Arpetti (à esq.), Thiago Rached, Renata Grando e Luis Junqueira, da Letrus
Alessandro Arpetti (à esq.), Thiago Rached, Renata Grando e Luis Junqueira, da Letrus

Quando voltou do seu mestrado na área de educação em Columbia em 2016, Thiago Rached foi apresentado pelo amigo e professor Luis Junqueira a um protótipo de inteligência artificial para análise de textos de alunos que ele estava desenvolvendo. Ele apoiou os primeiros passos do projeto e rapidamente “se convidou” para que participar da iniciativa, deu origem à edtech Letrus em 2017.

Com uma proposta de impacto e de ser um programa pedagógico para melhorar a escrita e a leitura de estudantes, a companhia chegou a 80 escolas atendidas em seu segundo ano de operação e hoje tem 680. Agora, para acelerar sua expansão, ela colocou no caixa um cheque de R$ 36 milhões.

Com os recursos, o objetivo é chegar a 1 milhão de estudantes usando sua tecnologia nas redes pública e privada em um prazo de dois anos. Em seu site ela diz ter hoje mais de 180 mil alunos. O modelo de negócios se baseia no pagamento de uma mensalidade por aluno atendido.

Para crescer, a Letrus pretende investir ao longo de 2024 em uma estratégia de topo de funil para aumentar seu reconhecimento de marca e ampliar a carteira. A expansão acontecerá no Brasil, mas o restante da América Latina, e também outros países já estão no radar. “Fizemos uma análise na região e percebemos que tem demanda. A tecnologia já era fácil de ser adaptada para outras línguas antes da IA generativa. Agora então. A questão é realmente a dinâmica de mercado e como você executa o seu plano”, diz Thiago.

Com uma equipe de 100 pessoas, a Letrus aplica uma inteligência artificial na análise de textos escritos por alunos. Mais do que pontuar erros e dar nota, o sistema cria trilhas de aprendizado personalizadas que ajudam no desenvolvimento de cada aluno e trazem engajamento. Com a nova rodada, a companhia vai investir na melhoria da sua tecnologia, para reduzir a dependência de modelos de terceiros, e também na parte de desenvolvimento da leitura. “Queremos ser o grande player que leva tecnologia para gerar outro patamar em escrita e leitura. Acho que o foco é um diferenciador”, diz Thiago sobre a possibilidade de expansão de leque de atuação para outras áreas de ensino, como a matemática.

Componente humano

Segundo o cofundador, a ideia não é substituir o professor, mas servir como um apoio. “A gente devolve o sábado para o professor”, brinca. Além da parte tecnológica, a Letrus tem uma atuação de assessoria, que atua junto aos professores e também às instituições de ensino para acompanhar os resultados e fazer ajustes de rotas. Thiago destaca que essa parte tem sido cada vez mais automatizada, mas que o componente humano é fundamental para o modelo da edtech. “Eu não subestimaria o desafio que é criar um programa integrado ao currículo que liga educadores, família e escola. Isso não envolve só software. Tem outras camadas de serviço. A tecnologia é só uma parte da questão”, avalia.

Com reconhecimentos do MIT, FGV e Unesco por sua tecnologia, a Letrus teve sua plataforma testada in loco no estado do Espírito Santo, onde conseguiu, durante um teste em 2019, fazer um grupo de alunos a ficar em 2º lugar na redação do ENEM, enquanto quem não usou o sistema ficou em 8º. Isso em um prazo de cinco meses. Com a adoção como política pública, o estado passou a 1º lugar ano passado. “Isso é uma grande quebra de paradigma. O resultado só no longo prazo não é verdade. Quando implementado de forma séria, com foco, dá para ter resultados surpreendentes no curto prazo. O mato é muito alto. É só fazer o arroz com feijão direito. E nem quero vender a Letrus como ciência de foguete não – apesar de ser. Mas não é isso que faz mudar. É o trabalho bem feito”, argumenta Thiago.

A rodada

A nova rodada da Letrus teve uma mistura de recursos de fundos, de investidores-anjo e também de fundações, um sinal de que a edtech tem conseguido aliar sua proposta de impacto com resultados de negócios. “Eu não consigo dissociar o dinheiro do impacto. Quanto mais aluno, mais dinheiro. E a gente precisa ser muito lucrativo para continuar crescendo e gerando impacto. Essa convergência de impacto e negócio é muito importante”, defende Thiago.

A captação foi liderada pela gestora Crescera, um dos principais nomes no setor de educação no Brasil, tendo desenvolvido a tese da Afya e também sendo investidores da Ânima, Alura e Affero Lab. Como colíder entrou a Crescera está a Owl Ventures, um dos fundos de educação mais importantes dos EUA, com companhias como a MasterClass no portfólio. Esse é o terceiro investimento deles no Brasil, depois da Galena e da Coala.      

Junto com os dois entraram Altitude, fundo de venture capital ancorado pela Península, de Abílio Diniz, que já tinha feito um aporte na companhia; BID Lab, braço do Banco Interamericano de Desenvolvimento para investimentos em inovação, e as fundações Lemann e VélezReyez+ (do fundador do Nubank, David Vélez, e sua esposa, Mariel Reyez, fundadora do Reprograma). É primeira vez que as duas colocam recursos diretamente em um negócio privado.

Com o novo aporte a Letrus soma R$ 60 milhões captados em cinco anos de vida. Na lista de investidores ela já tinha Potencia Ventures, Canary e a Positive Ventures.   

Apesar de a divulgação da rodada estar acontecendo agora, ela foi fechada, de fato, em abril, quando cerca de 90% dos recursos foram liberados para a Letrus. O intervalo entre os dois momentos aconteceu porque um dos fundos levou um pouco mais de tempo para finalizar sua parte no processo. A assinatura aconteceu na semana passada. Como a edtech fazia questão de ter esse nome no anúncio, ela decidiu esperar.

Thiago, que antes da Letrus ficou quatro anos na gestora monashees, conta que chegou a achar que a startup não conseguiria fazer a captação. Depois dos bons resultados obtidos em 2021, a startup saiu para levantar dinheiro no começo de 2022. Como a situação não estava nada boa, o processo foi suspenso e retomado em agosto. As primeiras propostas foram chegar só em janeiro de 2023. “A gente tem muito controle de queima de caixa, até já sabendo que venture capital não é tão acessível para educação. Tivemos impacto na velocidade e prioridade de alguns investimentos. Mas foi tudo bem”, conta.

A expectativa, segundo ele, é que a captação sirva como uma espécie de inspiração para o mercado, mostrando que o segmento de educação – que tradicionalmente recebe pouca atenção dos fundos de venture capital – ganhe mais projeção.