Quando as medidas de distanciamento para combate à Covid-19 colocaram os pequenos negócios em risco, um grupo de empresários se juntou para ajudar. Nomes como Abílio Diniz, Luciano Huck, Eduardo Mufarej e Ticiana Rolim Queiroz levantaram R$ 60 milhões em doações de pessoas físicas e empresas para emprestar recursos a juros baixos para quem precisava ganhar um fôlego. A pandemia passou, mas o projeto, que foi batizado de Estímulo, seguiu vivo.
E, na verdade, só renovou seu propósito e esforços. Adotando um modelo de blended finance (ou financiamento misto, que mistura capital privado, filantrópico e público), e se posicionando como uma fintech de impacto, a iniciativa chegou a R$ 208 milhões concedidos em apoio financeiro. Só em 2023, foram R$ 41 milhões.
Em quatro anos, mais de 3,5 mil negócios de todo o país foram beneficiados, sendo que 90% deles estão localizados em periferias e mais da metade tem mulheres como acionistas. Isso é importante porque as mulheres, quando prosperam, tendem a investir mais na educação dos filhos, o que aumenta o impacto do crédito concedido.
E as ambições são grandes. “Esse ano a previsão é dobrar de tamanho na originação de crédito. Mas porque não podemos chegar a R$ 100 milhões mesmo?”, provoca Vinícius Poit, ex-Deputado Federal, que assumiu o comando do Estímulo há pouco mais de um ano.
Segundo ele, a ampliação virá da expansão da presença geográfica do Estímulo. A iniciativa nasceu em São Paulo porque a maioria de seus idealizadores estavam por aqui, mas vem conquistando apoiadores em todo o país. Hoje a iniciativa está presente nas 27 unidades federativas e acessa empreendedores e empreendedoras com o apoio de instituições como o Sebrae e o BNDES – além de um esforço de divulgação em meios de comunicação local. De acordo com Vinicius, não há planos de mudar os critérios de avaliação para conseguir liberar mais dinheiro.
Elegibilidade
Os empréstimos concedidos são do tipo clean, que não exigem nenhuma garantia. Os valores podem ir de de R$ 10 mil a R$ 200 mil, e o cheque médio está em R$ 58 mil. Os juros começam em 1,39% por mês, e ficam na faixa média de 1,75%, que é 118% abaixo dos 3,82% praticados pelo mercado, segundo a ANEFAC.
Os empréstimos podem ser parcelados em até 24 meses, com dois meses de carência para início do pagamento. Para ter seu pedido considerado, o negócio precisa ter um CNPJ ativo e regularizado há pelo menos dois anos e receita mensal entre R$ 10 mil e R$ 400 mil.
Segundo Vinicius, mesmo com juros tão baixos, a taxa é suficiente para aguentar a inadimplência, que está na casa dos 6% a 7% por mês, abaixo dos 9,5% para a média dos FIDCs de fintechs medida pela Uqbar, que fornece dados sobre securitização no Brasil.
Além do recurso financeiro, o Estímulo atua na parte de capacitação, apoiando os empreendedores e empreendedoras com capacitações e mentorias. Abílio Diniz, falecido em fevereiro, era um dos mentores.
Gerar impacto e ganhar dinheiro?
Mesmo praticando juros abaixo da média do mercado financeiro, Vinícius garante que o Estímulo gera receita suficiente para cobrir os custos da operação, aumentar o volume de empréstimos concedidos e ainda remunerar os investidores. “Assim conseguimos ter uma continuidade sem precisar ficar dependendo de novas captações”, diz. Hoje a operação conta com 13 pessoas.
Desde que nasceu, em maio de 2020, o Estímulo captou R$ 76 milhões para emprestar. A maior parte, R$ 60 milhões, foi aplicada na formação da iniciativa. Em outras duas menores, feitas para testar algumas teses, vieram os R$ 16 milhões adicionais.
Parte do capital levantado já está sendo devolvida aos investidores com retorno de 105% do CDI – melhor que muito fundo com nome pomposo oferecido por banco grande por aí. Com o resultado financeiro e também o impacto social comprovado, o plano é ampliar o valor disponível para empréstimos. Até o fim do ano o objetivo é chegar a R$ 100 milhões no fundo.
Uma das formas de fazer isso é aumentando a distribuição das captações. “A gente quer que as pessoas possam investir por meio do BTG [um dos apoiadores iniciais do projeto] pela XP e outras plataformas também. Porque se a gente que impactar, a gente precisa espalhar esse conceito”, conta Vinicius. As conversas com as plataformas ainda são iniciais e não há previsão para que essas ofertas aconteçam de fato. Segundo Vinicius, hoje algumas casas já têm falado em indivíduos alocarem cerca de 1% do seu patrimônio em impacto.