Cumbuca
Daniel Ruhman, CEO e cofundador da Cumbuca (Foto: Reprodução/LinkedIn)

A Cumbuca entra em uma nova fase. Depois de operar como solução B2C para divisão despesas via Open Finance, a fintech pivotou e agora se posiciona como plataforma B2B. A startup passa a oferecer a empresas nacionais e internacionais acesso direto ao Open Finance por meio de um proxy baseado em sua licença de ITP (Iniciador de Transação de Pagamento). 

Hoje, companhias que querem criar produtos usando o Open Finance encontram dois caminhos: tirar uma licença própria – processo caro, demorado e altamente regulado – ou contratar um fornecedor que entrega APIs proprietárias (não as APIs oficiais do ecossistema), o que acaba limitando o que é possível desenvolver.

A Cumbuca propõe uma terceira via. Em vez de oferecer uma API pronta, atua como um proxy regulado que dá acesso direto às APIs oficiais do Open Finance, sem camadas de abstração. A ideia é que, se uma funcionalidade existe no Open Finance, o cliente consegue usar via Cumbuca, sem limitações impostas por um provedor intermediário.

Segundo o CEO, Daniel Ruhman, o modelo atende especialmente grandes empresas que querem construir suas próprias APIs e manter a infraestrutura dentro de casa, seguindo padrões próprios de segurança e compliance. Esses clientes também evitam depender de fornecedores e ganham flexibilidade para criar produtos que seriam inviáveis com APIs prontas.

“É tudo muito customizado”, diz Daniel. “Não oferecemos tabela de preço nem contrato padrão, porque organizações de grande porte precisam de flexibilidade de desenvolvimento. É uma alternativa para que o cliente possa internalizar todo o processo e manter um alto nível de segurança, compliance e privacidade, além de garantir flexibilidade de produto”.

A fintech trabalha com dois modelos: o cliente pode desenvolver tudo internamente, usando apenas a licença da Cumbuca como acesso regulatório, ou combinar essa licença com provedores homologados de infraestrutura bancária – algo que tradicionalmente só seria possível para quem já tivesse uma licença própria.

Na prática, a Cumbuca abre a porta do Open Finance para players que querem operar no nível “bruto”, com liberdade de desenvolvimento e controle total da operação. Para empresas internacionais, funciona como uma rota mais rápida para entrar no país em comparação ao processo de obtenção de uma licença, que pode levar vários anos.

A nova fase

A Cumbuca está dedicada ao produto B2B desde o início de maio e já começa a ver os primeiros resultados. “O processo de venda tem sido natural, porque já fazemos parte do ecossistema e conhecemos as empresas”, afirma Daniel.

Em cerca de seis meses, a operação chegou ao breakeven e passou a gerar caixa – algo que nunca havia acontecido nos seis anos de atuação B2C. “Antes até tínhamos receita, mas ela ainda era menor que o custo. Agora estamos gerando caixa todo mês, a empresa está crescendo e os clientes estão felizes. É o mesmo CNPJ, mas agora acho que encontramos o nosso caminho.”

Apesar de atuar exclusivamente no Open Finance, a fintech não descarta expandir para outros rails do sistema financeiro, e o movimento regulatório recente reforça essa possibilidade. Na última sexta-feira (28), o Banco Central (BC) e o Conselho Monetário Nacional (CMN) regulamentaram o modelo de Banking as a Service (BaaS), que permite que empresas de diferentes setores ofertem serviços financeiros. A norma já está em vigor, e contratos existentes podem ser ajustados até o fim de 2026.

“A regulação de BaaS basicamente engloba tudo que não é Open Finance, como custódia, emissão de cartão e credenciamento de instrumentos de pagamento – as outras modalidades de ITP”, explica Daniel. Ele reforça que a mudança não afeta o modelo atual da Cumbuca, mas abre novas possibilidades. “Temos muito interesse em expandir. Ainda não sabemos quando e como. Não será no curto prazo, mas daqui a uns 10 anos espero que a gente esteja falando de todos os serviços que existem no mundo regulado.”

Desde a fundação, a Cumbuca levantou pouco mais de US$ 3 milhões com fundos como Lightspeed Venture Partners, Supera Capital e Verve Capital. A nova fase, porém, está sendo tocada com recursos próprios e sem planos de rodada no curto prazo. “Aprendemos a ser muito bons em controlar o nosso dinheiro. Ainda tínhamos uma boa parte da rodada feita em 2023”, diz o CEO. “Com o negócio agora gerando caixa, temos mais dinheiro do que antes, não porque trouxemos de terceiros, mas porque a empresa rentabilizou. É um modelo sustentável, com contratos longos que permitem pensar no longo prazo. Não precisamos de capital externo agora e, se ele vier, será por opção.”

Daniel reconhece que o novo modelo é um serviço “premium”. “É mais caro e será difícil para uma empresa pequena começar a usar, mas oferece benefícios que as organizações não teriam de outras formas”, afirma. O alvo são empresas grandes que enxergam uma oportunidade relevante em Open Finance e querem investir pesado na iniciação de pagamentos. “Temos empresas de fora entrando no Brasil que já entenderam que iniciação de pagamento é o caminho certo para se posicionar no Pix. São companhias com requisitos enormes de tecnologia, compliance, segurança e privacidade.”

O CEO afirma que, nos próximos meses, os primeiros clientes devem começar a lançar produtos desenvolvidos sobre a estrutura da Cumbuca – soluções que, segundo ele, “não existem no mercado e são impossíveis de replicar com as tecnologias tradicionais”.

A expectativa é alcançar 10 clientes no primeiro ano de operação. Hoje, são cerca de cinco. “A meta é que as maiores operações de Open Finance do Brasil queiram usar a nossa licença, o nosso proxy, a nossa ajuda e o nosso conhecimento para escalar pelo país”, conclui.

Por que a Cumbuca pivotou?

A dificuldade de monetização foi o principal gatilho para a mudança de rota. Daniel lembra que o produto B2C não se sustentava: “A gente nunca quis ser banco, dar crédito ou vender produtos. Só queríamos fazer um app para dividir despesas entre grupos e casais”, afirma. A cobrança de mensalidade não funcionou e o modelo baseado em cartão pré-pago perdeu espaço com o avanço do Pix. “O consumidor brasileiro não está acostumado a pagar por software. E o pré-pago já perdeu para o Pix faz tempo.”

Apesar do crescimento em usuários no fim de 2024 e início de 2025, a receita não acompanhava. “Ficou claro que não era rentável, então puxamos o freio”, diz.

A operação B2C expôs outra limitação: os parceiros de infraestrutura não entregavam a flexibilidade que a empresa desejava. Isso levou a Cumbuca a tirar sua própria licença de ITP e operar exclusivamente no Open Finance. Mesmo assim, o app continuava esbarrando nas restrições dos fornecedores. “Estávamos integrados com todos os parceiros do mercado, mas o que queríamos construir não era possível com o que existia até aquele momento”, afirma Daniel. 

Com a licença em mãos, o time decidiu virar a chave. “Temos especialistas em Open Finance e acreditamos que esse é o futuro de como o brasileiro vai interagir com o dinheiro”, pontua. Ele aposta que, nos próximos anos, o brasileiro usará Pix cada vez mais em ambientes fora do app do banco, por meio de iniciação de pagamento – caminho diretamente ligado ao novo posicionamento da empresa.

A leitura levou à criação do modelo atual: ser o parceiro que eles próprios sentiram falta quando estavam do outro lado do balcão. “Queríamos dar aos clientes a flexibilidade que a gente queria ter e agir com toda a responsabilidade e compliance que o serviço exige”, explica.

A transição do B2C foi feita sem pressa. Segundo o cofundador Bruno Cury, o phase-out começou em janeiro e terminou em abril, sem incidentes relevantes ou registros no sistema de reclamações do BC. “Fomos pacientes e granulares com os avisos. Pensamos que ia dar mais problemas, mas não tivemos dor de cabeça”, afirma.

Ele explica que a equipe adotou processos mais robustos que o estritamente necessário: “Colocamos ‘gordura’ em tudo, porque dinheiro é dinheiro e não dá para brincar com o bolso das pessoas.”

“Escolhemos fazer em três meses o que dava para fazer em um”, completa Daniel. “Queríamos devolver 100% do dinheiro, encerrar todas as contas e migras as informações dos clientes com calma. No fim do dia, mexemos com um mercado que lida com dinheiro, e isso exige um nível de cuidado extremo”, ressalta o CEO.